Cana responde com vigor às condições de chuva e sol
Ao revisar a coluna “Informações Climáticas”, assinada pelo engenheiro-agrônomo Oswaldo Alonso na Revista Canavieiros, das edições de dezembro-18 e janeiro-19, são desnudados números desesperadores para todo profissional ligado ao mundo agrícola.
No último mês do ano de 2018, a média de chuvas ficou em 149 mm contra 237 mm da média histórica. Para se ter ideia, quatro estações (Unesp-Jaboticabal, Santa Elisa, Uname-Sertãozinho e Usina São Francisco) não conseguiram atingir os três dígitos de água ao longo do período.
Em janeiro a coisa piorou. A média do mês ficou em 106 mm, não atingindo nem a metade das normais climáticas, que na época foi de 276 mm. As notícias ruins vinham de todos os cantos da região. Em Dumont choveu 70 mm; em Barretos, 65 mm; em Ituverava, 69 mm; em Cajobi, 67 mm e, em Batatais, 64 mm.
Menos pior foi fevereiro, quando as águas deram as caras, chovendo 100 mm a mais que a média histórica. Mas o estrago já havia sido feito porque os dois primeiros meses do verão são de fundamental importância para o crescimento vegetativo da cana-de-açúcar, e não precisa ser um expert no assunto para saber que o seu desenvolvimento está diretamente ligado ao triângulo formado por radiação solar, temperatura alta e água.
Números que mostram o janeiro desesperado que a região atravessou em 2019
A luz está relacionada à fotossíntese e trabalha no acúmulo de açúcares, além de influenciar no perfilhamento. Os dias quentes são responsáveis pelo crescimento da planta, de seu sistema radicular e também na emissão de folhas novas, enquanto que a água, acrescida de nutrição, define a evolução correta. Pense numa formação de colmos perfeita da cultura - é isso.
No final do inverno de 2019, mais uma vez o frio voltou à barriga de todos. A cada amanhecer da primavera, que se iniciou no dia 22 de setembro, surgia aquele céu de um azul sem nuvens, belíssimo para os expectadores e depressivo para quem está nos bastidores e precisa de, pelo menos, míseras gotas para iniciar o seu espetáculo.
A tortura permaneceu em outubro, com precipitações 35% inferiores em relação à média, entregando aquela famosa “chuva de manga”, que às vezes dá o fruto num sítio e, no outro lado da porteira, não surge nenhuma fruta, elevando o clima de apreensão por toda a roça.
Mas veio a virada do jogo, e como ela veio bonita. Em novembro choveu seis milímetros a mais no comparativo com as normais climáticas, que eram de 186 mm, tendo um ponto de medição que superou os 300 mm (Usina da Pedra-Serrana) e outros tantos acima dos 250 mm (Uname-Sertãozinho, IAC-Descalvado e Centro de Cana-Ribeirão Preto).
Contudo, em nem todos os lugares o solo foi molhado em abundância, sendo que nas estações meteorológicas da Tereos-Severínia, Unesp-Jaboticabal, Inmet-Barretos, Biosev-Sertãozinho, CFM-Pitangueiras, Fafram-Ituverava, Fazenda Santa Rita-Terra Roxa, Fazenda Monte Verde-Cajobi, Usina Batatais-Batatais e Usina São Francisco-Sertãozinho choveu abaixo das normais.
Local onde o plantio de primavera foi perdido em decorrência das chuvas
Em dezembro, as comemorações de final de ano seguiram o roteiro que deveria ser: chuvas intercaladas com dias de sol, e nenhum dos dois vindo de modo exagerado. Cenário que se intensificou após a festa de réveillon, pois São Pedro decidiu ser generoso e choveu quase que uma vez e meia a mais no somatório de todas as estações climáticas em comparativo com o histórico.
Embora não tenhamos os números consolidados até o fechamento desta edição, o mês de fevereiro, principalmente na sua primeira metade, também foi muito bom de chuva, sempre mantendo dias de sol e calor escaldante.
Mediante tal histórico climático, é possível comparar - para quem vive da roça - o verão passado e esse com uma euforia tão intensa que se assemelha a de um torcedor que vê seu time passar perto de uma situação de rebaixamento num campeonato, perdendo de maneira acachapante para os maiores rivais e chegar ao título de maneira invicta na edição seguinte.
Porém, é preciso ir até o último minuto de jogo com extrema atenção, pois os problemas podem acontecer e desbotar aquele quadro que estava sendo pintado com cores vivas e alegres. E um dos principais transtornos é o tombamento da cana.
Existe um ditado que diz: “Se a cana tomba, o produtor levanta”, relacionando ao fato de que um canavial vigoroso e rico somente corre o risco de "deitar" devido ao seu tamanho exagerado. É consenso que uma cana tombada é mais produtiva que a ereta, todavia, há grandes problemas com a colheita mecanizada, já que ao pisotear ou arrancar a soqueira, no mínimo, são gerados atrasos na programação de frente de colheita por necessitar de um processo mais cauteloso.
Outro evento que um verão chuvoso gera é para quem faz o plantio de primavera - muito comum entre os produtores que utilizam a estratégia de cana de ano, ou das unidades industriais que têm muita área própria e precisam ter uma grande janela de reforma, onde dependendo do tipo de solo e relevo, todo o trabalho pode ser em vão devido ao alagamento das linhas e, em casos mais graves, surgir pontos de erosão.
Para encerrar a relação de atenção, é fundamental acompanhar com atenção redobrada a estratégia de maturação, principalmente se ela é realizada por terceiros, podendo contar com o apoio dos times de agrônomos tanto da Copercana como da Canaoeste, isso porque, em especial para as variedades precoces, está intimamente correlacionado com o humor climático de, pelo menos, um período de 120 dias antes do corte.
De uma forma bastante superficial, existe uma definição bastante interessante para as doenças de nosso cérebro, as quais atingem cada vez mais pessoas à medida em que o ritmo fica mais intenso. Nela, um quadro depressivo é definido como excesso de passado, os estressados são vítimas de um presente exagerado, enquanto que a ansiedade atinge aos que não sabem regular suas expectativas quanto ao futuro.
Trazendo esse conceito para a cana-de-açúcar e as condições climáticas, os pesadelos do verão de 18/19 não serão esquecidos - até porque uma técnica que o homem nunca conseguiu desenvolver em seu longo período de evolução é o esquecimento por iniciativa própria - no entanto, os produtores deverão tê-la na medida exata em sua memória para servir como experiência e não fonte de medo e receio.
Uma dose controlada de euforia (um sentimento que pode desencadear em estresse) também é preciso no presente para tomar as decisões mais corretas, no sentido de aproveitar o momento e tirar proveito de uma safra que se configura como uma das melhores desde o período de conciliação da mecanização do corte.
Perante essa conjuntura, que inclusive permite a alguns especialistas apontarem para um ATR acumulado que pode chegar a R$ 0,71 em 20/21, é importante segurar a ansiedade e saber que todos os problemas, gerados após mais de uma década de crise, não serão sanados em apenas uma temporada, sendo necessário pensar num trabalho de extensão e a possível permanência de anos positivos a fio, mesmo naqueles verões mais secos.
Armadilhas de nossa mente, a depressão (excesso de passado), o estresse (excesso de presente) e a ansiedade (excesso de futuro) precisam ser controladas pelo produtor para ele atravessar esse momento que se configura positivo da maneira mais racional possível