A terra da Terra
26/12/2017
Agronegócio
POR: Revista Canavieiros
Por: Marino Guerra
Eu sou a terra, eu sou a vida. / Do meu barro primeiro veio o homem. / De mim veio a mulher e veio o amor. / Veio a árvore, veio a fonte. / Vem o fruto e vem a flor.
Eu sou a fonte original de toda a vida. / Sou o chão que se prende à tua casa. / Sou a telha da coberta de teu lar. / A mina constante de teu poço. / Sou a espiga generosa do teu gado / e certeza tranquila ao teu esforço. / Sou a razão de tua vida. / De mim vieste pela mão do Criador, / e a mim tu voltarás no fim da lida. / Só em mim acharás descanso e paz.
Eu sou a grande Mãe Universal. / Tua filha, tua noiva e desposada. / A mulher e o ventre que fecundas. / Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.
A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu. / Teu arado, tua foice, teu machado. / O berço pequenino de teu filho. / O algodão de tua veste / e o pão de tua casa.
E um dia bem distante / a mim tu voltarás. / E no canteiro materno de meu seio / tranquilo dormirás.
Plantemos a roça. / Lavremos a gleba. / Cuidemos do ninho, / do gado e da tulha. / Fartura teremos / e donos de sítio / felizes seremos.
O leitor deve estar perguntando qual a relação de uma entrevista com o presidente da Abag (Associação Brasileira do Agronegócio), Luiz Carlos Corrêa Carvalho, concedida em um evento chamado “Desafio 2050” com essa obra-prima da poetiza goiana Cora Coralina, chamado “O cântico da terra”, que viveu de 1889 até 1985.
Os dois falam de terra, a obra literária mostra a importância da terra para o ser humano, enquanto que a entrevista mostra como é, e ainda será mais importante - a terra do Brasil para todos os seres humanos do planeta.
Outro ponto de contato entre os textos de datas e estilos tão antagônicos está em seus respectivos finais, no qual os dois garantem a felicidade condicionada ao trabalho bem realizado.
Confira a entrevista, compare as essências, só não repare na beleza do texto, pois o talento desse que vos escreve é apenas um tolete de cana perto do imenso canavial que é a genialidade de Cora Coralina.
Revista Canavieiros: Hoje o maior entrave da produtividade nacional agrícola são as questões logísticas, como você vê a influência disso na necessidade de aumento no abastecimento do mercado mundial?
Luiz Carlos Corrêa Carvalho (Caio): Concordo que esse seja o principal entrave, é claro que precisamos ter a produção, ter a oferta, mas hoje a oferta é limitada pela capacidade logística. Tenho certeza que a produção do país seria maior se as estradas e portos tivessem a mesma eficiência dos campos.
Focamos nos portos que são a base de tudo, porque a partir dele fazemos a grande maioria das importações e exportações. Quando temos um país desequilibrado em algumas áreas, como por exemplo os combustíveis, e de repente começamos a aumentar as importações, criamos dificuldades logísticas para as exportações, o que prejudica a produção agroindustrial.
Revista Canavieiros: Então a questão portuária é a primeira providência logística que um novo Governo terá que se preocupar?
Caio: O porto e o que leva ao porto. O problema da logística de escoação dos produtos agro é generalizado, é preciso dar atenção especial a ela, como um todo, é o tema mais relevante que temos que evoluir.
Revista Canavieiros: A criação da cátedra Luiz de Queiroz, a qual tem como representante o ex-ministro Roberto Rodrigues, tem como meta organizar as ideias que envolvem tanto o agronegócio como outros setores importantes da sociedade em um projeto de Governo que será apresentado para todos os candidatos à Presidência da República nas eleições de 2018. Como você vê iniciativas como essa?
Caio: Esse é um projeto de fundamental importância, condiz muito com a mensagem transmitida aqui hoje pelo Maurício Lopes, presidente da Embrapa, de como nós olhamos o nosso futuro e a opção que temos. Temos que olhar o futuro encarando as dificuldades que temos hoje, conhecer as nossas limitações, mas para isso é importante que o Brasil tenha um rumo, ou seja, cada vez mais o país precisa ter claro o que deseja de fato, para aí sim buscar soluções. Numa visão macro de nação, hoje se discute um leque muito variado de temas, o que acaba causando uma dislexia no que é mais importante.
O projeto da Esalq é importante porque vai focalizar o debate, pretende unir toda a sociedade brasileira em volta do agronegócio e com isso ele ser a peça principal da engrenagem que vai trazer o tão almejado desenvolvimento econômico e social.
Revista Canavieiros: Qual deve ser o foco do pequeno e médio fornecedor de cana para 2030?
Caio: Com certeza é a superação de uma série de dificuldades que hoje afetam essa categoria de produtores rurais. Temos a política de crédito, que hoje está defasada no mínimo em 40 anos, depois vêm a logística e a infraestrutura, como disse anteriormente. Mas, sem dúvida, a questão primordial é a renda, a busca por melhores margens, para poder ter investimentos e também tornar a atividade viável para que ele permaneça no negócio e o torne atrativo para as gerações seguintes.
Revista Canavieiros: Os fatores primordiais para a evolução nessa questão da renda estariam relacionados à conquista dos três dígitos de produtividade por hectare e também uma necessária revisão do Consecana?
Caio: Essa agenda vai além disso, o produtor precisa focar na melhoria de renda, para poder fazer mais investimentos e ampliar ainda mais a renda, ou seja, sair do círculo vicioso que está vivendo, não por intenção dele, mas consequências de um mercado que ensaia sair da maior crise de sua história, e entrar em um círculo virtuoso, onde a remuneração tem que ser tão importante quanto a capacidade de investimento.
Revista Canavieiros: Como você enxerga a relação entre mudança climática e biocombustível no presente e futuro?
Caio: As mudanças climáticas que tiveram o seu combate ratificado como políticas públicas no Governo Temer, em decorrência do que foi assumido pelo Brasil durante a Conferência das Nações Unidas de Paris, a COP 21, induz naturalmente a um processo de descarbonização, isso pressupõe a utilização da biomassa em larga escala para a produção de etanol, outros biocombustíveis e energia elétrica, essa é a tendência lógica e fundamental para que um setor como o canavieiro e todos relacionados a esse processo tenham a previsibilidade necessária para almejar um futuro brilhante.
Revista Canavieiros: O artigo divulgado pela Folha de S. Paulo, no dia 26 de novembro de 2017, pelo consultor Samuel Pessoa, intitulado “Renovabio: Uma má ideia”, onde o articulista defende a utilização da Cide como instrumento de regulação do mercado de combustíveis, alegando que, com o Renovabio, o setor ganhará duas vezes, com a renda dos certificados e com a elevação do preço do álcool (forma que o autor se refere ao biocombustível mostrando completa desatualização sobre as terminologias praticadas no mercado), e no caso do imposto o ganho iria para os cofres públicos, auxiliando o ajuste fiscal. Qual sua opinião sobre isso?
Caio: Esse artigo me pareceu voltado ao interesse do Ministério da Fazenda, ou então de alguém que está olhando para uma questão na qual o Brasil está obcecado, que é importante, mas não pode pensar somente no ajuste fiscal, senão nunca vamos desinchar o estado e evoluir com os setores produtivos. Eu penso que é preciso enxergar lá na frente, por exemplo: o que discutimos nesse evento, que é 2050. Para essas metas, programas modernos como o Renovabio são fundamentais, o equilíbrio do país é fundamental, não podemos imaginar o Brasil como um país em constante desequilíbrio, e nesse artigo ele dá soluções pontuais para um país que vai viver em desequilíbrio constante, sendo assim as argumentações desse artigo são totalmente fora de qualquer contexto.
Revista Canavieiros: Qual será o cenário do mercado de etanol em 2050?
Caio:Eu acho que não somente o etanol, mas tudo aquilo que é agronegócio em escala, seja na forma de fibras, ou então de óleos vegetais ou de sacarose. Todos eles vão estar em um ponto muito importante, o primordial é nós olharmos para as tendências e entendermos elas como o norte. E qual é o norte hoje? É que a valorização dos alimentos a qual caminha inversamente em relação a imagem do petróleo, que ainda é a principal commodity do planeta, então estamos caminhando juntos e olhamos para o todo, e o todo indica que o futuro é o país, é o Brasil, pois o branding do Brasil é energia e alimentos, então nosso futuro deverá ser muito valorizado.