A proposta de criação da CBS (Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços), através do Projeto de Lei 3.887/2020, foi apresentada pelo governo federal como a primeira etapa de uma tão sonhada reforma tributária.
A necessidade de uma reforma tributária é uma unanimidade nacional, na medida que temos um sistema tributário brasileiro:
Com a promessa de simplificação e de se criar um tributo sobre o valor adicionado, a proposta da CBS vem consolidar o PIS e a Cofins, uma das mais casuísticas e complexas legislações, responsáveis por significativos contenciosos tributários em nossos tribunais administrativos e judiciais.
Com incidência sobre a receita bruta de operações de bens e serviços à uma alíquota única de 12%, a CBS terá como contribuintes a pessoa jurídica e aqueles a ela equiparada.
Impostos/contribuições sobre o valor adicionado alinham-se ao modelo de tributação global, onde, com crédito financeiro amplo, credita-se em cada etapa do processo produtivo tudo que foi acertado na etapa anterior, pagando-se o imposto/contribuição sobre o valor adicionado.
Nesse modelo de tributação, o consumidor final assume o verdadeiro ônus, como constata-se no exemplo abaixo que apresenta o racional de um tributo sobre o valor adicionado perfeito numa cadeia do agronegócio:
O modelo de tributação da CBS pelo valor adicionado tem um grande mérito: o de eliminar a extensa discussão do conceito de insumo. Ao permitir o crédito financeiro, credita-se tudo que foi onerado na etapa anterior.
Outros tantos aspectos podemos abordar quanto à CBS, mas neste artigo traremos o destaque e foco para os impactos dela para o setor sucroenergético, especialmente para o mercado interno de açúcar.
Nesse contexto, é importante destacar que a CBS será isenta para produtos definidos como in natura e produtos da cesta básica.
Produtos in natura foram definidos como aqueles que não tenham sofrido qualquer processo de industrialização e não tenham sido acondicionados em embalagem de apresentação. Já os produtos da cesta básica são aqueles arrolados no Anexo I do PL, incluindo açúcar e outros.
Tudo faria muito sentido se não fosse a previsão do artigo 11 do PL 3.887/2020 que não autorizou a manutenção dos créditos de CBS no caso de saídas isentas, exceto as exportações.
Assim, tanto o produtor pessoa física (não contribuinte da CBS) quanto o produtor pessoa jurídica (contribuinte), ao dar saída de cana-de-açúcar para as usinas, terão uma operação não tributada ou isenta de CBS, devendo estornar os créditos de CBS que oneraram todo o processo produtivo até aquele momento.
Essa oneração não é pequena, visto que o projeto de lei da CBS eliminou muitas das desonerações de PIS e Cofins do processo produtivo rural, tais como de adubos, fertilizantes e maquinário agrícola.
Aqui encontra-se o grande desafio a ser discutido nessa reforma tributária, pois tem-se uma tempestade perfeita. Redução das desonerações do processo produtivo, sem possibilidade de tomada de crédito. Tem-se a quebra da cadeia e a ideia de um tributo sobre valor adicionado que volta a ser cumulativo na cadeia produtiva do açúcar vendido do mercado interno, considerado como item da cesta básica.
A CBS resultará num aumento de custos de produção tanto para o produtor de cana-de-açúcar quanto para as usinas que vendem açúcar no mercado interno e, consequentemente, numa necessidade de maior financiamento dessa produção, o que sabemos que no Brasil é um grande desafio.
Vale ainda destacar que as usinas poderão apropriar crédito presumido de CBS quando da aquisição dessa cana-de-açúcar de produtor rural pessoa jurídica para ressarcir eventual resíduo de CBS na cadeia. Baseado na disposição do Projeto de Lei, a aquisição de pessoa física não autorizaria o crédito presumido, apesar das disposições da exposição de motivos justificarem o crédito de maneira mais ampla.
O crédito presumido equivalente a 1,8% (15% aplicado sobre a alíquota de 12%) gera dúvidas acerca de sua suficiência para se eliminar a cumulatividade da cadeia.
Nesse contexto, a redução das desonerações, somada à ausência de manutenção de créditos no caso de saídas de produtos in natura e de cesta básica, além da redução do crédito presumido, resultam numa tributação cumulativa da CBS, ao invés de tributação pelo valor adicionado, conforme se demonstra abaixo:
Assim constata-se que análises mais detidas e detalhadas da reforma tributária são necessárias para que de fato ela aconteça, visto que pela primeira vez em nossa história temos o governo, as duas casas do Congresso Nacional, os governadores e toda a sociedade desejando uma reforma tributária que simplifique, que destrave investimentos, bem como seja neutra do ponto de vista de aumento de carga tributária e, afinal, gere mais renda para a nossa economia.