O canto do galo corta o horizonte, anunciando o novo dia, quando se inicia a rotina na vida do engenheiro agrônomo Pedro Carvalho Wiezel. Ou o contrário, quando a noite passa a ser dia, e o trabalho no campo segue pela madrugada afora, acompanhando a colheita da cana-de-açúcar e as diversas etapas que a atividade exige, inclusive as que dão “dor de cabeça”, como quebra de maquinário ou dificuldades com tráfego de caminhões.
Produtor de cana-de-açúcar da região de Santa Rosa de Viterbo-SP, o moço de 26 anos faz parte da terceira geração de uma família tradicional na lida com a lavoura canavieira e herdou o apreço pelo campo desde menino, estando à frente do negócio há cinco anos, antes mesmo de terminar a faculdade. “O setor enfrenta muitas dificuldades e a crise funcionou como um pé no freio para muitos produtores, mas os investimentos feitos ao longo do tempo não justificam a transição para outros ramos. Continuamos a apostar na cana-de-açúcar”, afirmou ele, que é o responsável pela produção de 100 mil toneladas da matéria-prima entregue para usinas da região.
A realidade do dia a dia do engenheiro agrônomo é bem parecida com a de grande parte de agricultores que têm a cultura como meio de vida. Wiezel faz parte de um contingente de fornecedores que representam cerca de 54% de toda a cana-de-açúcar produzida no Brasil, total que deve chegar a 650,75 milhões de toneladas na safra 16/17, segundo a DATAGRO, fato que mostra a importância do produtor dentro da cadeia canavieira e mesmo no agronegócio brasileiro, já que o setor sucroenergético representou, por exemplo, na safra 14/15, PIB Setorial estimado em US$ 107,72 bi, a geração de 613 mil empregos diretos e a arrecadação de US$ 8,52 bi em impostos agregados, segundo a Markestrat (Centro de Pesquisas e Projetos em Marketing e Estratégia da USP).
“O papel do produtor de cana-de-açúcar dentro do setor sucroenergético tem uma relevância enorme e isso deve se intensificar em um futuro próximo, já que estamos no início de uma transformação imposta pela escala de produção e o crescimento do segmento, que passou por diversas mudanças nos últimos tempos”, pontua Celso Albano de Carvalho, gestor executivo da ORPLANA.
A organização representa 17 mil produtores do Centro-Sul do país, responsáveis por cerca de 71,3 milhões de toneladas na safra atual. Segundo ele, existe um processo de migração das usinas para desempenhar o seu papel meramente industrial e transferir todo seu ativo de produção, no caso a lavoura, para o fornecedor, visando, assim, à maior eficiência no processo. “São Paulo, o principal estado produtor de cana-de-açúcar, enfrentou as alterações ocorridas nos últimos tempos com a implantação da mecanização e novas mudanças devem ocorrer, já que está chegando o fim do prazo para o término das queimadas no estado. Será outro aprendizado que usinas e fornecedores deverão ter, por isso eu vejo a necessidade desta transformação, com cada um fazendo muito bem a sua atividade”, explicou Albano.
Opinião compartilhada com Marcos Fava Neves, prof. titular da FEA/USP. “O mundo caminha para a especialização em relações de contratos entre os elos e agentes da cadeia produtiva, então, na minha leitura, a produção de cana é função do produtor de cana e este produtor de cana é integrado à usina”, afirmou, completando “eu gosto deste modelo, no qual a usina fica mais leve, delega para produtores especializados um alto grau de confiança, de integração, planejamento conjunto e foca nas suas atividades industriais e desenvolvimento de mercado, deixando toda a parte de produção com o fornecedor”, justificou o especialista.
Diante das mudanças, a necessidade de uma nova associação
É fato que, no mundo globalizado, quem fica parado é atropelado pelas mudanças que chegam em vários setores da vida. A inércia resulta em desaparecimento do mercado até mesmo para empresas já conceituadas. Foi com este propósito - de evitar um fim certeiro - que a Canaoeste (Associação dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo) entrou em um processo de reestruturação no final de 2015. “É preciso se adequar, evoluir. Se a agricultura está evoluindo, nós, na parte de assistência, temos que evoluir, como ocorreu com as máquinas, com os produtos, e as pessoas também têm que acompanhar essa trajetória. Se a cooperativa, a associação ficar ‘paradona’ no tempo, daqui a pouco estamos fechando a porta. Então, ou nós vamos atender a essa nova demanda que surgiu com as mudanças que vem atravessando o setor ou nós saímos fora”, pontuou o presidente da associação, Manoel Ortolan.
De acordo com ele, dentro dessa nova postura, o produtor de cana deve ser chamado de produtor integrado de cana. “Quando as multinacionais aportaram aqui, as usinas, geralmente, tinham de 50% a 70% das canas e o restante era completado por produtores, agora isso também vem mudando”, explicou, afirmando que, sem dúvida, o melhor negócio seria a indústria cuidar da indústria e o produtor cuidar da produção de cana-de-açúcar e colocar essa cana na esteira da usina, ou vender a sua cana para a usina, e este trabalho está começando através das multinacionais, que têm manifestado interesse em transferir áreas que vinham arrendando de produtores para quem tem vontade, quem tem ambição de crescer, de ter a sua estrutura própria e, para isso, ele precisará ter de 100 mil toneladas para cima”, esclareceu, afirmando que essa prática irrigaria econômica e socialmente a região onde ficam as terras, já que, para a atividade, seria preciso a aquisição de maquinários, insumos etc.
“Não tenha dúvida de que a situação dos pequenos vai passar por mais transformação daqui para a frente. É só pensar no que eram as regiões de Sertãozinho, Ribeirão Preto, Piracicaba, Jaú, há 50, 60 anos, locais tradicionais no cultivo da cana, onde ocorreu uma verdadeira reforma agrária, com a divisão das propriedades com a chegada das novas gerações. Isso mudou o perfil Manoel Ortolan, presidente da Canaoeste das lavouras, que antes ocupavam fazendas de 500 hectares e hoje se limitam a poucos hectares. É o quadro que temos hoje”, lembra.
Porém, Ortolan ressalta que isso foi possível até antes da mecanização. “Quando se queimava a cana, era possível para o produtor fazer a safra inteira, mesmo pequena, mas agora mudou muito, ficando praticamente inviável ao produtor pequeno ter mão de obra e atender a todas as legalidades que a atividade exige”, ressaltou, completando que, com a mecanização, a agricultura entra na fase de escala, necessitando ter áreas para viabilizar o seu negócio. “Se não, você vai tocando a vida como muitos estão fazendo hoje, até acabar o seu negócio, pois o trator quebra, você não consegue arrumar ou trocar por um mais novo e vai caminhando assim, e o que vem vindo de encontro a isso são os produtores mais bem preparados, mais bem estruturados, que, com o apoio da própria usina, começam arrendando essas áreas, comprando mais áreas, e o pequeno vai saindo da atividade; é um processo natural, eu acho que não tem outro caminho”, diz o executivo, ressaltando que uma maneira de se manter no negócio é unir forças, formar grupos, consórcio, cooperativas para se trabalhar em conjunto e, com isso, ter escala.
“Essa mudança toda afeta a Canaoeste, por isso que a entidade vem fazendo a sua reestruturação, exatamente para fazer frente a essa nova fase. Nós temos que preparar os nossos técnicos para um outro tipo de serviço, não simplesmente o assistencialismo puro e simples. O agrônomo ensinava a pessoa a regular uma plantadora, um pulverizador, a ficar no plantio de cana contando gema para ver se estava bom (sic), são coisas que vão ficando para trás. Com a tecnologia de hoje, o computador que há no trator, nas máquinas faz isso sozinho, então, temos que preparar também os técnicos para uma nova fase, em que, talvez, a nossa principal atuação será na gestão de propriedades, formação de gestores. É pegar esses produtores, ou talvez os filhos, e trabalhar mais essa área, onde há uma boa gestão”, finaliza.
Relacionamento com o produtor de cana intensificado
As mudanças também podem ser percebidas no relacionamento entre produtores e compradores da matéria-prima, no caso, as usinas. Com este contexto, de estreitar o relacionamento com seus fornecedores, a Raízen, que controla 24 usinas no país, criou o Programa Cultivar, que vem há três anos, contribuindo para a redução de custos, especialização em boas práticas agrícolas e otimização da produtividade e da qualidade da lavoura.
O programa foi estruturado em cinco pilares, envolvendo a parte de contribuição de compras, desenvolvimento de fornecedores, reconhecimento de desempenho
e linhas de crédito e serviços, proporcionando, assim, conhecimento para os produtores melhorarem sua produção, além das vantagens para adquirirem insumos e equipamentos e conseguirem linhas de crédito diferenciadas.
Cerca de 50% da cana movimentada na companhia, prevista nesta safra em torno de 64 milhões de toneladas, é comprada de fornecedores de cana.
“Desse total, 74% vêm dos 284 fornecedores que participam do programa Cultivar nesta terceira etapa da iniciativa e representam, em hectares, cerca de 400 mil”, afirma José Carlos Carramate, diretor de negócios agrícolas da Raízen, explicando que existe um mix com grandes e pequenos fornecedores e que o mesmo acontece em relação às etapas da produção, sendo que alguns entregam a cana na esteira e, em outros casos, a usina é responsável por todo o processo ou somente parte dele, como o CCT (Corte, Carregamento e Transporte).
O diretor destaca também que treinamentos sobre temas relacionados à área agrícola, gestão empresarial e sustentabilidade, além de convênio com instituições de ensino, como a FGV (Fundação Getúlio Vargas), para curso focado na gestão empresarial de fazendas canavieiras, são os benefícios oferecidos aos fornecedores filiados ao programa. Além disso, todos os anos são incluídas novidades, como a tecnologia GeoCana, que monitora remotamente as plantações dos participantes através do uso de drones, possibilitando, assim, a identificação de falhas na formação dos canaviais, pragas etc.
O processo realizado pelos fornecedores é acompanhado por meio de um RVE (Relatório de Visita Estruturada) e, posteriormente, auditado em relação às questões de sustentabilidade e, segundo o diretor, os fornecedores que alcançam os melhores índices, por exemplo, de produtividade e qualidade da colheita são premiados por sua atuação com viagens internacionais.
A parceria passa a ser além do negócio, diz o diretor, gerando satisfação e resultados positivos para ambas as partes, com ganhos de eficiência. Prova disso é que a empresa encerrou o primeiro trimestre da safra 16/17 com um aumento de R$ 471 milhões no EBITDA, ajustado quando comparado ao mesmo período do ano anterior, representando um crescimento de 55%.
“Um programa como este é inovador e caracteriza que a operação de relacionamento entre uma indústria de usina de cana e o fornecedor de cana não existe somente através da compra, de um contrato, de uma manifestação comercial. Este programa adiciona muito valor na divisão de conhecimento de valores, no apoio à operação de fornecedores, proporcionando melhores resultados de performance, e isso vale também para os pequenos produtores, que encontram mais dificuldades de acesso ao mercado. Portanto, é uma plataforma de difusão tecnológica e de conhecimento e estamos muito satisfeitos com o resultado”, concluiu.
Plantando parcerias
Outro item que passa a fazer parte da agenda anual das usinas é o encontro com fornecedores e parceiros da região onde as unidades estão instaladas. Como no caso do Grupo Viralcool, controlador de três usinas no Estado de São Paulo, uma das empresas que aposta nesta iniciativa para fidelizar ainda mais seus fornecedores.
Durante evento realizado em junho, em Viradouro-SP, onde fica uma de suas usinas, com a participação de produtores, parceiros e empresários, o presidente do Grupo, Antonio Eduardo Tonielo, ressaltou a importância dos fornecedores e a satisfação em realizar o encontro, que está em sua 4ª edição, momento no qual são pontuadas informações relevantes sobre a usina, sendo também momento de atualização e descontração.
“Desta vez contamos com uma palestra do prof. Marcos Fava Neves, que nos deu um norte sobre o agronegócio, este que é um setor que garante reservas para o nosso país. Os produtos que lidamos, como o amendoim, a soja, o milho, o açúcar e etanol, estão com bom preço, então chegou a hora de o produtor parar de sofrer, tentar pagar as suas contas, pelo menos ter condições melhores”, afirmou Tonielo, que também é presidente da Copercana e do Sicoob Cocred.
Na ocasião, Manoel Ortolan, presidente da Canaoeste, também deu seu recado comentando sobre a reformulação da entidade, iniciativa necessária diante de tantas mudanças no setor sucroenergético e que tem como objetivo melhorar a comunicação e fortalecer a associação para melhor defender os direitos dos fornecedores de cana-de-açúcar.
A companhia, que iniciou sua safra em 1986, com aproximadamente 500 funcionários, processando 240 mil toneladas de cana-de-açúcar e 32 milhões de litros de aguardente, hoje, mais de 30 anos depois, conta com 1.843 funcionários, e, tem a previsão de moer, nesta safra, em torno de 2,6 milhões de toneladas de cana, cerca de 10% a mais do que foi processado na temporada passada. Além disso, pretende produzir 3,8 milhões de sacos de açúcar; 80 mil m3 de etanol; 105 mil MW/h de energia e 2 mil toneladas de leveduras.
Cerca de 70% da matéria-prima movimentada pela usina vem de 600 fornecedores de cana, muitos deles parceiros de longa data, como Clarindo Dandaro, de Sertãozinho-SP, que fornece para a usina em torno de 4 mil toneladas de cana, há cerca de 30 décadas; João Antonio Geraldo e Dorival Aparecido de Souza, de Viradouro-SP, fornecedores de 1.300 toneladas há 10 anos e Paulo Fernando Beato Drugovish, com propriedade em Morro Agudo-SP, de onde saem em torno de 12 mil toneladas para a usina. Parceiros como Alberto Borges e seus filhos, Marcelo e Alberto Borges Junior, de Sertãozinho-SP, também marcaram presença no evento. Eles arrendam terras em Viradouro e Bebedouro para a Viralcool-SP. Representantes da Copercana, como o diretor Pedro Esrael Bighetti, e da Canaoeste, como o gestor corporativo, Almir Torcato e o engenheiro agrônomo Antônio Leandro Pagotto, também estiveram no encontro.
Conciliando culturas
A vinda de multinacionais para o setor sucroenergético brasileiro causou certo atrito de culturas, inicialmente, fato que, ao longo dos anos, vai ficando cada vez mais distante, já que muitas companhias investiram em programas de relacionamento com os principais atores de suas atividades, os fornecedores de cana.
É o caso da Biosev, controlada pela Louis Dreyfus Company Holdings, que iniciou sua atuação na indústria de açúcar-etanol em 2000, com a aquisição de sua primeira unidade no Brasil, a Cresciumal, em Leme-SP. Atualmente, a companhia tem 11 unidades em operação, localizadas em cinco polos agroindustriais: Ribeirão Preto, Mato Grosso do Sul, Nordeste, Leme e Lagoa da Prata.
Anualmente, a Biosev reúne seus fornecedores e parceiros agrícolas para debater questões sobre a empresa e o setor sucroenergético. O primeiro encontro de 2016, aconteceu em junho, em Ribeirão Preto-SP, com a presença de cerca de 300 fornecedores das unidades Santa Elisa, Vale do Rosário, MB e Continental. Na ocasião, o presidente da empresa, Rui Chammas, reforçou a relevância de manter um bom relacionamento com todos os elos da cadeia produtiva.
“Estamos em uma cadeia; não existe usina sozinha. Somos nós, os fornecedores de cana, os fazendeiros que arrendam a terra, que são nossos parceiros; temos nossos fornecedores de insumos, os nossos colaboradores, pois, se queremos um negócio sustentável que dure, é preciso trabalhar todas as dimensões”, disse o presidente, que apresentou os resultados da empresa e reforçou a importância dos fornecedores e parceiros de cana-de-açúcar para a companhia. Durante o evento, o presidente da DATAGRO, Plínio Nastari, apresentou uma análise do mercado, passando por safra, preços, tecnologia e outros temas relevantes.
“Realizamos esse tipo de encontro desde 2010 e ele já está no calendário dos nossos fornecedores e parceiros de cana”, explicou Walter Becker, diretor de Originação da Biosev. “O evento é mais uma oportunidade para reforçarmos nosso relacionamento com todos eles, falar sobre o setor, a empresa e relembrarmos todas as boas histórias desses anos de parceria”, afirma o executivo. Segundo ele, o evento faz parte do programa Mais Cana Biosev, que tem o objetivo de aumentar a produtividade e o relacionamento entre a companhia, os fornecedores e parceiros agrícolas. Entre as ações do Mais Cana, está a transferência de tecnologia agrícola, com palestras técnicas e orientações agronômicas, repasse de cereais, concessão de crédito para renovação dos canaviais, fornecimento de insumos, entre outras iniciativas.
Ao todo, a empresa tem cerca de 1.200 fornecedores, que representaram um terço da matéria-prima movimentada pelas suas unidades na safra 15/16, que chegou a 31 milhões de toneladas. A companhia projeta para a próxima safra, a moagem entre 30,5 e 33,5 milhões de toneladas de cana de açúcar; ATR Cana entre 129kg/ton e 133 kg/ ton e ATR Total entre 3,93 milhões de toneladas e 4,46 milhões de toneladas.
Os produtores da região de Leme-SP também já tiveram seu evento anual, em julho, quando o diretor comercial de originação de cana, Enrico Biancheri, apresentou dados de mercado e os resultados da companhia. “Temos hoje perto de 165 parceiros, que arrendam terra para a gente; perto de 130 fornecedores, chegando à marca, este ano, de quase 900 mil toneladas de cana vinda de fornecimento, ou seja, mais de 40% da cana de Leme vem de fornecedores”, contou o executivo, pontuando que a parceria com os produtores é vital para a companhia.
“Queremos trabalhar cada vez mais junto aos nossos fornecedores, apresentando para eles as novas tecnologias que estão sendo utilizadas, os novos varietais, falar das iniciativas que já acontecem na usina e queremos que os fornecedores participem e implementem as iniciativas no seu próprio campo”, afirmou.
Já Ricardo Lopes, diretor agrícola da Biosev, falou sobre as prioridades agrícolas, manejo, projetos e melhorias que vêm ocorrendo nas unidades, reforçando a atitude da empresa de levar as inovações aos produtores, citando a implantação de um Centro de Tecnologia e Inovação, na unidade Santa Elisa, em Sertãozinho-SP. “O local terá como objetivo prospectar e desenvolver soluções de tecnologia, inovação e sustentabilidade para o negócio da cana-de-açúcar, produzindo e disseminando o conhecimento para todas as unidades, contribuindo de forma decisiva para que a Biosev seja líder do setor”, disse.
O encontro contou ainda com a palestra Manejo Varietal, apresentada pelo engenheiro agrônomo e gerente de desenvolvimento agrícola da Biosev, Gustavo Nogueira. “O sucesso de nossa atividade passa pela diversificação varietal”, concluiu o profissional.
Para os produtores Diego Hernandez Viel e Carlos Rossolem, fornecedores da
Biosev na região de Leme-SP, o evento promovido pela empresa é uma prova de que a companhia se preocupa com a atividade em si e com o bom relacionamento entre usinas e fornecedores e creditam à usina o aumento da produtividade de suas lavouras, devido ao apoio recebido.
Recuperando o protagonismo
“O fornecedor, o produtor de cana, é o elo fundamental de toda a cadeia produtiva que se estrutura no setor sucroenergético, essa que fica cada vez mais complexa, mais sofisticada, mas a base, o fundamento é o produtor, o fornecedor de cana”, destacou o secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim, ao participar do lançamento da terceira etapa do projeto Caminhos da Cana em Ribeirão Preto - SP, uma expedição que roda as regiões canavieiras disseminando as externalidades do setor sucroenergético, alinhando demandas dos produtores locais para propor soluções e melhorar as condições da categoria.
Jardim pontua que o fornecedor de cana, diante do cenário atual, ficou restringindo a sua capacidade de ação e de influência e isso teve graves danos para toda a cadeia produtiva. “Nós vivemos um momento em que as associações se enfraqueceram e hoje eu sinto uma retomada da importância das associações; gosto muito do que vejo na ORPLANA, que é uma revitalização da entidade e seu fortalecimento”, diz o secretário, afirmando que, com esse novo perfil, a entidade contribui para ajudar o produtor a voltar a crescer, com avanço na produtividade e melhor gestão de seu negócio.
Ações e iniciativas através da secretaria, como intensificação da implantação do sistema de MPB (mudas pré-brotadas), foram pontuadas pelo titular da pasta, a favor da recuperação do fornecedor canavieiro.
“O produtor tem que recuperar o seu protagonismo dentro da atividade, ter um papel crescente, decisivo, voltar a ter a sua função original, de produtor agrícola, que cuida da sua terra, que forma um conceito sobre a terra e que pode, inclusive, impulsionar o avanço da produtividade. É disso que nós precisamos hoje. O setor sucroenergético depende da recuperação do protagonismo e do papel do plantador de cana”, elucida.
A importância do produtor independente de cana-de-açúcar para a recuperação do setor também é reconhecida pela CNA (Confederação Nacional da Agricultura). “Este empresário tem um vínculo histórico com a atividade, com a sua região e com a terra. Ele não investe porque o momento da cadeia de cana-de-açúcar é positivo ou negativo, ele investe por que acredita na terra, ama a sua atividade”, ressaltou o presidente da Comissão Nacional de Cana-de-açúcar da CNA, Ênio Fernandes Júnior.
Ele lembra, ainda, que o produtor promove o desenvolvimento local, a distribuição de renda e traz riqueza e prosperidade ao interior do Brasil. “Grandes grupos transnacionais investem em suas atividades, mas repatriam parte dos seus lucros às suas sedes de origens, o que é perfeitamente legítimo. Já o produtor independente de cana-de-açúcar tem sua sede de origem na região de sua produção; este sim é e continuará sendo o principal fator de desenvolvimento do Brasil. Mesmo sem apoio, concorrendo com grupos que têm acesso a recursos financeiros e tecnológicos mais competitivos do que ele, mantém sua persistência, sua resiliência. Esta é a sua principal virtude, para a sorte de sua região e do Brasil”, diz.
“O know how dos produtores na atividade canavieira foi essencial, se pensarmos nesta mudança de comando que ocorreu nas usinas, com a entrada de capital estrangeiro, com habilidade com culturas anuais, mas sem facilidade de entender como funciona o sistema de produção de uma cultura semi-perene como é a cana; então, para estes, principalmente do ponto de vista de fornecimento de matéria-prima, o produtor desempenha um papel indiscutivelmente importante”, concorda Mônika Bergamaschi, presidente do Ibisa (Instituto Brasileiro para Inovação e Sustentabilidade no Agronegócio) e ex-secretária da Agricultura do estado de São Paulo.
O canto do galo corta o horizonte, anunciando o novo dia, quando se inicia a rotina na vida do engenheiro agrônomo Pedro Carvalho Wiezel. Ou o contrário, quando a noite passa a ser dia, e o trabalho no campo segue pela madrugada afora, acompanhando a colheita da cana-de-açúcar e as diversas etapas que a atividade exige, inclusive as que dão “dor de cabeça”, como quebra de maquinário ou dificuldades com tráfego de caminhões.
Produtor de cana-de-açúcar da região de Santa Rosa de Viterbo-SP, o moço de 26 anos faz parte da terceira geração de uma família tradicional na lida com a lavoura canavieira e herdou o apreço pelo campo desde menino, estando à frente do negócio há cinco anos, antes mesmo de terminar a faculdade. “O setor enfrenta muitas dificuldades e a crise funcionou como um pé no freio para muitos produtores, mas os investimentos feitos ao longo do tempo não justificam a transição para outros ramos. Continuamos a apostar na cana-de-açúcar”, afirmou ele, que é o responsável pela produção de 100 mil toneladas da matéria-prima entregue para usinas da região.
A realidade do dia a dia do engenheiro agrônomo é bem parecida com a de grande parte de agricultores que têm a cultura como meio de vida. Wiezel faz parte de um contingente de fornecedores que representam cerca de 54% de toda a cana-de-açúcar produzida no Brasil, total que deve chegar a 650,75 milhões de toneladas na safra 16/17, segundo a DATAGRO, fato que mostra a importância do produtor dentro da cadeia canavieira e mesmo no agronegócio brasileiro, já que o setor sucroenergético representou, por exemplo, na safra 14/15, PIB Setorial estimado em US$ 107,72 bi, a geração de 613 mil empregos diretos e a arrecadação de US$ 8,52 bi em impostos agregados, segundo a Markestrat (Centro de Pesquisas e Projetos em Marketing e Estratégia da USP).
“O papel do produtor de cana-de-açúcar dentro do setor sucroenergético tem uma relevância enorme e isso deve se intensificar em um futuro próximo, já que estamos no início de uma transformação imposta pela escala de produção e o crescimento do segmento, que passou por diversas mudanças nos últimos tempos”, pontua Celso Albano de Carvalho, gestor executivo da ORPLANA.
A organização representa 17 mil produtores do Centro-Sul do país, responsáveis por cerca de 71,3 milhões de toneladas na safra atual. Segundo ele, existe um processo de migração das usinas para desempenhar o seu papel meramente industrial e transferir todo seu ativo de produção, no caso a lavoura, para o fornecedor, visando, assim, à maior eficiência no processo. “São Paulo, o principal estado produtor de cana-de-açúcar, enfrentou as alterações ocorridas nos últimos tempos com a implantação da mecanização e novas mudanças devem ocorrer, já que está chegando o fim do prazo para o término das queimadas no estado. Será outro aprendizado que usinas e fornecedores deverão ter, por isso eu vejo a necessidade desta transformação, com cada um fazendo muito bem a sua atividade”, explicou Albano.
Opinião compartilhada com Marcos Fava Neves, prof. titular da FEA/USP. “O mundo caminha para a especialização em relações de contratos entre os elos e agentes da cadeia produtiva, então, na minha leitura, a produção de cana é função do produtor de cana e este produtor de cana é integrado à usina”, afirmou, completando “eu gosto deste modelo, no qual a usina fica mais leve, delega para produtores especializados um alto grau de confiança, de integração, planejamento conjunto e foca nas suas atividades industriais e desenvolvimento de mercado, deixando toda a parte de produção com o fornecedor”, justificou o especialista.
Diante das mudanças, a necessidade de uma nova associação
É fato que, no mundo globalizado, quem fica parado é atropelado pelas mudanças que chegam em vários setores da vida. A inércia resulta em desaparecimento do mercado até mesmo para empresas já conceituadas. Foi com este propósito - de evitar um fim certeiro - que a Canaoeste (Associação dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo) entrou em um processo de reestruturação no final de 2015. “É preciso se adequar, evoluir. Se a agricultura está evoluindo, nós, na parte de assistência, temos que evoluir, como ocorreu com as máquinas, com os produtos, e as pessoas também têm que acompanhar essa trajetória. Se a cooperativa, a associação ficar ‘paradona’ no tempo, daqui a pouco estamos fechando a porta. Então, ou nós vamos atender a essa nova demanda que surgiu com as mudanças que vem atravessando o setor ou nós saímos fora”, pontuou o presidente da associação, Manoel Ortolan.
De acordo com ele, dentro dessa nova postura, o produtor de cana deve ser chamado de produtor integrado de cana. “Quando as multinacionais aportaram aqui, as usinas, geralmente, tinham de 50% a 70% das canas e o restante era completado por produtores, agora isso também vem mudando”, explicou, afirmando que, sem dúvida, o melhor negócio seria a indústria cuidar da indústria e o produtor cuidar da produção de cana-de-açúcar e colocar essa cana na esteira da usina, ou vender a sua cana para a usina, e este trabalho está começando através das multinacionais, que têm manifestado interesse em transferir áreas que vinham arrendando de produtores para quem tem vontade, quem tem ambição de crescer, de ter a sua estrutura própria e, para isso, ele precisará ter de 100 mil toneladas para cima”, esclareceu, afirmando que essa prática irrigaria econômica e socialmente a região onde ficam as terras, já que, para a atividade, seria preciso a aquisição de maquinários, insumos etc.
“Não tenha dúvida de que a situação dos pequenos vai passar por mais transformação daqui para a frente. É só pensar no que eram as regiões de Sertãozinho, Ribeirão Preto, Piracicaba, Jaú, há 50, 60 anos, locais tradicionais no cultivo da cana, onde ocorreu uma verdadeira reforma agrária, com a divisão das propriedades com a chegada das novas gerações. Isso mudou o perfil Manoel Ortolan, presidente da Canaoeste das lavouras, que antes ocupavam fazendas de 500 hectares e hoje se limitam a poucos hectares. É o quadro que temos hoje”, lembra.
Porém, Ortolan ressalta que isso foi possível até antes da mecanização. “Quando se queimava a cana, era possível para o produtor fazer a safra inteira, mesmo pequena, mas agora mudou muito, ficando praticamente inviável ao produtor pequeno ter mão de obra e atender a todas as legalidades que a atividade exige”, ressaltou, completando que, com a mecanização, a agricultura entra na fase de escala, necessitando ter áreas para viabilizar o seu negócio. “Se não, você vai tocando a vida como muitos estão fazendo hoje, até acabar o seu negócio, pois o trator quebra, você não consegue arrumar ou trocar por um mais novo e vai caminhando assim, e o que vem vindo de encontro a isso são os produtores mais bem preparados, mais bem estruturados, que, com o apoio da própria usina, começam arrendando essas áreas, comprando mais áreas, e o pequeno vai saindo da atividade; é um processo natural, eu acho que não tem outro caminho”, diz o executivo, ressaltando que uma maneira de se manter no negócio é unir forças, formar grupos, consórcio, cooperativas para se trabalhar em conjunto e, com isso, ter escala.
“Essa mudança toda afeta a Canaoeste, por isso que a entidade vem fazendo a sua reestruturação, exatamente para fazer frente a essa nova fase. Nós temos que preparar os nossos técnicos para um outro tipo de serviço, não simplesmente o assistencialismo puro e simples. O agrônomo ensinava a pessoa a regular uma plantadora, um pulverizador, a ficar no plantio de cana contando gema para ver se estava bom (sic), são coisas que vão ficando para trás. Com a tecnologia de hoje, o computador que há no trator, nas máquinas faz isso sozinho, então, temos que preparar também os técnicos para uma nova fase, em que, talvez, a nossa principal atuação será na gestão de propriedades, formação de gestores. É pegar esses produtores, ou talvez os filhos, e trabalhar mais essa área, onde há uma boa gestão”, finaliza.
Relacionamento com o produtor de cana intensificado
As mudanças também podem ser percebidas no relacionamento entre produtores e compradores da matéria-prima, no caso, as usinas. Com este contexto, de estreitar o relacionamento com seus fornecedores, a Raízen, que controla 24 usinas no país, criou o Programa Cultivar, que vem há três anos, contribuindo para a redução de custos, especialização em boas práticas agrícolas e otimização da produtividade e da qualidade da lavoura.
O programa foi estruturado em cinco pilares, envolvendo a parte de contribuição de compras, desenvolvimento de fornecedores, reconhecimento de desempenho e linhas de crédito e serviços, proporcionando, assim, conhecimento para os produtores melhorarem sua produção, além das vantagens para adquirirem insumos e equipamentos e conseguirem linhas de crédito diferenciadas.
Cerca de 50% da cana movimentada na companhia, prevista nesta safra em torno de 64 milhões de toneladas, é comprada de fornecedores de cana.
“Desse total, 74% vêm dos 284 fornecedores que participam do programa Cultivar nesta terceira etapa da iniciativa e representam, em hectares, cerca de 400 mil”, afirma José Carlos Carramate, diretor de negócios agrícolas da Raízen, explicando que existe um mix com grandes e pequenos fornecedores e que o mesmo acontece em relação às etapas da produção, sendo que alguns entregam a cana na esteira e, em outros casos, a usina é responsável por todo o processo ou somente parte dele, como o CCT (Corte, Carregamento e Transporte).
O diretor destaca também que treinamentos sobre temas relacionados à área agrícola, gestão empresarial e sustentabilidade, além de convênio com instituições de ensino, como a FGV (Fundação Getúlio Vargas), para curso focado na gestão empresarial de fazendas canavieiras, são os benefícios oferecidos aos fornecedores filiados ao programa. Além disso, todos os anos são incluídas novidades, como a tecnologia GeoCana, que monitora remotamente as plantações dos participantes através do uso de drones, possibilitando, assim, a identificação de falhas na formação dos canaviais, pragas etc.
O processo realizado pelos fornecedores é acompanhado por meio de um RVE (Relatório de Visita Estruturada) e, posteriormente, auditado em relação às questões de sustentabilidade e, segundo o diretor, os fornecedores que alcançam os melhores índices, por exemplo, de produtividade e qualidade da colheita são premiados por sua atuação com viagens internacionais.
A parceria passa a ser além do negócio, diz o diretor, gerando satisfação e resultados positivos para ambas as partes, com ganhos de eficiência. Prova disso é que a empresa encerrou o primeiro trimestre da safra 16/17 com um aumento de R$ 471 milhões no EBITDA, ajustado quando comparado ao mesmo período do ano anterior, representando um crescimento de 55%.
“Um programa como este é inovador e caracteriza que a operação de relacionamento entre uma indústria de usina de cana e o fornecedor de cana não existe somente através da compra, de um contrato, de uma manifestação comercial. Este programa adiciona muito valor na divisão de conhecimento de valores, no apoio à operação de fornecedores, proporcionando melhores resultados de performance, e isso vale também para os pequenos produtores, que encontram mais dificuldades de acesso ao mercado. Portanto, é uma plataforma de difusão tecnológica e de conhecimento e estamos muito satisfeitos com o resultado”, concluiu.
Plantando parcerias
Outro item que passa a fazer parte da agenda anual das usinas é o encontro com fornecedores e parceiros da região onde as unidades estão instaladas. Como no caso do Grupo Viralcool, controlador de três usinas no Estado de São Paulo, uma das empresas que aposta nesta iniciativa para fidelizar ainda mais seus fornecedores.
Durante evento realizado em junho, em Viradouro-SP, onde fica uma de suas usinas, com a participação de produtores, parceiros e empresários, o presidente do Grupo, Antonio Eduardo Tonielo, ressaltou a importância dos fornecedores e a satisfação em realizar o encontro, que está em sua 4ª edição, momento no qual são pontuadas informações relevantes sobre a usina, sendo também momento de atualização e descontração.
“Desta vez contamos com uma palestra do prof. Marcos Fava Neves, que nos deu um norte sobre o agronegócio, este que é um setor que garante reservas para o nosso país. Os produtos que lidamos, como o amendoim, a soja, o milho, o açúcar e etanol, estão com bom preço, então chegou a hora de o produtor parar de sofrer, tentar pagar as suas contas, pelo menos ter condições melhores”, afirmou Tonielo, que também é presidente da Copercana e do Sicoob Cocred.
Na ocasião, Manoel Ortolan, presidente da Canaoeste, também deu seu recado comentando sobre a reformulação da entidade, iniciativa necessária diante de tantas mudanças no setor sucroenergético e que tem como objetivo melhorar a comunicação e fortalecer a associação para melhor defender os direitos dos fornecedores de cana-de-açúcar.
A companhia, que iniciou sua safra em 1986, com aproximadamente 500 funcionários, processando 240 mil toneladas de cana-de-açúcar e 32 milhões de litros de aguardente, hoje, mais de 30 anos depois, conta com 1.843 funcionários, e, tem a previsão de moer, nesta safra, em torno de 2,6 milhões de toneladas de cana, cerca de 10% a mais do que foi processado na temporada passada. Além disso, pretende produzir 3,8 milhões de sacos de açúcar; 80 mil m3 de etanol; 105 mil MW/h de energia e 2 mil toneladas de leveduras.
Cerca de 70% da matéria-prima movimentada pela usina vem de 600 fornecedores de cana, muitos deles parceiros de longa data, como Clarindo Dandaro, de Sertãozinho-SP, que fornece para a usina em torno de 4 mil toneladas de cana, há cerca de 30 décadas; João Antonio Geraldo e Dorival Aparecido de Souza, de Viradouro-SP, fornecedores de 1.300 toneladas há 10 anos e Paulo Fernando Beato Drugovish, com propriedade em Morro Agudo-SP, de onde saem em torno de 12 mil toneladas para a usina. Parceiros como Alberto Borges e seus filhos, Marcelo e Alberto Borges Junior, de Sertãozinho-SP, também marcaram presença no evento. Eles arrendam terras em Viradouro e Bebedouro para a Viralcool-SP. Representantes da Copercana, como o diretor Pedro Esrael Bighetti, e da Canaoeste, como o gestor corporativo, Almir Torcato e o engenheiro agrônomo Antônio Leandro Pagotto, também estiveram no encontro.
Conciliando culturas
A vinda de multinacionais para o setor sucroenergético brasileiro causou certo atrito de culturas, inicialmente, fato que, ao longo dos anos, vai ficando cada vez mais distante, já que muitas companhias investiram em programas de relacionamento com os principais atores de suas atividades, os fornecedores de cana.
É o caso da Biosev, controlada pela Louis Dreyfus Company Holdings, que iniciou sua atuação na indústria de açúcar-etanol em 2000, com a aquisição de sua primeira unidade no Brasil, a Cresciumal, em Leme-SP. Atualmente, a companhia tem 11 unidades em operação, localizadas em cinco polos agroindustriais: Ribeirão Preto, Mato Grosso do Sul, Nordeste, Leme e Lagoa da Prata.
Anualmente, a Biosev reúne seus fornecedores e parceiros agrícolas para debater questões sobre a empresa e o setor sucroenergético. O primeiro encontro de 2016, aconteceu em junho, em Ribeirão Preto-SP, com a presença de cerca de 300 fornecedores das unidades Santa Elisa, Vale do Rosário, MB e Continental. Na ocasião, o presidente da empresa, Rui Chammas, reforçou a relevância de manter um bom relacionamento com todos os elos da cadeia produtiva.
“Estamos em uma cadeia; não existe usina sozinha. Somos nós, os fornecedores de cana, os fazendeiros que arrendam a terra, que são nossos parceiros; temos nossos fornecedores de insumos, os nossos colaboradores, pois, se queremos um negócio sustentável que dure, é preciso trabalhar todas as dimensões”, disse o presidente, que apresentou os resultados da empresa e reforçou a importância dos fornecedores e parceiros de cana-de-açúcar para a companhia. Durante o evento, o presidente da DATAGRO, Plínio Nastari, apresentou uma análise do mercado, passando por safra, preços, tecnologia e outros temas relevantes.
“Realizamos esse tipo de encontro desde 2010 e ele já está no calendário dos nossos fornecedores e parceiros de cana”, explicou Walter Becker, diretor de Originação da Biosev. “O evento é mais uma oportunidade para reforçarmos nosso relacionamento com todos eles, falar sobre o setor, a empresa e relembrarmos todas as boas histórias desses anos de parceria”, afirma o executivo. Segundo ele, o evento faz parte do programa Mais Cana Biosev, que tem o objetivo de aumentar a produtividade e o relacionamento entre a companhia, os fornecedores e parceiros agrícolas. Entre as ações do Mais Cana, está a transferência de tecnologia agrícola, com palestras técnicas e orientações agronômicas, repasse de cereais, concessão de crédito para renovação dos canaviais, fornecimento de insumos, entre outras iniciativas.
Ao todo, a empresa tem cerca de 1.200 fornecedores, que representaram um terço da matéria-prima movimentada pelas suas unidades na safra 15/16, que chegou a 31 milhões de toneladas. A companhia projeta para a próxima safra, a moagem entre 30,5 e 33,5 milhões de toneladas de cana de açúcar; ATR Cana entre 129kg/ton e 133 kg/ ton e ATR Total entre 3,93 milhões de toneladas e 4,46 milhões de toneladas.
Os produtores da região de Leme-SP também já tiveram seu evento anual, em julho, quando o diretor comercial de originação de cana, Enrico Biancheri, apresentou dados de mercado e os resultados da companhia. “Temos hoje perto de 165 parceiros, que arrendam terra para a gente; perto de 130 fornecedores, chegando à marca, este ano, de quase 900 mil toneladas de cana vinda de fornecimento, ou seja, mais de 40% da cana de Leme vem de fornecedores”, contou o executivo, pontuando que a parceria com os produtores é vital para a companhia.
“Queremos trabalhar cada vez mais junto aos nossos fornecedores, apresentando para eles as novas tecnologias que estão sendo utilizadas, os novos varietais, falar das iniciativas que já acontecem na usina e queremos que os fornecedores participem e implementem as iniciativas no seu próprio campo”, afirmou.
Já Ricardo Lopes, diretor agrícola da Biosev, falou sobre as prioridades agrícolas, manejo, projetos e melhorias que vêm ocorrendo nas unidades, reforçando a atitude da empresa de levar as inovações aos produtores, citando a implantação de um Centro de Tecnologia e Inovação, na unidade Santa Elisa, em Sertãozinho-SP. “O local terá como objetivo prospectar e desenvolver soluções de tecnologia, inovação e sustentabilidade para o negócio da cana-de-açúcar, produzindo e disseminando o conhecimento para todas as unidades, contribuindo de forma decisiva para que a Biosev seja líder do setor”, disse.
O encontro contou ainda com a palestra Manejo Varietal, apresentada pelo engenheiro agrônomo e gerente de desenvolvimento agrícola da Biosev, Gustavo Nogueira. “O sucesso de nossa atividade passa pela diversificação varietal”, concluiu o profissional.
Para os produtores Diego Hernandez Viel e Carlos Rossolem, fornecedores da
Biosev na região de Leme-SP, o evento promovido pela empresa é uma prova de que a companhia se preocupa com a atividade em si e com o bom relacionamento entre usinas e fornecedores e creditam à usina o aumento da produtividade de suas lavouras, devido ao apoio recebido.
Recuperando o protagonismo
“O fornecedor, o produtor de cana, é o elo fundamental de toda a cadeia produtiva que se estrutura no setor sucroenergético, essa que fica cada vez mais complexa, mais sofisticada, mas a base, o fundamento é o produtor, o fornecedor de cana”, destacou o secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim, ao participar do lançamento da terceira etapa do projeto Caminhos da Cana em Ribeirão Preto - SP, uma expedição que roda as regiões canavieiras disseminando as externalidades do setor sucroenergético, alinhando demandas dos produtores locais para propor soluções e melhorar as condições da categoria.
Jardim pontua que o fornecedor de cana, diante do cenário atual, ficou restringindo a sua capacidade de ação e de influência e isso teve graves danos para toda a cadeia produtiva. “Nós vivemos um momento em que as associações se enfraqueceram e hoje eu sinto uma retomada da importância das associações; gosto muito do que vejo na ORPLANA, que é uma revitalização da entidade e seu fortalecimento”, diz o secretário, afirmando que, com esse novo perfil, a entidade contribui para ajudar o produtor a voltar a crescer, com avanço na produtividade e melhor gestão de seu negócio.
Ações e iniciativas através da secretaria, como intensificação da implantação do sistema de MPB (mudas pré-brotadas), foram pontuadas pelo titular da pasta, a favor da recuperação do fornecedor canavieiro.
“O produtor tem que recuperar o seu protagonismo dentro da atividade, ter um papel crescente, decisivo, voltar a ter a sua função original, de produtor agrícola, que cuida da sua terra, que forma um conceito sobre a terra e que pode, inclusive, impulsionar o avanço da produtividade. É disso que nós precisamos hoje. O setor sucroenergético depende da recuperação do protagonismo e do papel do plantador de cana”, elucida.
A importância do produtor independente de cana-de-açúcar para a recuperação do setor também é reconhecida pela CNA (Confederação Nacional da Agricultura). “Este empresário tem um vínculo histórico com a atividade, com a sua região e com a terra. Ele não investe porque o momento da cadeia de cana-de-açúcar é positivo ou negativo, ele investe por que acredita na terra, ama a sua atividade”, ressaltou o presidente da Comissão Nacional de Cana-de-açúcar da CNA, Ênio Fernandes Júnior.
Ele lembra, ainda, que o produtor promove o desenvolvimento local, a distribuição de renda e traz riqueza e prosperidade ao interior do Brasil. “Grandes grupos transnacionais investem em suas atividades, mas repatriam parte dos seus lucros às suas sedes de origens, o que é perfeitamente legítimo. Já o produtor independente de cana-de-açúcar tem sua sede de origem na região de sua produção; este sim é e continuará sendo o principal fator de desenvolvimento do Brasil. Mesmo sem apoio, concorrendo com grupos que têm acesso a recursos financeiros e tecnológicos mais competitivos do que ele, mantém sua persistência, sua resiliência. Esta é a sua principal virtude, para a sorte de sua região e do Brasil”, diz.
“O know how dos produtores na atividade canavieira foi essencial, se pensarmos nesta mudança de comando que ocorreu nas usinas, com a entrada de capital estrangeiro, com habilidade com culturas anuais, mas sem facilidade de entender como funciona o sistema de produção de uma cultura semi-perene como é a cana; então, para estes, principalmente do ponto de vista de fornecimento de matéria-prima, o produtor desempenha um papel indiscutivelmente importante”, concorda Mônika Bergamaschi, presidente do Ibisa (Instituto Brasileiro para Inovação e Sustentabilidade no Agronegócio) e ex-secretária da Agricultura do estado de São Paulo.