E começa a safra 2020/21

01/04/2020 Colunista POR: Marcos Fava Neves

A nossa análise deste mês está mais focada no assunto do momento, a crise advinda do Coronavírus, uma vez que é o fato dominante na economia e no agro.

A OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) tem uma visão bem pessimista para a crise advinda do Coronavírus. Acredita que o crescimento mundial deve cair para 2,4%, o menor desde 2009. Em 2021 voltaria a crescer 3,3%, desde que a epidemia seja controlada. Caso o vírus se espalhe mais rapidamente e aumente seus danos, o número pode recuar para 1,5%. A queda é puxada principalmente pela China, que veria seu crescimento em apenas 4,9%. Voltaria a crescer 6,4% em 2021. Para o Brasil, a OCDE estima esse crescimento em 1,7%.

O Coronavírus impactou negativamente os preços internacionais de algumas commodities. De acordo com o Valor Data, em fevereiro, a soja caiu 3,6%, o milho 2,5% e o algodão 4,5%.

As limitações impostas à circulação de mercadorias na China devido ao Coronavírus prejudicaram as produções locais de frangos e de suínos. Ainda não se têm mais informações sobre a magnitude deste problema.

Pesquisa feita em 1.000 lares pela multinacional Kantar, na China, mostra os impactos no comportamento com a crise do Coronavírus. Foram submetidas 24 categorias de produtos e serviços e os respondentes tiveram que dizer se aumentaram, reduziram ou mantiveram os gastos e o que pretendem fazer quando voltarem à rotina. Como era de se esperar, o setor de serviços, principalmente entretenimento e turismo, sofreu queda de mais de 75%, bem como cosméticos e vestuário (ao redor de 60%). Os gastos com alimentos e bebidas cresceram em 40% dos lares. As plataformas de comércio eletrônico foram as mais usadas neste período para as entregas. Outro dado interessante ao agro é que, em 28% dos lares, foi usado um tempo adicional para cozinhar mais. 84% dos lares consumiram produtos on- line de forma inédita. Ao retomarem a vida normal, todos os setores devem ter crescimento, praticamente para os níveis anteriores à crise. Em 65% dos lares, os restaurantes serão o primeiro alvo "pós-liberdade”.

Em fevereiro, segundo pesquisa da Caixin/Markit, o índice de atividade industrial na China caiu 25%, principalmente com as restrições de viagens e de produção devido à queda de encomendas e fechamento de fábricas.

O governo argentino aumentará as tarifas de exportação sobre a soja de 30 para 33%. A Argentina tem 6% das exportações mundiais. Repete-se uma medida que se mostrou inadequada no passado.

No Brasil, o mais recente Boletim Focus traz o IPCA em 3,19% neste final de ano e 3,75% no final de 2021. O PIB fica em 2,17% (2020) e 2,5% (2021), o câmbio em R$/US$ 4,20 (2020) e R$/US$ 4,15 (2021) e a taxa Selic fecha 2020 em 4,25% e 2021 com 5,75%.

Deve-se monitorar de perto as PECs que caminham no Senado e na Câmara que tributam com ICMS as exportações de produtos primários e semielaborados. As perdas com estas medidas seriam muito grandes no médio e longo prazo, diminuindo as exportações do Brasil. Fora as inseguranças jurídicas e, consequentemente, de investimentos que estas geram.

De acordo com o boletim de fevereiro da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), a produção esperada de grãos para o período 2019/20 será de 251,1 milhões de toneladas, incremento de 3,8% em relação à anterior, totalizando 9,1 milhões de toneladas a mais. Para a área cultivada, a estimativa é de 64,8 milhões de hectares, 2,5% superior ao ciclo passado. A área com algodão deve crescer 5,3%, e a com soja 2,6%. O milho primeira safra deve aumentar sua área em 3,4% (4,25 milhões de hectares) devido às boas cotações, produzindo 26,1 milhões de toneladas, enquanto que na segunda safra são esperados 73,2 milhões de toneladas e, na terceira, 1,16 milhões de toneladas, totalizando 100,5 milhões de toneladas, 0,4% superior à safra 2018/19.

Segundo dados do Mapa, as exportações do agro brasileiro totalizaram US$ 5,83 bilhões em janeiro de 2020, caindo 9,4% com relação ao período anterior (US$ 6,43 bilhões). As vendas de carnes para o exterior se mantiveram em níveis elevados, atingindo US$ 1,35 bilhão, crescimento de 30,9%; carne bovina vendeu US$ 631,5 milhões (+38,1%); carne de frango, US$ 522,0 milhões (+17,0%), e carne suína US$ 163,30 milhões (+79,9%). Os produtos florestais tiveram redução de 33,8% chegando a US$ 947,38 milhões; o complexo soja caiu 30,9% com valor de US$ 878,46 milhões; já o complexo sucroalcooleiro cresceu suas vendas em 44,1%, atingindo US$ 514,49 milhões. Vale destacar as vendas de algodão que cresceram 144,2% chegando à cifra de US$ 484,80 milhões. As importações do agro totalizaram US$ 1,24 bilhão, o que equivale a uma redução de 1,6%, deixando o Brasil com saldo positivo de US$ 4,61 bilhões na balança. Em janeiro, a China comprou US$ 1,510, praticamente 26% do total exportado pelo Brasil.

Os preços do frete caíram de R$ 250 a R$ 300 por tonelada de grãos para ao redor de R$ 200 com a pavimentação da BR 163. Segundo a ANT, em 2019 o fluxo médio foi de 2.500 caminhões por dia.

 

Os cinco fatos do agro para acompanhar agora, em março, são:

Os impactos do Coronavírus na economia mundial, na economia brasileira e nas exportações do agronegócio e preços das commodities. Quais os impactos no consumo dos chineses e o que este fato trará caso o consumo destas carnes exóticas seja substituído pelas tradicionais que o Brasil exporta e quais os efeitos de interrupção produtiva nas cadeias de frango e suínos da China;

O comportamento do clima na segunda safra de milho. Acompanhar também o clima na Argentina;

China e Ásia: seguir as notícias dos impactos da peste suína africana na produção da Ásia nos preços e quantidades de carnes importadas do Brasil. Este assunto ficou meio esquecido com a crise do Coronavírus, mas segue presente;

Anúncios de avanços no acordo comercial China e EUA e a pressão nos preços dos nossos produtos,

O andamento da agenda de reformas no Brasil com a retomada do crescimento e seus impactos ao agro e ao câmbio, e as crises criadas pelas comunicações desnecessárias.

 

Reflexões dos fatos e números da cana

Os preços do petróleo devem retomar o nível de 58 a 60 dólares o barril com o arrefecimento da crise do Coronavírus. O problema é saber quando. Se esta não arrefecer e os preços seguirem em queda, pode comprometer a recuperação do setor na safra 2020/21, puxando para baixo o bom valor de início do ATR. É a principal questão a ser observada.

Sobre as usinas, vale a pena destacar que a São Martinho apresentou o maior lucro da história neste último trimestre da safra, com R$ 343 milhões. A receita total cresceu 22,2% graças a aumentos de produtividade dos canaviais, gerando mais produtos e melhores preços comparativamente ao mesmo trimestre da safra passada. A margem Ebitda ficou em mais de 52%. A empresa anunciou estudos também para produzir etanol de milho em Pradópolis.

Segundo a ANP, até o momento foram certificadas 19 usinas para a comercialização de CBios, sendo 11 produtoras de etanol e 8 de biodiesel.

Neste momento, nossa “frota sucroenergética” de mais de 300 usinas está quase pronta para entrar em operação.

 

Reflexões dos fatos e números do açúcar

A safra 2019/20 pode ter um déficit na produção de açúcar acima de 10 milhões de toneladas e isto ajuda a segurar a esperada queda de preços com a crise do Coronavírus e com a desvalorização do real, fatores que seriam responsáveis por uma baixa maior que a observada. No fechamento desta coluna, o contrato de maio estava em 13,62 cents.

Problemas climáticos também farão a produção de açúcar nos EUA cair para o menor nível da década, aumentando os custos das empresas. A beterraba foi atingida por chuva e neve, enquanto que o excesso de umidade afetou a produção vinda da cana. O México, que é o principal fornecedor dos EUA, também teve problemas de seca e os EUA devem necessitar buscar mais no mercado internacional, sendo outro fator de alta.

A Archer viu fixação recorde de açúcar da safra 2020/21, motivada por preços acima de R$ 1.400/tonelada nas últimas semanas. Foi um excelente movimento das usinas aproveitando o câmbio e o namoro de pouco tempo com 15 cents/libra peso.

As exportações de açúcar cresceram 55,8% em janeiro de 2020, atingindo US$ 470,25 milhões. Enquanto isso, as exportações de etanol caíram 21,0%, com valor de US$ 43,07 milhões.

 

Reflexões dos fatos e números do etanol

Em 2019, o mercado brasileiro de combustíveis cresceu 2,9%, de acordo com a ANP. O total comercializado foi de 140 bilhões de litros. Destes, foram 57,3 bilhões de diesel (3% acima), 22,54 bilhões de hidratado (16,2% acima), 38,16 bilhões de litros de gasolina (queda de 0,56%). A demanda do ciclo Otto cresceu 5%. O Brasil é o sétimo maior consumidor mundial de derivados de petróleo.

Na primeira quinzena de fevereiro, nossas usinas do Centro-Sul venderam 1,2 bilhão de litros, uma queda comparativa de 8,2%. A queda no hidratado foi de quase 14%, compensada em parte pelo aumento do anidro em 13% e pela redução na diferença de preços.

Em janeiro, o mercado de etanol foi contemplado com a produção de 350 milhões de litros adicionais, sendo 50% vindos do milho e 50% importados. Isto, somado à queda de vendas de hidratado em janeiro de quase 4,3% (1,75 bilhão de litros), aliviou as preocupações que os estoques não seriam suficientes para atravessar a entressafra. A redução dos preços da gasolina também contribui para um aumento de seu consumo. Estima-se que ao final de janeiro tínhamos 3,6 bilhões de litros de hidratado em estoques e 2,6 bilhões de anidro. Espera-se que estes 300 milhões de litros adicionais por mês (milho e importações) continuem aliviando o problema. Com as usinas começando agora em março, creio que o problema está superado.

O governo dos EUA sinalizou parar as exceções dadas às pequenas refinarias de petróleo de seguir a necessidade de mistura de etanol, bem como anunciou metas arrojadas de mistura de biocombustíveis nos fósseis até 2050. Esta informação trouxe valorização imediata dos papéis ligados ao etanol (RINs) e pode trazer aumento de consumo.

Ao fechar esta coluna, o litro do hidratado com impostos nas usinas estava, pela SCA, cotado em R$ 2,51.

 

Quais são os cinco principais fatos para observarmos agora em março?

O andamento da safra de açúcar no hemisfério norte e o déficit na produção advindo das quebras. Até agora as notícias são de aumento das quebras;

Acompanhar os impactos do Coronavírus no crescimento econômico mundial e brasileiro e nos preços do açúcar e do petróleo, principalmente. No fechamento desta coluna, o barril do tipo Brent estava a USD 52. Uma queda grande no mês, que não apareceu tanto no preço da gasolina devido à desvalorização do real. Mas estava voltando a subir e creio que este será o caminho de volta à cerca de USD 60 até a normalização da situação;

Acompanhar a evolução da taxa de câmbio e as fixações de açúcar das safras 2020/21/22, que ditarão o mix de alocação de cana;

O clima sobre o canavial que será colhido a partir de março vem sendo generoso, e as previsões da nova safra estão um pouco maiores que a atual e melhorando. Um bom sinal, mas que não deve ser suficiente por si só para afetar os preços. Tem demanda para esta cana toda,

A velocidade de implantação do RenovaBio.

Homenageado do mês

Desta vez, a nossa singela homenagem vai em memória de nosso amigo Eduardo Diniz Junqueira, fundador e presidente do Conselho Diretor da Abag/RP por 12 anos e um dos protagonistas do Proálcool. Deixa um legado eterno e uma linda família.