Três dos maiores bancos dos EUA revelaram os danos causados pela queda do preço do petróleo nesta semana. Houve forte alta nos empréstimos problemáticos ao setor de energia e temores de contágio em outras carteiras.
O Citigroup, quarto maior banco norte-americano pelo critério de ativos totais, teve alta recorde, de 32%, no índice de inadimplência em empréstimos a empresas, principalmente em sua carteira de energia na América do Norte, no quarto trimestre, ante o período em 2014.
O Wells Fargo, o terceiro maior banco norte-americano pelo critério de ativos, reservou US$ 831 milhões a mais em provisões para maus empréstimos no período, além da alta de US$ 731 milhões no terceiro trimestre, principalmente por causa do setor de petróleo e gás.
Um dia antes, o JPMorgan Chase, o maior banco dos EUA, anunciou estar "observando de perto" a situação.
Se o petróleo se mantiver em seu nível atual de preço, cerca de US$ 30 por barril, o banco anunciou que seria forçado a elevar em US$ 750 milhões suas reservas contra inadimplência neste ano -o que consumiria cerca de um terço dos ganhos com a receita líquida de juros.
Além de cortes em investimentos e falência de empresas menores, a queda livre do preço do petróleo lançou os bancos em uma corrida para ver quem faz previsões mais pessimistas.
Esta semana, o Morgan Stanley se uniu ao Goldman Sachs ao prever preço de US$ 20 por barril para o petróleo, e o Standard Chartered foi além, afirmando que o preço pode cair a apenas US$ 10 antes que os administradores de investimentos "admitam que as coisas foram longe demais".
Mudança
Até agora, os grandes bancos em geral vinham oferecendo pronunciamentos reconfortantes sobre suas carteiras no setor de energia, e muitos enfatizavam que suas carteiras de empréstimo têm classificação de investimento, bem como a senioridade de suas posições dentro das estruturas de capital dos devedores.
Mas o tom das discussões esta semana, que marca o início da temporada de anúncio de resultados pelos bancos, foi notavelmente diferente.
Jamie Dimon, presidente-executivo e do conselho do JPMorgan Chase, contrariou a tendência respondendo a uma barragem de perguntas de analistas sobre o setor de energia com a afirmação de que "o pessoal do petróleo" mostrou "resistência surpreendente".
"Lembrem-se", ele disse, "de que esses empréstimos são lastreados por ativos. A concordata de uma empresa não significa um mau empréstimo".
John Stumpf, presidente-executivo do Wells Fargo, instou os investidores na sexta-feira a que considerassem a exposição do banco ao setor de energia "em perspectiva". "Deveríamos dar um passo para trás e contemplar a carteira como um todo", ele disse a analistas, fazendo questão de contrastá-la com a dimensão da exposição do banco aos imóveis comerciais, segmento no qual "uma pequena melhora... já é ótima para esta companhia".
Os executivos do Wells Fargo dizem que estão se preparando para preços persistentemente baixos para o petróleo. "Estamos aumentando a sensibilidade de nossa carteira tendo por base a continuação dos preços muito, muito, muito baixos para o petróleo", disse John Shrewsberry, diretor de finanças do banco.
A posição dos bancos é incômoda. As instituições de empréstimo querem que as empresas mantenham os juros e principal em dia - e que façam o necessário para manter as linhas de crédito abertas e os poços em funcionamento. Se forem estabelecidos limites de crédito de acordo com as reservas existentes, como acontece normalmente, os bancos começam a enfrentar problemas quando há um colapso no preço da energia.
"É uma daquelas situações onde cara você perde, coroa perde também", disse Harry Tchilinguirian, diretor mundial de estratégia para os mercados de commodities no BNP Paribas, em Londres. "Se você limita o financiamento ao setor [de exploração e produção] dos Estados Unidos, que está vivendo além de seu fluxo de caixa, corre o risco de que a produção caia e as empresas não sejam capazes de cumprir suas obrigações financeiras".
Cautela
Muitos bancos adotaram postura mais cautelosa em outubro, durante a mais recente rodada de reavaliações semestrais de suas carteiras. De acordo com uma pesquisa executada no final do ano passado pelo escritório de advocacia Haynes and Boone, de Houston, as linhas de crédito das empresas estavam a caminho de um corte médio de 39%. E é provável que encolham ainda mais em abril.
"As companhias têm a tendência de recorrer às suas linhas de crédito bancário quando as demais opções se esgotam", disse Devi Aurora, diretor sênior da Standard & Poor´s em Nova York. Quando elas se aproximarem de seu limite de crédito, "cremos que começarão a aparecer prejuízos para os bancos".
Os analistas apontaram que quanto mais tempo o preço do petróleo ficar baixo, menos opções as companhias de exploração e produção terão. Por boa parte do ano passado, elas conseguiram negociar alongamentos de prazo e reformas nos termos de seus empréstimos, sob a suposição de que os preços se recuperariam. Ou podiam vender ativos de importância secundária, buscar capital nos mercados públicos e privados ou recorrer a contratos de hedge para garantir vendas acima dos valores de mercado.
Mas cada uma dessas rotas de fuga parece estar se fechando, agora. Muitos produtores com problemas de caixa já venderam todos os ativos que podiam, e os mercados de títulos e ações - ambos abalados pela China - estão oferecendo muito menos sustentação. Os contratos de hedge também estão secando, e sua renovação se torna cada vez mais dispendiosa, disse Kristen Campana, sócia do Bracewell & Giuliani, escritório de advocacia sediado em Houston.
E a despeito de muita conversa sobre a busca de barganhas pelos investidores financeiros, poucos deles vêm concretizando negócios. Em outubro, o grupo de capital privado Apollo Global Management e o fundo de hedge Highbridge Capital Management investiram na Miller Energy Resources, uma empresa de perfuração sediada no Texas - mas só depois que ela pediu concordata.
"Há muitos investidores fuçando", disse Campana. "Mas a questão é, será que os preços cairão ainda mais? Talvez se eles esperarem mais um pouco consigam preço ainda melhor".
Para os bancos, o estrago não deve ficar restrito às carteiras de energia. No passado, desacelerações no setor de energia prejudicaram economias regionais. Marianne Lake, vice-presidente de finanças do JPMorgan Chase, disse que o banco estava atento aos "efeitos colaterais" na indústria e transporte, mas por enquanto não estava observando quaisquer efeitos mais amplos sobre suas carteiras.
Mas analistas antecipam que os efeitos dos cortes de pessoal comecem a se fazer sentir muito em breve. Em uma conversa sobre resultados no mês passado, o Royal Bank of Canada afirmou ter detectado "alguns sinais iniciais de desgaste" em suas operações de varejo bancário em cidades da província de Alberta, onde o setor de energia é forte e o desemprego subiu em quase 50% no ano passado, atingindo 7% da força de trabalho.
"É um fenômeno semelhante ao que acontece nos Estados Unidos", disse Brennan Hawken, analista de bancos no UBS. "É bom negócio ser emissor de cartões de crédito na região de Dakota, hoje?"
Bancos regionais
Até agora, os principais problemas se fizeram sentir em bancos regionais com exposição desproporcional à energia. O BOK Financial, de Tulsa, Oklahoma, por exemplo, para o qual empréstimos ao setor de energia respondem por 20% da carteira total, anunciou esta semana que antecipava que sua provisão para inadimplência no quarto trimestre subisse a US$ 23 milhões, cerca de quatro vezes mais do que a instituição previa anteriormente.
Alguns analistas ainda desdenham a ideia de que o colapso do setor de energia possa realmente prejudicar os grandes bancos, apontando que a exposição direta deles ao setor de energia é de entre 2% e 4% - ante cerca de 33% para os imóveis residenciais. Eles apontam que a queda do petróleo também tem efeitos positivos, já que a redução no preço da gasolina deixa mais dinheiro à disposição dos consumidores.
"As pessoas odeiam bancos e querem que eles sofram", disse Dick Bove, analista da Rafferty Capital Markets. "Mas [a pressão do setor de energia] não terá o impacto que as pessoas esperam. Não estamos em 2008".
No entanto, Fred Cannon, diretor mundial de pesquisa na corretora Keefe, Bruyette & Woods, disse que os grandes bancos precisam se preparar. "Se o efeito se espalhar pela economia mais ampla e começarmos a ver algo parecido com o Texas dos anos 80, a história pode ser diferente", ele disse.
Três dos maiores bancos dos EUA revelaram os danos causados pela queda do preço do petróleo nesta semana. Houve forte alta nos empréstimos problemáticos ao setor de energia e temores de contágio em outras carteiras.
O Citigroup, quarto maior banco norte-americano pelo critério de ativos totais, teve alta recorde, de 32%, no índice de inadimplência em empréstimos a empresas, principalmente em sua carteira de energia na América do Norte, no quarto trimestre, ante o período em 2014.
O Wells Fargo, o terceiro maior banco norte-americano pelo critério de ativos, reservou US$ 831 milhões a mais em provisões para maus empréstimos no período, além da alta de US$ 731 milhões no terceiro trimestre, principalmente por causa do setor de petróleo e gás.
Um dia antes, o JPMorgan Chase, o maior banco dos EUA, anunciou estar "observando de perto" a situação.
Se o petróleo se mantiver em seu nível atual de preço, cerca de US$ 30 por barril, o banco anunciou que seria forçado a elevar em US$ 750 milhões suas reservas contra inadimplência neste ano -o que consumiria cerca de um terço dos ganhos com a receita líquida de juros.
Além de cortes em investimentos e falência de empresas menores, a queda livre do preço do petróleo lançou os bancos em uma corrida para ver quem faz previsões mais pessimistas.
Esta semana, o Morgan Stanley se uniu ao Goldman Sachs ao prever preço de US$ 20 por barril para o petróleo, e o Standard Chartered foi além, afirmando que o preço pode cair a apenas US$ 10 antes que os administradores de investimentos "admitam que as coisas foram longe demais".
Mudança
Até agora, os grandes bancos em geral vinham oferecendo pronunciamentos reconfortantes sobre suas carteiras no setor de energia, e muitos enfatizavam que suas carteiras de empréstimo têm classificação de investimento, bem como a senioridade de suas posições dentro das estruturas de capital dos devedores.
Mas o tom das discussões esta semana, que marca o início da temporada de anúncio de resultados pelos bancos, foi notavelmente diferente.
Jamie Dimon, presidente-executivo e do conselho do JPMorgan Chase, contrariou a tendência respondendo a uma barragem de perguntas de analistas sobre o setor de energia com a afirmação de que "o pessoal do petróleo" mostrou "resistência surpreendente".
"Lembrem-se", ele disse, "de que esses empréstimos são lastreados por ativos. A concordata de uma empresa não significa um mau empréstimo".
John Stumpf, presidente-executivo do Wells Fargo, instou os investidores na sexta-feira a que considerassem a exposição do banco ao setor de energia "em perspectiva". "Deveríamos dar um passo para trás e contemplar a carteira como um todo", ele disse a analistas, fazendo questão de contrastá-la com a dimensão da exposição do banco aos imóveis comerciais, segmento no qual "uma pequena melhora... já é ótima para esta companhia".
Os executivos do Wells Fargo dizem que estão se preparando para preços persistentemente baixos para o petróleo. "Estamos aumentando a sensibilidade de nossa carteira tendo por base a continuação dos preços muito, muito, muito baixos para o petróleo", disse John Shrewsberry, diretor de finanças do banco.
A posição dos bancos é incômoda. As instituições de empréstimo querem que as empresas mantenham os juros e principal em dia - e que façam o necessário para manter as linhas de crédito abertas e os poços em funcionamento. Se forem estabelecidos limites de crédito de acordo com as reservas existentes, como acontece normalmente, os bancos começam a enfrentar problemas quando há um colapso no preço da energia.
"É uma daquelas situações onde cara você perde, coroa perde também", disse Harry Tchilinguirian, diretor mundial de estratégia para os mercados de commodities no BNP Paribas, em Londres. "Se você limita o financiamento ao setor [de exploração e produção] dos Estados Unidos, que está vivendo além de seu fluxo de caixa, corre o risco de que a produção caia e as empresas não sejam capazes de cumprir suas obrigações financeiras".
Cautela
Muitos bancos adotaram postura mais cautelosa em outubro, durante a mais recente rodada de reavaliações semestrais de suas carteiras. De acordo com uma pesquisa executada no final do ano passado pelo escritório de advocacia Haynes and Boone, de Houston, as linhas de crédito das empresas estavam a caminho de um corte médio de 39%. E é provável que encolham ainda mais em abril.
"As companhias têm a tendência de recorrer às suas linhas de crédito bancário quando as demais opções se esgotam", disse Devi Aurora, diretor sênior da Standard & Poor´s em Nova York. Quando elas se aproximarem de seu limite de crédito, "cremos que começarão a aparecer prejuízos para os bancos".
Os analistas apontaram que quanto mais tempo o preço do petróleo ficar baixo, menos opções as companhias de exploração e produção terão. Por boa parte do ano passado, elas conseguiram negociar alongamentos de prazo e reformas nos termos de seus empréstimos, sob a suposição de que os preços se recuperariam. Ou podiam vender ativos de importância secundária, buscar capital nos mercados públicos e privados ou recorrer a contratos de hedge para garantir vendas acima dos valores de mercado.
Mas cada uma dessas rotas de fuga parece estar se fechando, agora. Muitos produtores com problemas de caixa já venderam todos os ativos que podiam, e os mercados de títulos e ações - ambos abalados pela China - estão oferecendo muito menos sustentação. Os contratos de hedge também estão secando, e sua renovação se torna cada vez mais dispendiosa, disse Kristen Campana, sócia do Bracewell & Giuliani, escritório de advocacia sediado em Houston.
E a despeito de muita conversa sobre a busca de barganhas pelos investidores financeiros, poucos deles vêm concretizando negócios. Em outubro, o grupo de capital privado Apollo Global Management e o fundo de hedge Highbridge Capital Management investiram na Miller Energy Resources, uma empresa de perfuração sediada no Texas - mas só depois que ela pediu concordata.
"Há muitos investidores fuçando", disse Campana. "Mas a questão é, será que os preços cairão ainda mais? Talvez se eles esperarem mais um pouco consigam preço ainda melhor".
Para os bancos, o estrago não deve ficar restrito às carteiras de energia. No passado, desacelerações no setor de energia prejudicaram economias regionais. Marianne Lake, vice-presidente de finanças do JPMorgan Chase, disse que o banco estava atento aos "efeitos colaterais" na indústria e transporte, mas por enquanto não estava observando quaisquer efeitos mais amplos sobre suas carteiras.
Mas analistas antecipam que os efeitos dos cortes de pessoal comecem a se fazer sentir muito em breve. Em uma conversa sobre resultados no mês passado, o Royal Bank of Canada afirmou ter detectado "alguns sinais iniciais de desgaste" em suas operações de varejo bancário em cidades da província de Alberta, onde o setor de energia é forte e o desemprego subiu em quase 50% no ano passado, atingindo 7% da força de trabalho.
"É um fenômeno semelhante ao que acontece nos Estados Unidos", disse Brennan Hawken, analista de bancos no UBS. "É bom negócio ser emissor de cartões de crédito na região de Dakota, hoje?"
Bancos regionais
Até agora, os principais problemas se fizeram sentir em bancos regionais com exposição desproporcional à energia. O BOK Financial, de Tulsa, Oklahoma, por exemplo, para o qual empréstimos ao setor de energia respondem por 20% da carteira total, anunciou esta semana que antecipava que sua provisão para inadimplência no quarto trimestre subisse a US$ 23 milhões, cerca de quatro vezes mais do que a instituição previa anteriormente.
Alguns analistas ainda desdenham a ideia de que o colapso do setor de energia possa realmente prejudicar os grandes bancos, apontando que a exposição direta deles ao setor de energia é de entre 2% e 4% - ante cerca de 33% para os imóveis residenciais. Eles apontam que a queda do petróleo também tem efeitos positivos, já que a redução no preço da gasolina deixa mais dinheiro à disposição dos consumidores.
"As pessoas odeiam bancos e querem que eles sofram", disse Dick Bove, analista da Rafferty Capital Markets. "Mas [a pressão do setor de energia] não terá o impacto que as pessoas esperam. Não estamos em 2008".
No entanto, Fred Cannon, diretor mundial de pesquisa na corretora Keefe, Bruyette & Woods, disse que os grandes bancos precisam se preparar. "Se o efeito se espalhar pela economia mais ampla e começarmos a ver algo parecido com o Texas dos anos 80, a história pode ser diferente", ele disse.