Cana não bandida e sim abençoada

05/02/2019 Agronegócio POR: Revista Canavieiros
Sou do tempo que os plantadores e processadores de cana eram considerados pessoas irresponsáveis, por poluírem o meio ambiente com a vinhaça que alguns jogavam nos rios e pela queimada da palha da cana obrigatória para facilitar a colheita manual. Há muito tempo somos acusados de degradadores do meio ambiente.

Felizmente participamos do projeto que passou a usar a vinhaça como fertilizante da própria cana. Depois fizemos parte da equipe que desenvolveu a tecnologia que permite ter ótima colheita mecanizada.

Estamos concluindo o estudo sobre a colheita de Cana Integral.
Esta proposta contempla a colheita da cana sem a queimada, e toda cana, incluindo as folhas secas e verdes, é levada junta para a unidade processadora. Todo material após ser triturado em mistura homogênea passa pela moenda para extração do caldo contido na Cana Integral.
O caldo extraído segue para o processo industrial para fabricação de açúcar e/ou etanol. O bagaço todo homogeneizado segue para ser queimado na caldeira, ou para produção de etanol 2G, ou para a produção de papel ou outros usos mais específicos.

O bagaço é queimado na caldeira para a produção de vapor, que é usado na própria unidade processadora de açúcar e/ou etanol, ou é usado para geração de energia elétrica para uso próprio ou venda. Considerando que no Brasil está se tornando impossível o aumento expressivo da geração de energia elétrica tendo a água fluvial como acionadora das turbinas, resta como uma das opções viáveis a geração de energia elétrica a partir do bagaço da Cana Integral, que será uma energia elétrica de fonte “solar-vegetal”, pois a cana é armazenadora da energia recebida do sol para ser processada em todo o ano. Não haverá o efeito das oscilações do nível da água nas represas, não haverá a interrupção temporária do vento na eólica, não haverá a noite na energia solar fotovoltaica e não haverá necessidade da energia nuclear que é tão perigosa.

Os únicos custos adicionais de processar Cana Integral são o transporte das folhas do canavial até a unidade processadora e o aumento de produtos para processar o caldo menos puro. Acontece que os estudos realizados por nós indicam que a Cana Integral proporciona um lucro pleno de no mínimo 50% a mais que o lucro obtido na fabricação de açúcar e/ou etanol, na média de 10 anos já considerando o transporte das folhas.

A explicação técnica e econômica para validar este expressivo lucro é que, com a colheita de Cana Integral, acontecem vários benefícios para a área agrícola em relação ao que ocorre atualmente sem ser cana integral, quando a palha é descartada no momento da colheita.

Há um item a ser considerado que poderá ser motivo de contestação, que é quanto à passagem da palha pela moenda junto ao colmo. Antes se pensava que a palha “roubava” sacarose do colmo. Pelos estudos já realizados por alguns pesquisadores e mais as diversas análises realizadas por nós, descobrimos que a palha da cana tem sacarose e é em quantidade maior do que é perdida no bagaço quando sai da moenda. Os nossos estudos indicam de 4,0 a 10,0% de POL no caldo, ou seja, aproximadamente 20 a 50% de sacarose em relação ao caldo normal extraído do colmo. Vale lembrar que a POL do bagaço é de 1,8 a 2,2%, que é menos do que tem na palha antes de iniciar o processo de extração. A lógica desta afirmativa é que na folha são produzidos açúcares sendo a sacarose um deles, e no momento exato que o colmo é cortado, ainda está na folha a sacarose produzida, que ainda não se deslocou para o colmo.

Diante das vantagens operacionais e mais o aumento do lucro obtido em todo o processo da colheita até o processo industrial, não há dúvida que podemos afirmar, que tanto a cana, como seus produtores e processadores não mais serão considerados “bandidos”. Não haverá mais queimada da palha, a área agrícola passa a não ter mais as perdas que têm acontecido, e a unidade industrial aumenta as opções de produtos produzidos. Especialistas no assunto fizeram uma conta que indica que estamos jogando fora energia de aproximadamente 15 "Itaipus". Há trabalhos publicados que dão base para esta afirmativa.

Vamos ter uma cultura que não mais prejudicará o meio ambiente, teremos o aumento significativo na produção de açúcar, de etanol e energia elétrica sem precisar plantar um palmo a mais de terra além do que já está plantado. Vale lembrar que está vindo o carro elétrico e a Cana Integral é uma grande fonte produtora de energia elétrica sustentável.
Com o processamento de Cana Integral a cana torna-se totalmente abençoada.
 
*José Alencar Magro é engenheiro agrônomo