Contribuindo para a mitigação de gases de efeito estufa

12/01/2022 Noticias POR: FERNANDA CLARIANO


Arminda Moreira de Carvalho - Pesquisadora Embrapa Cerrados

O óxido nitroso (N2O) possui um potencial de aquecimento global de 265 a 298 vezes maior do que o da molécula de dióxido de carbono e o setor agropecuário é responsável por 87% das suas emissões. Nesse contexto, a Embrapa Cerrados vem estudando formas de mitigar a emissão de N2O no cultivo da cana-de-açúcar. Para isso, os pesquisadores têm avaliado os efeitos das aplicações de vinhaça, nitrogênio como também da irrigação na cultura. A reportagem da Revista Canavieiros falou com uma das responsáveis pelos estudos, a pesquisadora da Embrapa Cerrados, Arminda Moreira de Carvalho, para saber um pouco mais sobre esses estudos. Confira!


Revista Canavieiros: Quais os principais responsáveis pela emissão de óxido nitroso na cultura de cana-de-açúcar?
Arminda Moreira de Carvalho: O principal responsável por essas emissões é o aporte de nitrogênio (N) no solo, tanto na forma de fertilizantes nitrogenados sintéticos como orgânicos – no caso do nosso estudo, a vinhaça. Cerca de 1% do N aplicado é convertido em óxido nitroso (N2O) e o fator de emissão médio dessa pesquisa com cana-de-açúcar foi 1,34, próximo ao valor default do IPCC, que é 1%. Essa emissão de N2O pode variar em função do solo e do seu manejo, mas aumenta proporcionalmente com a dose de nitrogênio aplicada. Em nosso estudo, a aplicação combinada de N do fertilizante sintético e vinhaça aumentou em até três vezes as emissões de N2O em relação à aplicação apenas da vinhaça ou do adubo nitrogenado separadamente.
Revista Canavieiros: Há parcerias para esses estudos e quem são? Por favor, poderia reforçar a importância da pesquisa cientifica aqui no Brasil?
Arminda: Esse tipo de trabalho só é possível de ser realizado com parcerias interinstitucionais e multidisciplinares. Parcerias público-privadas, envolvendo as usinas, são também fundamentais. No caso de nossa pesquisa com emissão de N2O em cana-de-açúcar, tivemos parcerias de instituições nacionais e internacionais, incluindo a Universidade de Brasília, a Universidade de Cambridge e outras Unidades da Embrapa, como a Embrapa Meio Ambiente, sob a liderança da pesquisadora Magda Lima.
Revista Canavieiros: Quais foram as estratégias que encontraram para mitigar a emissão de óxido nitroso no cultivo da cana-de-açúcar?
Arminda: A vinhaça, pelo seu teor de N relativamente baixo (0,3 a 0,8 kg de N/m3), em geral não é capaz de suprir todo o N que a cultura da cana necessita. Aplicar a vinhaça e o fertilizante nitrogenado em intervalos espaçados de pelo menos uma vez mês é uma estratégia eficaz para mitigação das emissões de N2O. Sugere-se aplicar a vinhaça antes, para dar tempo dos ácidos orgânicos e outras moléculas serem consumidos pelos microrganismos do solo. E depois, algumas semanas ou uma vez por mês, aplicar o fertilizante nitrogenado.
Revista Canavieiros: Aos produtores, essa seria uma recomendação possível para reduzir as emissões? Foram averiguadas outras estratégias que poderiam auxiliar neste cenário?
Arminda: Para aplicar a vinhaça e o N separadamente, os produtores necessitam acrescentar uma operação mecanizada para a aplicação do N, que passaria a ser predominantemente na forma de nitrato de amônio, já que, na aplicação conjunta, a vinhaça na linha da cana incorpora a ureia ao solo, reduzindo muito as perdas por volatilização, o que não ocorre na aplicação isolada do N. Nesse caso, deve-se computar a pegada de carbono de uma operação mecanizada a mais para aplicar N versus o aumento da emissão de N2O com a aplicação conjunta em termos de CO2-equivalente, para verificar se realmente compensa no balanço final de C. Não foram averiguadas outras estratégias que poderiam auxiliar neste cenário.
Revista Canavieiros: Existem alternativas de fertilizantes com solubilidade mais baixa pra reduzir as transformações de nitrogênio que se aplica ao óxido nitroso (N2O)?
Arminda: Existem fertilizantes nitrogenados com inibidores de nitrificação que bloqueiam a enzima monooxygenase de amônia durante o processo de nitrificação, reduzindo significativamente as emissões de N2O. Estudos também têm mostrado que perdas por volatilização de amônia e emissão de N2O são maiores com aplicação de ureia em relação ao nitrato de amônio, nitrocálcio e nitrato de cálcio.
Revista Canavieiros: Há muitos anos que na agricultura brasileira se fala sobre sistemas integrados, recuperação de pastagens degradadas, plantio direto, fixação biológica, entre outras, que são tecnologias que reduzem a emissão, mitigam ou aprisionam o carbono no solo. Poderia comentar?
Arminda: Os sistemas integrados como ILPF e ILP, além dos sistemas agroflorestais, que possuem alto potencial de mitigação de gases de efeito estufa (GEE), juntamente com as tecnologias de recuperação de pastagem, plantio direto e fixação biológica de N, são denominados de ações de mitigação apropriadas nacionalmente (NAMAs/NDCs) e fazem parte de políticas públicas para atender compromissos de redução de emissão de GEE e conter o aumento de temperatura diante dos acordos internacionais sobre mudanças climáticas, como Agricultura de Baixo Carbono – no caso, Plano ABC e Plano ABC+.
Revista Canavieiros: Quais as perspectivas para pesquisas futuras sobre o tema?
Arminda: Pesquisas sobre como minimizar as emissões de N2O na aplicação da vinhaça enriquecida com ureia ou outros fertilizantes nitrogenados seriam muito oportunas (fontes de N - nítrica vs. amoniacais; inibidores de nitrificação na vinhaça). Tem aumentando o interesse pela biodigestão da vinhaça para uso do metano na cogeração de energia elétrica na usina ou para substituir o diesel em tratores movidos a gás. Isso poderia impactar (reduziria) nas emissões de N2O na aplicação conjunta de vinhaça (biodigerida) e N.