Conexões sucroenergéticas

Agronegócio POR: Diana Nascimento

Webinars com representantes do setor abriram a primeira semana da Fenasucro & Agrocana Trends

Para incentivar conhecimentos, desenvolver inovação e oferecer oportunidades de networking e criar conexões entre toda a cadeia produtiva da bioenergia, a Fenasucro & Agrocana concentrou conteúdos on-line e off-line em uma plataforma digital e acessível.

Chamada de Fenasucro & Agrocana Trends, a plataforma iniciou as suas atividades no mês de agosto, entre os dias 18 e 20, com três webinars, incluindo a 9ª Conferência Datagro Ceise Br, que contou com a presença de alguns dos principais representantes do setor sucroenergético para discutir as tendências e os impactos do setor no Brasil e no mercado internacional.

O diretor da feira de bioenergia, Paulo Montabone, moderou os três encontros e lembrou, na abertura do primeiro webinar, que o setor não parou nessa pandemia.

Já o presidente emérito da Fenasucro & Agrocana, Antonio Eduardo Tonielo, pontuou que acompanha a feira desde o seu início, há 27 anos, sendo uma vitrine de novas tecnologias e networking entre representantes da cadeia. "Esperamos que no ano que vem possamos participar da feira física", disse.

Evandro Gussi, presidente da Unica (União da Indústria de Cana-de-açúcar), ressaltou que a bioeconomia é o setor sucroenergético do século XXI. "O etanol é miríade de oportunidades do Brasil para o mundo, com várias aplicações. Somos um redutor natural de emissões de carbono e temos um longo futuro pela frente. Não há uma voz lúcida que diga que a volta da retomada não será com alta sustentabilidade". Para Gussi, o RenovaBio é a corrida pela sustentabilidade energética.

Plínio Nastari, CEO da Datagro, observou que estamos com preços interessantes para açúcar e etanol, com perspectivas de valorização do etanol por suas externalidades. "Ele está se mostrando a ferramenta mais rápida para o controle da poluição e os biocombustíveis têm essa capacidade de melhorar a qualidade do ar. Isso sem falar que o etanol é neutro na emissão de carbono." Nastari também salientou que a preocupação é com a saúde e o meio ambiente, coisas que o setor oferece, especialmente com a valorização do etanol pelas suas qualidades ambientais e reconhecimento da sustentabilidade do setor.

O diretor da Datagro, Guilherme Nastari, reiterou que as cidades estão reconhecendo o valor do agronegócio. "Hoje estamos meio que na moda. Não tem mais volta a economia que não respeita a relação desenvolvimento e meio ambiente. Tivemos o reconhecimento de nosso esforço, inclusive internacional. O setor está em uma nova fase".

Para o deputado federal Arnaldo Jardim, o setor vive um momento importante e conseguiu se preservar mesmo diante de uma agonia no mês de março, quando o governo podia ter sido mais presente. "O setor reencontrou o caminho, mostrou exemplos de solidariedade na crise com distribuição de álcool em gel e outras ações. Além disso, a pesquisa em produtividade agrícola no setor é estratégica e temos ainda a biocoalização dos biocombustíveis com vistas para a sustentabilidade e economia verde para o futuro. O setor nos orgulha com a sua atuação na economia", apontou.

Energia para o mundo

Indagado sobre o que precisa ser feito para que a bioenergia ganhe o mundo mais rapidamente, o CEO da Datagro disse que, com humildade e segurança, é preciso transmitir a experiência do Brasil que é exitosa e de desenvolvimento econômico aos países que precisam de uma experiência como essa. "O modelo do Brasil se aplica em muitos países, precisamos unir esforços porque estamos discutindo a mobilidade em nível mundial e deve haver coordenação e intenção. Não adianta ser eficiente da porteira para dentro e ter produtividade de três dígitos se o produto não é valorizado e não tem ampliação de mercado. Tem que haver compreensão sobre o valor estratégico deste setor que inclui outras cadeias. O segmento já está com emissão negativa, mas precisamos reconhecer isso com instrumentos modernos e relevantes. É um trabalho para outras gerações", avaliou.

Gussi lembrou que um dos desafios também é inserir na educação a valorização do biocombustível. "Muitas pessoas desconhecem o setor, mas quem conhece tem orgulho. Superamos o desafio de ter um negócio sustentável. Devemos mostrar que temos a sustentabilidade como negócio. Novos negócios são de sustentabilidade, e descarbonização será a palavra de ordem do século 21. Há determinados setores em que a meta de descarbonização pede um investimento considerável e exponencial. Quem tem a sustentabilidade como negócio, como é o nosso caso, tem um futuro considerável. O futuro está à nossa porta e a bola é nossa. Temos o que o mundo quer", vislumbra.

Trabalho reconhecido

Durante o webinar, a Reed Exhibitions Alcântara Machado e o Ceise Br fizeram uma homenagem para Plínio Nastari, que compartilha seu conhecimento sobre o setor de forma simples e comum, sendo ainda a personificação do "pai" do RenovaBio. 

"O Plínio é um exemplo para qualquer pessoa do agronegócio e do setor, para qualquer família. O nosso setor tem o Plínio como um baluarte. Essa homenagem simboliza o seu respeito pelo trabalho e dedicação dispensados ao setor", enalteceu Tonielo.

Emocionado, Nastari agradeceu a homenagem e reafirmou que sua missão é levar a bioenergia para o mundo. "O carinho de tantos amigos é uma surpresa para mim. Nossa causa é nobre, valorizar não só o esforço de brasileiros, mas de todas as pessoas que acreditam e investem a sua vida nesse setor", disse.

Bioeletricidade e biogás

Outro tema tratado na série de webinars da Fenasucro & Agrocana Trends foi "Bioeletricidade e biogás a postos para a retomada do investimento".

Para Gussi, que também participou do encontro, a bioeletricidade é cada vez mais relevante dentro do setor sucroenergético, sendo uma fonte importante de renda para as usinas que praticam a cogeração. "Ao crescer, o Brasil precisará de muita energia de qualidade, de baixa pegada de carbono, com alto nível de sustentabilidade. É essa energia que o setor sucroenergético oferta ao país, descentralizada, com aproveitamento de resíduos, ou seja, o estado da arte quando pensamos em desenvolvimento sustentável", destacou.

Segundo Zilmar Souza, gerente de Bioeletricidade da Unica, de janeiro a junho de 2020 a biomassa de cana gerou para a rede 8,4 TW/h, o que representa atender 21,5% do consumo residencial no Estado de São Paulo em 2019, isso aproveitando somente 15% de seu potencial.

O biogás também tem um papel importante, podendo substituir o uso do diesel nas máquinas. Em reuniões na Bosch, há conversas sobre o primeiro ônibus elétrico rodando a etanol. Paralelo a isso, existe a tendência de trocar todos os ônibus rodados com diesel nas cidades brasileiras por ônibus elétricos a etanol. Outra aplicação para o biogás é utilizá-lo tanto para transformação como troca de combustíveis.

Um exemplo é a Cocal, que irá economizar R$ 100 milhões em longo prazo, trocando o diesel por biogás produzido na própria usina. Tudo isso implica em ganho, menor emissão, melhor aproveitamento energético e melhor pontuação no RenovaBio.

A coordenadora de negócios em geração distribuída de energia na Raízen e também vice-presidente do Conselho de Administração da Abisolar (Associação Brasileira de Energia Solar e Fotovoltaica), Bárbara Rubin, comentou que a Raízen acredita no potencial da bioenergia, não só do biogás e da biomassa, mas da bioenergia em geral para conduzir o desenvolvimento e a diversificação da matriz energética brasileira.

A Raízen tem desenvolvido alguns projetos que apontam para isso. Enquanto empresa, está focada no potencial do biogás e inclusive iniciou recentemente as operações comerciais de sua planta de biogás. "Nossa planta é a primeira a ganhar um leilão do governo e terá capacidade de produção de 138 mil MW/h por ano a partir da conversão da torta de filtro e da vinhaça em biogás, subprodutos da cana-de-açúcar, mostrando de fato que quando falamos de bioeletricidade trata-se não só de uma energia que é renovável por sua característica, mas uma energia onde temos todo o mapeamento de seus impactos e externalidades positivas, que está mais alinhada com os princípios da economia circular. Conseguimos aproveitar esse produto que se origina da cana em todos os seus componentes, desde a produção de alimentos, energia e bioprodutos, com uma indústria que tem um valor mais agregado", enfatizou.

Uma cadeia desenvolvida para o biogás já é realidade, segundo Alessandro Gardemann, presidente-executivo da Abiogás (Associação Brasileira do Biogás).  "Já são mais de R$ 400 milhões investidos no biogás só na cadeia sucroenergética. Há três projetos operando ou em fase de operação (um no Paraná, o da Raízen e o da Cocal), projetos de energia elétrica, energia elétrica e gás, e energia elétrica no mercado livre. Também há uma flexibilidade muito grande, podendo operar em vários ramos do mercado como substituição de diesel, injeção no gasoduto, venda em posto, geração de energia elétrica, geração de energia elétrica para leilão e geração de energia elétrica no mercado livre. Isso é factível para o biogás e essa opcionalidade é algo extremamente importante, podendo até mesmo pensar em uma planta híbrida solar e a biogás", exemplificou o executivo.

Impacto da tecnologia para o setor sucroenergético

O terceiro e último assunto abordado pela Fenasucro & Agrocana Trends foi o impacto da tecnologia para o mercado sucroenergético.

Para Sarita Junqueira Rodas, presidente do Conselho do Grupo Junqueira Rodas, a tecnologia voltada para a produtividade é de fácil acesso e vem sendo adotada há muito tempo. "Não é à toa que o Brasil tem saltos de produtividade sem aumentar a área plantada. Talvez os produtores tenham um pouco de resistência de gestão, organização e nível empresarial do agro. No mais, somos totalmente tecnificados e chegamos ao nível de produção e produtividade que o país desponta hoje graças aos estudos das universidades, das empresas de iniciativa privada que desenvolveram maquinários e vários itens para que pudéssemos usar no campo e levar o Brasil ao topo. O campo é muito tecnológico, principalmente em produtividade", salienta.

O professor Marcos Fava Neves mencionou que a tecnologia no setor está em quatro áreas: gestão do canavial por metro quadrado, inovação de plantas, economia circular através de modelos integrados e economia de compartilhamento. "Estas quatro áreas têm uma avenida de desenvolvimento muito grande para que o açúcar e o etanol ganhem mais competitividade pela via da inovação".

"Hoje temos um alto Custo Brasil, mas tudo o que vemos no campo, na produção de etanol, cogeração de energia e transporte, mostra que a indústria de base está ali, trabalhando dia e noite, entregando tecnologia para mostrar ao mundo que somos referência no setor sucroenergético e de bioenergia. A Cerradinho é um exemplo nacional que tem que sair para o mundo. Tem muita tecnologia nacional empregada ali", lembra Luís Carlos Jorge Júnior, presidente do Ceise Br.

De acordo com Luciano Rodrigues, gerente de Economia e Análise Setorial da Unica, há várias questões que ainda precisam ser resolvidas, desde a área agrícola, passando por inovações na área industrial e também na de gestão. "Quando vamos para a ponta, a área de inteligência de mercado tem um espaço para ser trabalhado, especialmente agora diante da dinâmica de preço de combustível que varia com o mercado internacional e com o consumidor flex, escolhendo entre o etanol e a gasolina", esclarece.

Ele ainda aponta a evolução a ser despontada em agricultura digital na cana para reduzir emissões, transportar de forma mais eficiente, aumentar a eficiência na gestão, melhorar o atendimento de mercado, fazer simulações de safra e preço e identificar melhores estratégias de produção e comercialização. "Essa é uma indústria bem completa e temos muitos desafios pela frente", finalizou.