Falta de crédito dificulta retomada das empresas

30/10/2012 Geral POR: Valor Econômico
Diante de uma conjuntura adversa para todo o segmento sucroalcooleiro, as empresas que estão em recuperação judicial veem suas dificuldades serem aprofundadas na medida em que têm o agravante de não ter acesso a crédito e registrarem, portanto, um baixo nível de investimento operacional com a mesma carga tributária de uma empresa sadia.
Atualmente com faturamento bruto de R$ 200 milhões e endividamento de R$ 238 milhões (sem contar os débitos tributários), a Usina Campestre, de Penápolis (SP), entrou em recuperação judicial em dezembro de 2009. Desde então, segundo o CEO da empresa, José Carlos Fernandes de Alcântara, paga em dia as dívidas acordadas no plano, assim como as despesas correntes, inclusive os impostos. Do começo do plano até agora, a geração de caixa foi destinada para pagamento de R$ 15 milhões em débitos passados e R$ 61 milhões em impostos correntes.
De acordo com o CEO da Campestre, as dívidas trabalhistas foram quitadas, com exceção da existente com o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), que foi parcelada e, segundo ele, está sendo paga em dia. Todos os credores com débitos de até R$ 10 mil também foram pagos, além dos fornecedores de cana, que já receberam R$ 7 milhões - e ainda têm R$ 94 milhões a receber.
Ao fim desta safra, em março de 2013, a Campestre terá pago R$ 23 milhões a seus credores, menos de 10% da dívida total. "É preciso lembrar que temos despesas operacionais. Somente com manutenção na entressafra serão R$ 10 milhões", exemplifica Alcântara.
A empresa ainda tem débitos tributários contraídos antes do pedido de proteção judicial. São R$ 161 milhões de encargos federais (repactuados via Refis) e um valor ainda maior de estaduais, que estão sendo questionados na Justiça.
A Campestre, que em seu auge processou 2,7 milhões de toneladas de cana, deve moer no atual ciclo 1,65 milhão de toneladas. Trata-se de alguma recuperação ante as 1,1 milhão processadas em 2011/12 e as 1,38 milhão de toneladas de 2010/11. "Muitos parceiros voltaram a nos fornecer a matéria-prima", afirma Alcântara.
A contragosto dos credores, o grupo Naoum, cujas usinas estão em recuperação judicial desde o início de 2009, deve pedir à Justiça a venda de alguns ativos para se capitalizar e reduzir a pressão sobre o fluxo de caixa. A empresa não vem fazendo os investimentos necessários em canaviais e, neste ciclo, uma de suas três usinas paralisou a moagem por falta de cana.
"Tentamos aprovar a desmobilização de ativos, mas os credores não aceitaram. Faremos o pedido via Justiça", afirma o advogado do grupo, Sérgio Emerenciano. Segundo ele, o aperto veio da queda dos preços do açúcar e do etanol e dos aumento dos custos. "Estimamos, com isso, uma receita 15% menor", diz Emerenciano.
Entre os ativos que podem ser colocados à venda estão aqueles não estratégicos, como terrenos, mas também a própria unidade de Jaciara (MT), que não está moendo cana nesta safra.
As duas usinas do grupo Naoum em operação (em Mato Grosso e Goiás) devem processar, juntas, 2,9 milhões de toneladas de cana, de 10% a 15% menos do que o realizado no ciclo passado. "O grupo chegou a processar 4 milhões de toneladas de cana", lembra o advogado. Até o momento, a empresa pagou a credores R$ 120 milhões, com recursos da própria operação. Ainda deve R$ 290 milhões, valor que não inclui tributos.
A Companhia Albertina, localizada em Sertãozinho (SP), também deixou de operar neste ciclo. Em recuperação judicial desde 2008, a unidade apenas manteve cultivo agrícola e repassou à Biosev (Louis Dreyfus) o direito de assumir 8 mil hectares em contratos de arrendamento de cana. (FB)
Contexto
A renegociação de dívidas com credores não se restringe às usinas em recuperação judicial. Uma parcela expressiva do segmento sucroalcooleiro está buscando repactuar débitos com bancos, movimento que deve se intensificar até o fim da atual safra de cana, em março de 2013. O Itaú BBA estima que, no início da próxima safra de cana-de-açúcar, a 2013/14, o endividamento das usinas terá crescido 10%, de um patamar de R$ 52 bilhões para R$ 57 bilhões. O aumento decorre, em sua maior parte, do volume grande de investimentos realizados no último ano em adequações industriais e, principalmente, na renovação e ampliação de canaviais, segundo o diretor comercial do banco de investimento, Alexandre Figliolino. Levantamento do Itaú BBA indica que usinas que representam 18% da moagem de cana do setor estão com sérias dificuldades financeiras.