A necessidade da erradicação da soqueira de cana: técnicas e manejos indicados

02/01/2019 Agronegócio POR: Revista Canavieiros
À medida em que avançam os cortes da cana-de-açúcar, a produtividade tende a diminuir gradativamente e se faz necessária a renovação do canavial. O intervalo entre o plantio e esse processo ocorre, em média, após cinco cortes, podendo se estender até dez, dependendo da região de cultivo.

Para que a renovação seja realizada na época certa e fique bem-feita, é imprescindível escolher o período de plantio mais apropriado para o desenvolvimento da cultura, que precisará de condições climáticas ideais, como umidade, temperatura e radiação solar, para germinar e se desenvolver.

Hoje, a cana-de-açúcar pode ser plantada em diferentes épocas: no sistema de ano-e-meio (cana 18 meses), entre janeiro e abril; no sistema de ano (cana de 12 meses), entre outubro e novembro; e sistema de inverno, entre maio e agosto.

Determinada a época ideal, será necessária a escolha correta de manejo para erradicação do canavial, sendo que esse processo deverá ser realizado próximo à época de plantio. A operação poderá ser efetivada a partir do momento em que as soqueiras atingirem porte entre 40 e 50 centímetros de altura e sem a formação de colmos. Para tanto, os produtores têm disponível como procedimento os métodos químico e mecânico, ou, em casos severos, um conjunto dessas operações.

O manejo com uso de herbicidas pós-emergentes com boa translocação na planta atingindo inclusive o sistema radicular é um dos mais utilizados. O glifosato é o herbicida mais aplicado para controle químico das soqueiras devido à facilidade de manuseio, ao baixo custo e à ausência de efeito residual no solo, o que possibilita o cultivo de sucessão e/ou intercalares - no caso de Meiosi -, com outras culturas na área de reforma do canavial.

O glifosato é um herbicida sistêmico, de ação não seletiva, que inibe a enzima enolpiruvil-shiquimato fosfato sintase (EPSPs) e provoca a morte de plantas anuais e perenes. O emprego desse produto na eliminação ou erradicação de soqueiras de cana-de-açúcar tem-se mostrado tecnicamente viável, pois permite um resultado mais eficiente, o que proporciona uma proteção contínua do solo contra a erosão, quando comparado ao método mecânico, e reduz o período improdutivo das áreas de renovação, assim como contribui para o controle de plantas daninhas.

Atualmente estão disponíveis no mercado diversas marcas de glifosato, com diferentes formulações, conforme Tabela 1. As diferenças entre as soluções não estão apenas associadas à concentração de glifosato (eq. ac), tipo de formulação (Líquidas - SL ou Grânulos Dispersíveis em água – WG), mas, sim, à qualidade da matéria-prima e pureza, agentes tensoativos e aos sais presentes. O balanço entre a concentração ideal de sal potássico e de isopropilmanina e os agentes tensoativos promovem maior velocidade de controle na erradicação da cana-de-açúcar e melhor performance agrícola, otimizando assim a erradicação do canavial, possibilitando agilidade de plantio, com ganhos significativos em termos de logística e rendimento operacional.
 
Na maioria das vezes, o uso do glifosato para erradicação das soqueiras é associado ao método mecânico, já que essas operações combinadas garantem melhor controle. Entre os manejos mais utilizados, destaca-se a aplicação do ativo sobre as soqueiras enfolhadas com posterior entrada da grade intermediária. O inverso também é realizado, sendo primeiramente efetuada a operação mecânica e, após a rebrota da cana e emergência de plantas daninhas, a aplicação de glifosato.

O primeiro caso ocorre quando a colheita é realizada com umidade e seguida pelo período úmido, pois acontece rápida brotação da soqueira a ser eliminada. Já o segundo processo ocorre, predominantemente, quando a colheita é realizada em condição de solo seco e seguida de um período também seco. Esse fator é devido às brotações que demoram a atingir o estágio vegetativo ideal para aplicação do glifosato.

Em áreas com solos de textura mais leves, inclinados e com propensão à erosão, é necessária a adoção de técnicas conservacionistas. É usual a aplicação do herbicida sobre a soqueira seguida de subsolagem, técnica que evita arações e operações com grade, o que resulta em maior manutenção de cobertura de palha sobre o solo. Por outro lado, exige-se maior efetividade do ativo na soqueira, uma vez que não ocorre a complementação com controle mecânico.

Nas situações de reforma do canavial com culturas de sucessão, a erradicação das soqueiras de cana-de-açúcar, independentemente do método empregado, deve ser efetuada de forma efetiva para evitar a competição da tiguera com a plantação. Porém, ocorrendo alguns escapes, ainda há oportunidade de complementação com glifosato, como nas culturas tolerantes Soja RR ou com graminicidas inibidores de ACCase, como o amendoim e com crotalária.

No cenário de reforma cana sobre cana, sem rotação de culturas, a falha na erradicação da soqueira antiga pode resultar em mistura varietal, limitando a utilização do canavial formado como muda. Outro ponto importante é que a erradicação da soqueira realizada de forma eficaz faz com que as pragas que se alojam nas raízes e rizomas da cana-de-açúcar, como Sphenophorus levis e nematoides, quebrem seus respectivos ciclos e, consequentemente, reduzam os níveis populacionais na área.

No caso do controle químico, com glifosato da soqueira da cana-de-açúcar, a eficácia é influenciada por vários fatores, daí a variabilidade de resultados que ocorre no campo.
 
Alguns deles são relacionados à condição do alvo. Plantas que apresentam maior área foliar, mas sem a presença de colmos formados e em plenas condições de desenvolvimento, são mais suscetíveis do que as que já possuem colmos formados e estressados por deficiência hídrica, por exemplo.

A qualidade da água utilizada nos tanques de pulverização também pode afetar a eficácia dos herbicidas, inclusive o glifosato. As fontes podem ter diferentes características, incluindo alto teor de impurezas na água (argila e matéria orgânica), e qualidade da água e dureza - conteúdos de cátions, valores de pH, carbonato de cálcio e níveis variados de carbonato e bicarbonato. A presença de argila e/ou matéria orgânica, bem como a dureza da água, ou seja, os cátions polivalentes na calda de pulverização, incluindo o alumínio, o cálcio, o ferro, o magnésio e o zinco podem reduzir a eficácia do glifosato, em função da adsorção na argila, na matéria orgânica, nos cátions, entre outros, reduzindo assim a sua disponibilidade do glifosato na solução (calda de pulverização). Essa interação resulta em menor penetração e absorção pela folha e translocação na planta, reduzindo drasticamente a eficácia de controle. Para minimizar esses efeitos, deve-se utilizar água de boa qualidade para as pulverizações agrícolas, bem como selecionar as melhores formulações disponíveis, que poderão tolerar mais esses fatores: formulações com alta concentração de sal potássico associada com sal isopropilamina e agentes tensoativos específicos.

Outro fato bastante relatado é que a eficácia do glifosato é superior com a diminuição do volume de aplicação. Esse efeito é atribuído ao aumento da concentração do ativo e dos surfactantes presentes nas gotas depositadas, resultando em aumento de penetração, absorção e translocação. Os avanços na tecnologia de aplicação permitem que as pulverizações possam ser realizadas em baixos volumes de forma eficaz, desde que ocorra boa cobertura foliar das plantas de cana-de-açúcar.

Como qualquer outra aplicação de produto fitossanitário, as condições climáticas no momento da pulverização do glifosato devem estar dentro dos parâmetros considerados adequados para garantir a eficácia do produto. Não se deve aplicar herbicidas com umidade relativa do ar inferior a 50% e ventos com mais de 18 km/h. As aplicações de herbicidas pós-emergentes não devem ser realizadas quando a planta-alvo encontrar-se sob condições de estresse, em especial sob déficit hídrico, nessas condições, a absorção e a translocação são limitadas, o que causa perda de eficácia. Para minimizar esses efeitos, há algumas formulações de glifosato que toleram mais essa adversidade em função da alta concentração de sal potássico e sal isopropilamina, atuando mais rapidamente na folha. Nesse caso, deve-se trabalhar com boa tecnologia de aplicação e volume alto de calda de pulverização.

Chuvas após a aplicação do glifosato também podem comprometer o desempenho no controle da soqueira de cana, em função da elevada perda de da solução na folha pela lavagem com a água. Por isso, intervalos menores de seis horas entre a aplicação e a chuva diminuem a eficiência do controle quando são aplicadas formulações convencionais de glifosato (isopropilamina). No entanto, há vários resultados de pesquisa que demonstram que ao trabalhar com formulações diferenciadas, com um perfeito balanceamento entre concentrações elevadas de sal potássico e de isopropilamina e agentes tensoativos específicos, o intervalo entre a aplicação do herbicida e a ocorrência de chuva é mínimo, ou seja, de duas horas, promovendo assim maior segurança e consistência no controle de plantas daninhas e erradicação da cana-de-açúcar.
 
Outro ponto interessante é a presença de poeira e/ou calcário nas folhas de cana-de-açúcar e das plantas daninhas em função da alta capacidade adsortiva das partículas ao glifosato, representando assim fator importante na redução da superfície de contato das gotas com a folha e, consequentemente, menor penetração, absorção e translocação do ativo na planta, reduzindo a eficácia de controle e erradicação da soqueira da cana-de-açúcar.

O glifosato é amplamente utilizado no processo de reforma de canavial para destruição da soqueira. A eficácia no campo pode apresentar grande variação, em função disso é extremamente importante selecionar formulações de alta performance de glifosato. O entendimento e o controle dos principais fatores que afetam a eficácia são fundamentais para obtenção de grande frequência de sucesso.
 
*Marcos Kuva é Sócio/Diretor Herbae C. P. Agrícolas Ltda
* Ricardo J. de Paula é Engenheiro Agrônomo da Herbae C. P. Agrícolas Ltda
*Edson Donizeti de Mattos é Gerente de Pesquisa Agrícola da Ourofino Agrociência
*Roberto Toledo é Gerente de Produtos Herbicidas e Cana-de-açúcar da Ourofino Agrociência