Fornecedores de Frutal-MG têm na união a receita para superar os desafios do passado, presente e futuro
Os produtores, Paulo e Eliéde Roberto Camolesi ao lado do RTV da Copercana de Frutal, Marcos de Felício: Integração com os grãos foi a fórmula encontrada pelos irmãos para encontrar o equilíbrio entre o custo da previsibilidade e as incertezas dos riscos
Nascidos praticamente na roça de Jaborandi-SP, os irmãos Paulo e Eliéde Roberto Camolesi são exemplos de um tipo de produtor rural muito importante na formação da agricultura brasileira na mais eficiente do mundo, o de botina suja que respira sua atividade quase que todos os dias do ano.
Graneleiros devido a influência do pai, em 1994 eles decidem trocar a cidade natal para desbravar o cerrado de Frutal-MG, principalmente porque nessa época a cana-de-açúcar começa a chegar na região de Jaborandi: “Na época era muito complexo concorrer com a cana pelas terras arrendadas, pois as usinas pagavam muito bem, então decidimos procurar uma nova área para continuar com o cultivo da soja, milho e sorgo”, lembrou Paulo Roberto Camolesi.
Assim se passaram cerca de dez anos até que a cana chegasse no lado mineiro da beira do Rio Grande: “Quando se confirmou a história que seria instalada uma usina aqui nós achamos que seria uma oportunidade fantástica, pois ainda mantínhamos um pequeno canavial em Jaborandi e a remuneração era muito boa”, conta o produtor.
No entanto, a regra de ouro na agricultura é de que nada é igual ou normal, e logo eles perceberam que o desafio em produzir cana em Minas Gerais seria bem maior que em São Paulo: “Aqui encaramos sem conhecimento prévio todos os obstáculos relacionados ao corte mecanizado da cana, só que com o agravante de custos mais elevados e estrutura de fornecimento de produtos, peças e ferramentas, principalmente as desenvolvidas especialmente para a cultura canavieira, escassas”, disse Camolesi.
Dentre a enorme lista de problemas, o mais icônico deles foi relacionado a infestação da cigarrinha, pois como as ferramentas adotadas em outras regiões não faziam efeito lá, e o conhecimento técnico sobre a praga era bastante limitado, os produtores tiveram que amargar prejuízos por muitas safras consecutivas até encontrar o manejo ideal, baseado no corte de soqueira.
A briga com a cigarrinha foi tão brava que ela motivou a união dos produtores numa associação, fundada quando o número de fornecedores de cana começou a ganhar volume, no sentido primário de representação de seus interesses. Então a Aprovale se transformou no canal para a formação de uma equipe técnica que se dedicou unicamente em encontrar uma solução para a infestação da praga, o que foi bem-sucedido, tanto que evoluiu para uma prestação de serviço mais ampla, abrangendo atualmente o monitoramento de plantio e colheita e se tornando referência na cultura.
Nessa toada, e com todo o histórico graneleiro que vinha desde a época do pai, os irmãos Camolesi perceberam que investir na diversificação de culturas seria a melhor estratégia. Era evidente que a cana precisaria percorrer um bom caminho para se estabilizar no sentido de como se trabalhar com ela, mas por outro lado tinha uma boa previsibilidade de renda, enquanto que nos grãos havia a exposição a instabilidade de preços e climática, mas eles tinham o conhecimento necessário para dominar seu manejo.
Dessa maneira, hoje eles tocam um canavial de 700 hectares e cultivam cerca de dois mil de soja (considerando áreas de reforma de cana), milho e sorgo.
Canavial (primeiro plano) e lavoura de sorgo safrinha (segundo plano) dos Camolesi, área que já foi de cana e hoje recebe grãos
A cada ano novos desafios
A atual temporada, considerando o período que se inicia no plantio da soja na rotação com os talhões em reforma, teve uma primeira fase de muita preocupação, isso porque o veranico de novembro atrasou o plantio da leguminosa, no caso dos Camolesi, ela foi semeada a partir do dia 20, e como a normal climática da região há um corte brusco das águas em abril, quando chove uma média inferior a 20 mm, o receio foi não ter tempo hábil para o plantio da cana, que nesse cenário projetava para invadir até meados de maio.
Porém, as chuvas permaneceram no primeiro mês do outono de maneira muito generosa, em algumas regiões de Frutal o índice pluviométrico do período foi superior a 100 mm, o que garantiu boa produtividade da soja e um plantio de cana tranquilo, pelo menos sob o aspecto climático.
Na área trabalhista, os produtores tiveram que se reinventar e recorrer mais uma vez na sua união, personificada na associação, para resolver a grande insegurança jurídica para quem optasse pelo plantio manual.
“Perante o aumento significativo do risco na contratação de terceiros para a execução do plantio de cana, a Aprovale fez um rigoroso trabalho de fiscalização e apoio das empresas prestadoras de serviço selecionadas no sentido de compra e exigência para utilização dos EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), contratação de todos os colaboradores com carteira de trabalho assinada, implantação de área de vivência e estrutura de banheiro em todas as áreas e fiscalização das condições dos alojamentos de quem veio de outras localidades. Com isso conseguimos garantir a segurança dos produtores e também dos trabalhadores e assim trabalharmos o manejo mais adequado perante nossa realidade”, disse Camolesi ao se referir que essa iniciativa deu a velocidade necessária para chegar em 100% das áreas dos associados antes do final de abril.
O produtor, que está finalizando o seu segundo mandado à frente da associação, ainda se lembrou de outras iniciativas recentes que trouxeram benefícios expressivos aos associados, como, por exemplo, a conquista de um capital de giro, financiado pela usina, para auxiliar nos custos de plantio e também a viabilização de uma estrada que economizou uma média de 10 km o transporte de cana dos canaviais colhidos na região do Xatão destinadas à uma unidade industrial.
Sobre a atual safra, quando conversou com a reportagem, os irmãos já haviam feito o corte de um talhão e achado o resultado bastante positivo. Na área que já havia ido para moagem haviam canas de primeiro, segundo e terceiro (vítimas das seca e geada de 2021) cortes, nele foi feita a aplicação de maturador quinze dias antes da chegada das colhedoras.
Nessa área foram produzidos 116 quilos de açúcar por tonelada de cana num TCH (Toneladas de Cana por Hectare) na média de 100 rendimento muito superior se comparado com a mesma área, colhida num período similar, na safra passada.
Como já são vacinados contra a cigarrinha, e as chuvas tardias tendem a deixar um ambiente propício para a praga perante a palhada úmida pós-colheita, os irmãos já estão organizados para entrar com o cortador de soqueira o quanto antes.
Chuvarada em abril em Frutal (foto da região do Xatão) é coisa rara, mas muito bem-vinda
Colheita, um problema do passado, presente e muito provavelmente do futuro
Para entender o crônico problema no custo do CTT (Corte, Transbordo e Transporte) que acompanha a produção canavieira do município desde a chegada da cultura, é preciso voltar ao passado e ver que, diferente de outras localidades vizinhas do sul do Triângulo Mineiro, como por exemplo: Campo Florido, Itapagipe, Conceição das Alagoas e Pirajuba, a área agrícola de Frutal foi formada por pequenos e médios produtores que saíram do interior paulista, com história muito parecida com a dos Camolesi, e portanto as propriedades são muito recortadas, o que torna mais difícil a formação de grandes blocos de colheita.
“A grande maioria dos produtores possui de 200 a 300 hectares de cana, diferente do que aconteceu nas cidades vizinhas onde as usinas chegaram quase juntas com a agricultura, sendo possível o arrendamento de grandes glebas e a formação de blocos”, disse o RTV da Copercana em Frutal, Marcos de Felício.
No sentido de amenizar o gargalo logístico, há cinco anos os produtores recorreram mais uma vez à associação, que montou um planejamento logístico de corte e transbordo através da contratação de frentes terceiras.
O serviço funciona, faz com que os fornecedores consigam entregar cana ao longo de toda safra, tem qualidade evitando falhas, pisoteio e com isso elevando o número de ciclos, porém esbarra no custo, como explica Paulo Camolesi: “O preço do terceiro sempre será mais caro que o valor da usina, não tem como, pois a mudança de talhão é intensa na colheita para a associação, dizem que a colhedora anda mais de caminhão-prancha do que sozinha, nós vamos ter que repensar numa outra forma para colher a cana”.
Na visão dele, os produtores mais próximos terão que formar uma frente de colheita em sociedade e se organizarem para entregar a cana o ano todo.
Não há dúvidas que eles vão superar mais esse obstáculo, e muitos outros que virão, pois o fornecimento de cana em Frutal é fonte de mais um exemplo que o Triângulo Mineiro dá para o restante da canavicultura nacional, o de como sobreviver na cultura utilizando a integração com outras lavouras.