Como a Raízen enxerga o fornecedor de cana

22/03/2021 Cana-de-Açúcar POR: MARINO GUERRA

Ricardo Berni - diretor de negócios agrícolas da Raízen

 

Com a aquisição da Biosev é natural que uma grande parte dos produtores de cana da região de abrangência da Copercana e Canaoeste, tanto os com contratos estabelecido com o antigo grupo, como os que cultivam em região onde esteja instalada alguma unidade, queiram entender como a Raízen se relaciona com seus fornecedores de matéria-prima.
Em entrevista exclusiva para a Revista Canavieiros, o diretor de negócios agrícolas da Raízen, Ricardo Berni, esclarece alguns pontos de conflito que hoje são latentes e precisam evoluir no relacionamento entre indústria e campo.
Portanto, nas linhas a seguir, será possível entender, ainda de maneira bem superficial, o que pensa o maior grupo sucroenergético do país a respeito de questões como apoio aos fornecedores, compactação de solo, rotação de cultura e colheita.

Revista Canavieiros: Como a Raízen enxerga a figura do fornecedor de cana hoje?
Ricardo Berni: O fornecedor de cana é parte importante na estratégia da Raízen. Atualmente, eles representam aproximadamente 50% do fornecimento da matéria-prima que é processada em nossas unidades industriais. Por meio do Cultivar, nosso programa busca oferecer as melhores soluções para esses produtores em toda sua jornada de negócios, conseguimos fazer com que a troca de experiências com esses parceiros aconteçam de diversas formas, seja por meio de fóruns do nosso programa de relacionamento ou no dia a dia. Também mantemos um incentivo contínuo de boas práticas agrícolas e operacionais por meio do Programa ELO, que busca promover o desenvolvimento sustentável dos fornecedores nos pilares econômico, social e ambiental. Nosso objetivo é gerar cada vez mais valor para cadeia produtiva de cana-de-açúcar e manter relações produtivas em uma visão de curto, médio e longo prazo.

Revista Canavieiros: Há casos de sucesso de unidades industriais que conta com 100% da cana vinda de fornecedores, o que a Raízen pensa sobre esse modelo? Considera implementá-lo em alguma unidade no futuro?
Berni: Sim, atualmente contamos com usinas com 100% da cana advinda de fornecedor. Também dispomos de unidades produtoras em que o mix de produção ultrapassa os 50% de cana proveniente de parceiros. Esta é uma estratégia alinhada com o plano estratégico da companhia, que busca reconhecer o valor da cana do fornecedor nas frentes de negócio e colocar essa matéria prima na esteira da usina.

Revista Canavieiros: Um dos motivos que levou a Raízen a comprar a Biosev foi a questão da bioenergia (segundo noticiado pelo próprio grupo). Em cima desse ponto, qual a visão da empresa sobre o cultivo da denominada “cana-energia”? Vocês têm canaviais que utilizam esse tipo de cana em escala comercial? É possível o fornecedor de cana adotá-la? Se sim, como vislumbram o seu pagamento, já que por meio do Consecana-SP não seria possível?
Berni: A cana-energia é um termo genérico que se dá a variedades de cana-de-açúcar com alto teor de fibra e alta produção de biomassa. Em 2015, a Raízen iniciou um trabalho com a empresa Vignis e retomou a usina Bom Retiro, em Capivari (SP), para utilização desse tipo de variedade. Por se tratar de uma tecnologia ainda não desenvolvida plenamente pelos programas de melhoramento, os resultados foram abaixo do esperado e, no ano passado, deixamos de utilizar essa variedade em nosso portfólio. Trabalhos em escala experimental ainda são conduzidos com a Granbio, empresa de biotecnologia industrial, avaliando materiais que possam fazer sentido para estratégia futura. Nossos fornecedores seguem as decisões estratégicas da Raízen e, em relação à cana-energia, com certeza irão adotar se comprovado o resultado positivo. O sistema de pagamento será desenvolvido para um material com características de maior fibra e menor ATR.

Revista Canavieiros: Especialistas apontam que um dos maiores gargalos de produtividade na cana-de-açúcar está na compactação do solo e preservação da soqueira. Quais manejos o grupo utiliza para minimizar esses dois pontos?
Berni: Para redução da compactação do solo e consequente preservação da soqueira, consideram-se elementos como: adoção de técnicas modernas de conservação de solo, bem como a adoção de 100% de projeto digital na formação da lavoura; uso de operações de descompactação de solo no preparo de solo, como a subsolagem; busca por controle de tráfego na colheita e nas operações de tratos; incorporação de corretivos em profundidade, a fim de garantir descompactação e correção de solo e aporte de nutrientes em profundidade, aumentando a densidade de raízes; e, por fim, o controle intensivo de pragas de solo, em especial Sphenophorus levis.

Revista Canavieiros: A rotação de cultura é hoje uma prática cada vez mais adotada no mundo da cana tanto por razões econômicas, como pensando na fertilidade do solo. Qual a política da Raízen sobre o tema?
Berni: A rotação de cultura, em especial com leguminosas, é essencial para a manutenção do potencial produtivo de novas lavouras formadas. Em toda área que é possível adotar manejo de rotação, seguimos com essa prática, contando com parceiros para plantio de outras culturas. Esse método, baseado principalmente em leguminosas, faz parte do programa de conservação de solo da Raízen, juntamente com a fixação de nitrogênio, aumento da eficiência do controle de pragas de solo e redução do banco de sementes das principais plantas daninhas, que contribuem para o aumento de produtividade e redução de custos

Revista Canavieiros: Vocês cultivam culturas de rotação? Em qual escala? Tem alguma política de arrendamento? Como ela funciona?
Berni: A Raízen trabalha com parceiros para plantio de outras culturas, em especial soja e amendoim. Este modelo é utilizado em algumas áreas de passagens e reformas do canavial, que não tenham residual de alguns herbicidas restritivos. Nesta safra, 20/21, foi possível ocupar um total de aproximadamente 35 mil ha, priorizando a destinação destas áreas aos nossos atuais fornecedores de cana. O modelo desse subarrendamento de áreas para cereais envolve uma negociação em sacas de soja ou amendoim e a execução de operações de preparo de solo pelo parceiro.
Revista Canavieiros: Um importante ponto no relacionamento fornecedor/usina está na colheita, principalmente na questão de atrasos que podem gerar queda na produtividade e até mesmo grandes prejuízos em caso de incêndio. Como a Raízen trabalha essa questão? O grupo já tem prática inspirada no conceito de blocos de colheita? Como considera a ideia de formação de condomínios administrados por fornecedores para executarem o corte em determinada área?
Berni: Uma boa gestão do canavial exige planejamento. Na colheita, é essencial buscar a formação de blocos, respeitando a melhor época de cada fazenda, buscando o maior potencial produtivo de acordo com cada tipo de solo, ambiente, variedade, etc. Os blocos de colheita permitem unir o pacote de recomendação técnica com a melhor otimização logística, garantindo redução de custos, sem abrir mão da técnica.

Revista Canavieiros: Como considera a ideia de formação de condomínios administrados por fornecedores para executarem o corte em determinada área?
Berni: A Raízen corrobora com os condomínios de colheita administrados por fornecedores, que têm atuação em regiões específicas, entendendo que este caminho pode ser uma iniciativa de redução dos custos de CCT. Por meio do ELO, programa que impulsiona o desenvolvimento sustentável dos fornecedores da Raízen, em parceria com a Imaflora e a Solidaridad, organizações especializadas no desenvolvimento de cadeias de produção sustentáveis, disponibilizamos suporte aos produtores e condomínios nos temas relacionados às regras básicas do trabalho rural, que permeiam nos temas como: idade mínima de contratação, jornada, fornecimento de EPIs, infraestrutura de atendimento ao trabalhador, alojamentos e trabalhadores migrantes.