Academia do Herbicida
03/01/2018
Geral
POR: Revista Canavieiros
O termo academia é originário da Grécia, quando Platão começou a reunir pensadores para discutir questões filosóficas em um local denominado Jardins de Akademus (herói ateniense). No Brasil existem diversas academias que definem um local onde os notáveis de determinada área se reúnem,exemplos mais populares são Academia Brasileira de Letras e Academia de Futebol.
Em Piracicaba-SP, durante os dias 30 e 31 de outubro, na terceira edição do Simpósio Sobre Manejo de Plantas Daninhas em Cana-de-Açúcar, ou SIMPDcana, foi criada uma espécie de academia passageira, isso porque é totalmente inconcebível deixar tantos especialistas represados a vida inteira em um local só.
Mesmo que por pouco tempo, a dinâmica muito bem montada pelos organizadores(o professor da Esalq-USP, Dr. Pedro Christoffoleti, e o consultor Dr. Marcelo Nicolai) fez com que o melhor do conhecimento de cada participante fosse transferido para o público que com certeza evoluirá no manejo e uso dos agroquímicos.
Tudo começa no preparo da área
O primeiro tema abordado, a utilização de herbicidas de pré-plantio, pode-se dizer que é a forma mais racional de combater as plantas daninhas, no entanto para se atingir a perfeição nessa opção de manejo, é preciso de algo que quase sempre é muito complicado, ou seja, o pessoal do campo convencer os responsáveis pelas planilhas e gráficos, tempo.
O lado acadêmico do assunto foi abordado pelo dr. Pedro Christoffoleti, o qual demonstrou que o preparo de solo, na reforma do canavial, precisa estar integrado com a estratégia de combate as plantas competidoras focando em quatro momentos específicos: Eliminação de soqueira, combate ao banco de sementes, monitoramento dos escapes e planejamento para aproveitar as características de seletividade dos produtos.
Baseado nessa filosofia, o pesquisador enumera problemas fundamentais em adotar a estratégia TCPC – Tira Cana, Põe Cana – adotada pelo mais ansiosos. Em relação à competição, ao enterrar as sementas da superfície, o produtor estará possivelmente adotando uma atitude paliativa, isso porque estudos comprovam que diversos tipos têm grande capacidade de dormência e sobrevivência.
A utilização do glyphosatepara dissecar as soqueiras ainda é a prática mais recomendada, no entanto é preciso ficar atento a alguns detalhes,como por exemplo: deixar o produto fazer efeito durante pelo menos dez dias de sua aplicação, prestar atenção em algumas características da água que será misturada ao produto, como o seu PH, o ideal é que ela seja ácida (por volta de 4,5) e também a utilização dela com matéria orgânica, ou seja, retirada de rios, lagos ou poços, onde pode eliminar até 30% da capacidade de uma aplicação ideal.
Caso tenha muito tempo entre a destruição das soqueiras e o início do plantio, e a opção é não executar a rotação de cultura, o professor da Esalq também deixa aberta pela opção da utilização de um produto com residual alto, o que vai atacar o banco de sementes com um número de aplicações baixo, no entanto o ideal é deixar o solo descoberto por pelo menos 6 meses.
Sobre a utilização das moléculas recomendadas para o pré-plantio incorporado (PPI) deve ser utilizado para quem não pretende realizar novas aplicações no momento do “quebra-lombo” e também em áreas de expansão.
Quem imagina que a rotação de cultura com a cana-de-açúcar é eficiente somente para deixar nitrogênio no solo pode começar a rever os seus conceitos, Cristoffoleti mostra que a prática também gera vantagens no controle das plantas daninhas, mas alerta que é necessário um planejamento prévio para aliar a melhor cultura e combater os vizinhos indesejados, se for possível utilizar a “meiose” nesse momento, é melhor ainda.
Representando o Grupo São Martinho, e mais especificamente a Usina Iracema, o engenheiro agrônomo, Luiz Henrique Franco de Campos, reforça a tese do professor ressaltando que a utilização da adubação verde (sinônimo para rotação de cultura) é uma prática consolidada em sua empresa, só que eles avaliam cada situação para definir se é possível e qual produto será utilizado junto com a cultura intermediária.
Para fechar o primeiro painel, o representante da Baldan Soluções Integradas, Edison Baldan Júnior, mostrou que é possível otimizar o processo de aplicação, o que gera benefícios como o de redução de pisoteio e rendimento operacional, integrando o quebra lombo com a distribuição do produto no solo.
Manejo de Plantas Daninhas em Áreas de Mudas Pré-Brotadas (MPBs)
O MPB pode ser considerada uma tecnologia antiga no que se trata de técnicas de plantio de cana-de-açúcar, pois era uma prática que havia deixado de ser utilizada há tempos, no entanto, com o advento da colheita mecanizada, ganhou grande importância devido seu alto grau fitossanitário.
Sendo assim, a relação dessa prática com os herbicidas era assunto que não poderia ficar de fora em evento de tamanha amplitude técnica. Com isso o consultor dr. Marcelo Nicolai foi o responsável da palestra técnica sobre o tema.
O primeiro assunto abordado foi sobre a questão dos produtos químicos gerarem ainda mais stress, pois o momento que deixar o viveiro de mudas e for para o campo pedirá mais energia da planta, o que poderá afetar a sua produtividade e longevidade.
Com isso, em áreas que está planejado o plantio através do MPB é preciso realizar um planejamento muito minucioso do que será utilizado desde a destruição da soqueira, com o objetivo de deixar um solo limpo (de resíduos e também mato) para a muda se desenvolver perfeitamente.
O consultor aponta que a prática de fazer a sulcação é recomendada, pois vai aprofundar as raízes e também permite que o herbicida trabalhe em uma camada mais superficial do solo, com o mesmo raciocínio ele condena o uso do plantio com matraca, pois deixa a raiz muito superficial e exposta aos produtos que estão na terra.
Para casos da introdução de mudas em áreas com falha, uma ideia bastante interessante é a utilização de veículos de pequeno porte que faz a aplicação anterior, justamente para tomar cuidado com a pequena cana.
Grama-seda: Desinfestação com eficácia e seletividade
A grama-seda é sem dúvida nenhuma uma das maiores vilãs que atormentam a vida dos produtores de cana, pequena, mas com um potencial devastador, em áreas com alta infestação pode roubar 40% da produtividade e reduzir sua longevidade de 2 a 3 cortes, com certeza ela é um gatuno que precisa ser eliminado.
Para se ter ideia da importância que ela conquistou, foi desenvolvido um painel somente para ela, o qual foi apresentado pelo pesquisador do IAC/APTA – Ribeirão Preto-SP, dr. Carlos Alberto Mathias Azânia, onde ele apontou a resistência de sua raiz como o fator preponderante para diversos insucessos na briga para eliminar ela. Sua capacidade de perenidade é tão grande que, mesmo se não conseguir emergir, sua capacidade de imersão pode ultrapassar os dois anos.
Com isso a recomendação para cana-soca é combater no seu terço inicial de crescimento, sempre levando em consideração que não vai resolver o problema em definitivo, apenas serão diminuídos os prejuízos da competição, nos outros terços a própria questão do sombreamento já prejudica o desenvolvimento de sua parte externa.
O pesquisador ainda aponta outras medidas que são eficazes no combate de sua infestação, como a limpeza de máquinas agrícolas para evitar sua disseminação, principalmente implementos de preparo de solo; utilizar variedades de brotação rápida com o objetivo do solo ficar mais tempo “sombreado” e a utilização de herbicidas residuais de alta e média solubilidade, com o objetivo de combater as raízes da gramínea.
O engenheiro agrônomo da Raízen, Francisco Tatit, apresentou a verdadeira operação de guerra que montaram para combater a grama, principalmente nas regiões de Piracicaba e Araraquara, a qual teve como princípio a única maneira de se exterminar o seu banco de sementes, deixar a área parada por até 12 meses, não podendo nem trabalhar com rotação de cultura.
Nesse projeto consistiram diversos procedimentos, como: dissecação das soqueiras e depois mais uma aplicação para a desinfestação química, com isso ainda foi registrada uma rebrota média de 30%, depois entrou com o controle mecânico, voltando ainda cerca de 15%, catação pontual, caiu para 10%, aplicação de composto (torta de filtro), catação química localizada (antes do quebra lombo). E ainda não acabou ... Só conseguiram atingir os 100% de controle continuando com a catação química localizada nos cortes seguintes.
O representante da Ihara, Rodrigo Naime Salvador, criou uma esperança nos profissionais que enxergam a grama-seda como um monte de espinhos, ele disse que a empresa deve lançar uma nova molécula de graminicida em 2018.
Manejo de Plantas Daninhas na Cana-planta: Necessidades e tendências
Manejar as plantas daninhas no primeiro ano da cana significa que a lição de casa, que é acabar com a vizinhança na hora de fazer o preparo do solo, por um motivo ou outro não foi feito. Com isso o consultor, dr. Marcos Antônio Kuva, deixou muito claro que nesse período os profissionais terão que prestar muita atenção antes de fazer suas escolhas de manejo.
Duas questões deverão exigir muita reflexão, é melhor tolerar os eventuais escapes para preservar a cultura, ou encarar eventuais problemas de fito e liquidar o mato? Tudo isso dependerá de cada cenário, pois podem chegar a milhares de variáveis.
Em alguns lugares a opção de se realizar o manejo de plantas daninhas na cana planta não existe, como é o caso apresentado pelo engenheiro agrônomo da Usina CerradinhoBio, Luiz Fernando Aparecido de Almeida, onde a condição de afloramento de água em boa parte do canavial, que fica no município Chapadão do Céu-GO, exigem o combate às plantas daninhas seja eficiente no preparo do solo e até mesmo no plantio.
Um dado que eles coletaram em sua unidade que mostra o quanto as colhedeiras de cana são importantes vetores de disseminação de sementes de concorrentes, foi na execução da lavagem de uma máquina, onde ficou constatado que ela estava carregando cerca de um litro de culturas indesejadas para outras áreas.
Para quem não quer ou não pode ter que pensar em ficar durante todo o tempo do canavial tendo que ficar se planejando em executar aplicações de herbicidas, quem conhece a realidade de um canavial sabe que nem sempre, do ponto de vista de disponibilidade de maquinário, é possível fazer duas ou até três operações de combate por safra. Pensando nisso a Bayer, através do seu representante Augusto Monteiro, fez uma breve apresentação do Alion, lançamento que tem como principal característica sua longa capacidade de residual, podendo ficar no solo por até 150 dias, ou seja, mesmo em um cenário com 60 mm de chuva, o produto entra até 5 cm no solo, o que não impede que ele atue no momento de germinação do mato.
Herbicidas residuais e o comportamento no solo
Ao optar pelo uso dos produtos pré-emergentes, que em sua grande maioria tem o comportamento residual alto, é preciso se atentar aos principais componentes, internos e externos, envolvidos com tal prática, que são: os custos e a sustentabilidade, e os dois exigem apenas uma coisa da equipe agrícola, evitar o seu desperdício.
Esse foi o foco da palestra ministrada pela professora da Ufscar, dra. Patrícia Andrea Monquero, na qual mostrou que embora o custo dessa categoria esteja em um patamar elevado, seus diversos fatores de eficiência podem justificar tal investimento.
Na explanação ela apresentou fatores que qualquer profissional com alguma experiência precisa se preocupar, como umidade do solo, características de solubilidade e situação da palhada na hora de aplicar.
Sobre os fatores de desperdício ela lembrou sobre os fatores relacionados às características do solo, como as diversas formas que ele pode se movimentar em decorrência de características como a quantidade de argila presente e também fatores químicos, como o seu PH.
Na apresentação da case do painel, a engenheira agrônoma da COFCO, Patrícia Fontoura, acrescentou também o problema do pisoteio na área como um grande causador da perca de eficiência da ação dos herbicidas.
Em seguida o representante da FMC, Leonardo Brusantin, lembrou que é necessário considerar as infinitas possibilidades que existem na hora de compor um produto, o que impossibilita que um seja igual ao outro, levando em consideração o maior número de informações sobre todos os quesitos que compõem o ambiente antes da sua compra.
Herbicidas pós-emergentes na cultura da cana: como utilizá-los?
Ao ver a apresentação do empresário Edison Baldan Júnior a resposta é bem clara, através da utilização de tecnologia, principalmente através da aplicação de precisão usando o recurso de drones.
No entanto, essa técnica ainda levará um tempo para se tornar totalmente eficiente. Segundo as apresentações do engenheiro agrônomo do Grupo Ipiranga, Thiago Veloso de Araújo, o avião ainda é a primeira opção em casos de infestação pós-emergente. E para essa necessidade específica o representante da Syngenta, Lupérsio Garcia, apresentou o Lumica como uma alternativa tecnológica para ser utilizada.
Seletividade de herbicidas para a cana-de-açúcar: mitos e verdades
Logo no início de sua apresentação, o professor da Universidade Federal do Sul de Minas, dr. Saul Jorge Pinto de Carvalho, quebrou dois mitos muito comuns quando o assunto é a seletividade dos exterminadores de daninhas. A primeira é sobre o seu conceito, que nada mais é que acertar a vizinha e não a cana. A segunda é que o termo tem que usado para o tratamento, e não para o produto, ou seja, para ser seletivo é preciso levar em consideração fatores que vão além da fórmula, mas suas doses, métodos de aplicação e até composição do ambiente, como solo e clima.
Para comprovar sua teoria ele sua como exemplo o caso do Glyphosate, o qual pode ser considerado seletivo, porém é preciso considerar o tempo, tem que esperar ele sair do solo. Um outro caso é sobre a seletividade quanto ao espaço, onde quando um tolete é plantado à uma profundidade de 20 ou 25 cm, ele estará seletivo ao produto que conseguir atingir no máximo 5 cm terra a dentro.
Com isso o professor consegue definir o tema de maneira bem objetiva e simples: “O melhor herbicida do mercado chama conhecimento e informação”.
E como uma das melhores maneiras para conseguir conhecimento e informação é através da experiência o case apresentado pelo engenheiro agrônomo do Grupo São Martinho, o mesmo que já havia participado do evento, Luiz Henrique Franco de Campos, na qual ele apresentou o programa “calda pronta” onde foram registrados índices de máxima eficiência na aplicação em áreas com daninhas em decorrência em se ter desenvolvido um time de especialistas na área.
“Catação das plantas daninhas: como otimizá-la?”
Se o tratamento do solo antes do plantio não deu certo, a utilização dos pré-emergentes deu pouco resultado, e mesmo com a chuva dos pós-emergentes ainda há vizinhas residentes é preciso apelar para a última opção de manejo: a catação.
Em sua apresentação, o engenheiro e empresário Luiz Cesar Pio, disse da importância do procedimento até hoje, principalmente quando são identificadas plantas de maior impacto, no entanto trabalhar com mão-de-obra no Brasil ficou muito caro e o pequeno e o médio fornecedor dificilmente têm condições de investir nisso, obrigando-o a utilizar a criatividade para adaptar, da melhor maneira possível, máquinas e implementos que os ajudem a executar o trabalho.
Devido a exigências das normas do trabalho, a utilização do modelo costal está com os dias contatos, como alternativa Pio aposta na utilização ou de quadriciclos adaptados ou até mesmo o de minitratores.
A pioneira no uso das motos off road na cultura canavieira foi a Usina Mandu, do Grupo Tereos, onde ele se mostrou bastante satisfeito em áreas com infestação baixa, no entanto o rendimento cai em áreas onde a concorrência é maior, isso por causa de seu tanque, que oferece pouca autonomia.
Conhecimento, a melhor foto
Na edição especial das 50 melhores fotos da National Geographic, um dos mais importantes profissionais da revista e diretor de conteúdo na época, Chris Johns escreveu no editorial da revista: “Eu me incorporava ao ambiente e ficava à espera. Ao desaparecer, ao sumir no meio das coisas, conseguia captar expressões e emoções. Me movia em silêncio sem abrir a boca”.
Durante do III SIMPDcana esse foi exatamente o meu sentimento, não me movia, apenas prestava o máximo de atenção possível para tentar absorver cada gota daquele mar de conhecimento assim como Johns se preocupava com cada mudança em uma feição.
Sei que seria necessário um livro com centenas de páginas para passar tudo aquilo que foi transmitido em apenas dois dias, no entanto,espero ter conseguido pelo menos ter despertado o interesse daqueles que trabalham na área e com isso ter contribuído para cada vez mais o setor se orgulhar como um dos que faz o uso mais consciente e eficaz de herbicidas, mesmo depois de tudo que passou com a mecanização do corte.