A melhor hora de arrancar (reforma) e a maneira correta de cortar a soqueira, a ligação da praga com as culturas de rotação (inclusive com o milho na reforma estendida), o papel da vinhaça como indutor do inseto e/ou condutor de defensivos e o manejo integrado utilizando ferramentas biológicas.
Essas questões fazem parte de um universo de dúvidas a respeito do Sphenophorus levis, uma praga cuja pressão está em crescimento acelerado por quase todas as regiões canavieiras do Centro-Sul e com certeza hoje já pode ser considerada a com menos certezas sobre os manejos de controle.
Para tentar elucidar um pouco mais a cabeça do produtor, a Revista Canavieiros foi conversar com uma das maiores referências no assunto, a pesquisadora do IAC, Leila Dinardo. A boa notícia é que ela quebra bastante mitos, porém para entrar na briga, se prepare que decisões difíceis terão que ser tomadas. Confira!
Revista Canavieiros: O grande aumento da infestação de Sphenophorus significa que o setor canavieiro está perdendo a guerra para a praga?
Prof. Leila Dinardo: Eu quero ressaltar que o aumento não se dá em todas as áreas, mas em geral, está sim crescendo. Isso mostra que o controle não tem sido feito de forma adequada, até por seu alto grau de dificuldade. Sphenophorus é uma praga de controle complexo, é preciso adotar uma série de medidas na mesma área para reduzir seu crescimento populacional e, consequentemente, seus danos. Esse aumento mostra que os produtores não vêm tendo sucesso em seu manejo, e isso, de maneira geral, acontece porque eles não adotam as ferramentas disponíveis nos momentos corretos.
Revista Canavieiros: Por que o seu controle é tão complicado?
Dinardo: O controle de Sphenophorus é complicado porque a praga passa boa parte da vida protegida no rizoma, ou seja, nas partes subterrâneas da planta, e com isso é difícil para os produtos químicos e biológicos atingirem o alvo. Pensando nas particularidades de uma lavoura canavieira, principalmente na necessidade em se conseguir longevidade de soqueira, os manejos mais eficientes, tanto relacionados aos defensivos como os de combate físico devem ser no momento do plantio, ou seja, o produtor precisa conhecer o nível de infestação da área para se preparar e adotar uma série de medidas com o objetivo de iniciar um novo ciclo em condições de baixa infestação.
Revista Canavieiros: Ensaios na Usina Alta Mogiana mostraram que a população foi maior em áreas onde foi cultivada soja em rotação no comparativo com áreas que ficaram em pousio. Quais motivos você acredita que levaram a esse resultado?
Dinardo: Tanto os ensaios da Usina Alta Mogiana como outros que eu conduzi na Usina da Pedra mostraram que quando você faz o plantio de soja, amendoim ou crotalária em rotação com a cana, a sobrevivência do adulto nessa área é maior do que nos locais mantidos no limpo. O que é preciso deixar bastante claro é que os adultos de Sphenophorus não se alimentam em nenhuma dessas culturas, elas servem de abrigo para eles. Isso porque o solo, ao ter mais umidade e temperatura mais amena, em decorrência do sombreamento provocado por essas plantas, torna o ambiente mais favoráveis para a sobrevivência de adultos do que se ele estiver em condições mais rígidas de um solo nu, sem planta nenhuma.
Revista Canavieiros: Isso pode ser considerado uma regra? Não há nenhum manejo que possa ser feito (no arranquio da soqueira ou até mesmo com a soja instalada) para modificar esse efeito?
Dinardo: O indicado é fazer uma boa destruição mecânica de soqueira na época seca do ano para que grande parte da população seja destruída, se não pelos danos mecânicos, através da ação de inimigos naturais. Dessa forma, a entrada de uma cultura de rotação é mais segura. Quanto a ação dos inseticidas para controle das pragas na soja, há dados de trabalhos em casa de vegetação conduzidos por nós no IAC que mostram pouca eficiência para redução da população de Sphenophorus. Quando você aplica o produto diretamente sobre os adultos, muitos até matam, mas acontece que no campo, esses insetos não ficam na parte superior da folha onde receberiam o produto, eles ficam protegidos no solo, escondidos debaixo de folhas e palhada, e por isso, essas ferramentas têm pouco efeito sobre os adultos.
Revista Canavieiros: Vejo um número cada vez maior de produtores optarem pela rotação prolongada (uma soja ou amendoim, uma safrinha e outra soja antes do plantio da cana) com o objetivo primário de controle do Sphenophorus. Qual sua opinião a respeito desse manejo?
Dinardo: Isso é uma boa alternativa, como nem a soja e nem o amendoim são hospedeiros, os adultos vão morrendo com o tempo, consequentemente a população vai baixando, pois não conseguem se multiplicar por não ter como se alimentar. É preciso lembrar que o adulto de Sphenophorus é um inseto muito longevo, pode viver entre 270 e 300 dias, mas à medida que o tempo passa, ele vai morrendo. Se não encontrar hospedeiro, que é o caso da cana e do milho, a população tende a diminuir bastante com esse período de um ou dois anos.
Revista Canavieiros: O milho é um hospedeiro da praga?
Dinardo: Sim, o milho é um hospedeiro de Sphenophorus, ou seja, ele faz postura, as larvinhas se alimentam, fazem galerias, crescem, se transformam em pupas, adultos e o ciclo continua.
Revista Canavieiros: Pensando na vinhaça, sabe-se que ela atrai o inseto, por outro lado está cada vez mais sendo utilizada como meio para a aplicação de inseticida. Esse manejo é eficiente?
Dinardo: Em relação à vinhaça, há trabalhos e estudos já bastante antigos que mostram que ela favorece Sphenophorus, inclusive nós do IAC realizamos novos estudos recentemente e chegamos à mesma conclusão. Têm muitas usinas utilizando inseticida na vinhaça para fazer controle da praga, os dados que nós temos até o momento mostram que, principalmente em anos muito secos, a eficiência do manejo é menor se comparada a aplicação via corte de soqueira. Uma sugestão que eu faço é que em canaviais mais nobres (socas de primeiro e segundo corte), se utilize o cortador de soqueira para fazer o controle, agora em ciclos mais velhos, com menos produtividade, utilize o inseticida na vinhaça.
Revista Canavieiros: Como deve ser conduzido o canavial de bacias de vinhaça?
Dinardo: Hoje não deveria mais ter a tradicional bacia de vinhaça, porque as usinas são obrigadas a conduzir o PAV (Plano de Aplicação de Vinhaça), o qual contempla que esse produto precisa ser distribuído numa área bastante grande, o que extingue as áreas que recebem um volume muito alto. Se isso acontecer, uma área receber uma quantidade muito grande de vinhaça, ela terá muitos problemas para controlar o Sphenophorus, então a distribuição da vinhaça precisa ser bem espalhada pela maior área possível, diminuindo a quantidade.
Revista Canavieiros: Sobre o manejo integrado com o uso de biológicos, como ele deve ser desenhado?
Dinardo: O manejo integrado nos parece bastante interessante, temos bastante estudos conduzidos nessa linha, mas ainda não sabemos qual é a melhor proposta, parece um pouco mais óbvio usar um inseticida químico no corte de soqueira na época seca do ano e, por volta de dezembro, janeiro ou fevereiro, época chuvosa, fazer uma aplicação de biológico em jato dirigido para a base da planta. Temos outros trabalhos, como por exemplo o da Bovéria aplicada no cortador de soqueira na época seca e que também apresentou resultados bastante positivos. O objetivo relacionado aos biológicos é entender como, quanto e qual a melhor forma de usá-los pensando na utilização do seu maior potencial de contribuição.Nesse sentido, nossos estudos apontam para uma tendência de que o uso repetitivo, por vários anos, propiciando a colonização da área, pode ser uma das melhores maneiras de se utilizar a ferramenta.
Revista Canavieiros: O Instituto Biológico anunciou que está em fase final de desenvolvimento de uma espécie de nematoide que combaterá o Sphenophorus. O que você sabe sobre essa tecnologia?
Dinardo: Sobre os nematoides entomopatogênicos para controle de Sphenophorus, o Instituto Biológico está trabalhando forte na questão da multiplicação, pois esse é o ponto crucial, isso pelo fato de que também é preciso aumentar a população, na mesma proporção, de bactérias que convivem com eles, pois são elas responsáveis em causar uma septicemia no inseto, e com isso causar a sua morte. Em campo eu conduzi alguns trabalhos, outros estão em andamento. Neles utilizamos nematoides de diversas empresas, e o resultado tem sido promissor. Assim, eu acredito que no futuro há potencial para se transformar numa ferramenta importante no manejo da praga.
Revista Canavieiros: Quais os pontos da aplicação de inseticida via corte de soqueira que precisam evoluir para torná-la menos trabalhosa e danosa para a touceira?
Dinardo: O corte de soqueira é uma operação bastante cara e complexa. Ela demanda um trator bem potente e pode causar danos em algumas variedades, dependendo das condições de seca. Eu não vejo muita melhora nesse processo, o que pregamos é que os discos de corte devem trabalhar bem em cima da soca para o produto ser depositado mais no meio, o volume de calda não me parece ser algo muito relevante, temos que trabalhar com o volume normal (150 a 200 litros por hectare). Também é importante ter bicos novos e bem calibrados para distribuir da melhor maneira possível o inseticida.