Informações úteis para o melhor manejo de Cana Bis

15/12/2023 Noticias POR: Dib Nunes JR.

Normalmente, os produtores de cana-de-açúcar na região Centro Sul do Brasil têm três tipos de cana para colher na safra: a cana de ano e meio (Colheita entre 14 a 17 meses), cana de ano (Colheita entre 10 a 11 meses) e a cana de inverno (Colheita aos 11 a 13 meses). As soqueiras se enquadram no grupo das canas que são colhidas entre 11 a 12 meses de idade, durante o ano todo, ao contrário da cana de ano que é colhida, quase sempre, nos últimos meses de safra.

Entretanto, vez ou outra são obrigados a se utilizar de um outro tipo de manejo cultural em parte de seus canaviais, apelidado de Cana Bis. São canaviais que não apresentam condições operacionais para serem colhidos durante a safra e têm o ciclo de desenvolvimento prolongado, permanecendo no campo até a safra seguinte. As informações sobre o melhor manejo desses canaviais são bastante controvertidas, uma vez que são considerados problema e podem apresentar qualidade de matéria-prima irregular para a industrialização. Para mitigar possíveis prejuízos é necessário, antes de tudo, ter a correta percepção de que vai haver um excedente de cana na safra e, a partir desse momento, iniciar uma seleção dos canaviais candidatos a serem bisados com base em critérios bem definidos que serão descritos nesse texto.

Nos anos muito chuvosos, as empresas que deixam a decisão de bisar cana para o final da safra, partindo do princípio de que o volume de cana que sobrar sem cortar será bisada podem ter surpresas desagradáveis com essa matéria-prima na safra seguinte.

1. O que precisamos saber para melhorar o resultado da Cana Bis?

Ao se utilizar de canaviais mais bem desenvolvidos de primeiros cortes para bisar, visando proporcionar um maior ganho de massa, pode não ser um bom negócio, pois a matéria-prima pode ficar comprometida com impurezas provenientes do maior tombamento, quantidade de brotos chupões e laterais, enraizamento aéreo, maior ataque de pragas e doenças e explosão das infestações de plantas daninhas. A cana bisada que tomba, por exemplo, vai apresentar uma matéria-prima com muitas partes vegetais como palmitos, raízes aéreas e folhas verdes agregadas aos colmos que a colhedora não consegue limpar, além do que as perdas de cana durante a colheita podem mais do que dobrar.

Em um canavial muito vigoroso, quando bisado, dependendo da variedade e do seu desenvolvimento, serão encontradas duas gerações de colmos, sendo a primeira formada por colmos primários e secundários adultos bem desenvolvidos, acamados, e uma segunda geração formada de brotos chupões com baixo teor de ATR, contribuindo com uma matéria-prima bastante irregular e de menor qualidade.


Figura 1 - Enraizamento aéreo de Cana Bis tombada

Para obter maior sucesso neste manejo, deve-se, preferencialmente, escolher para bisar os canaviais com bom stand, não florescidos, não infestados com pragas e daninhas, com baixo desenvolvimento vegetativo, comum nos últimos cortes, principalmente naqueles colhidos na última etapa de safra.

É recomendável selecionar canaviais mais velhos para deixá-los no campo por dois verões, pois poderão apresentar as seguintes VANTAGENS:

• Ganhar em torno de 20% até 30% na produtividade agrícola.
• Apresentar tombamento mínimo, o que reduz as perdas de cana e impurezas.
• Terá uma matéria-prima com melhores índices de ATR, pois o canavial vai estar ereto na colheita.
• Apresentará também um aumento no teor de fibra entre 1% e 1,5% num momento crítico de início de safra, quando a indústria necessita de mais bagaço.
• Redução do custo de produção por tonelada de cana, pois produzirá mais cana e mais ATR.
• A usina poderá soltar a safra mais cedo, melhorando o fluxo de caixa da empresa, que é esvaziado na entressafra.
• Liberar as áreas de reforma mais rapidamente, dando oportunidade para um preparo e correção da fertilidade, sistematização, rotação de culturas, combate às pragas do solo e a plantas daninhas com melhor qualidade.
• Esse canavial ainda poderá ser tratado com maturadores, como glifosato, por exemplo, em doses mais altas de até 500 ml/hectare, pois não haverá preocupação com a brotação de soqueira. Isso ajudará a despraguejar plantas daninhas de difícil controle como grama-seda e capim-colonião suscetíveis ao glifosato.


Figura 2 - Colletotrichum e Broca dos Colmos em Cana Bis


Figura 3 - Duas populações de                                          Figura 4 - Perdas de cana
colmos, uma tombada e outra de
brotos chupões

• Pode-se tratar esses canaviais com adubos foliares, inseticidas sistêmicos e biológicos, produtos estimulantes e fungicidas, obtendo uma melhor qualidade de matériaprima e favorecendo ganhos de produtividade agrícola.
• Haverá um melhor rendimento na colheita mecanizada, pois a cana bisada de últimos cortes vai estar ereta.
• Quando a área de Cana Bis é significativa e esses canaviais sendo colhidos logo no início de safra em substituição ao volume de cana programado, todas as áreas serão empurradas para frente, ganhando mais idade de corte vai favorecer o aumento de ATR e produtividade agrícola.

2. Outras recomendações gerais sobre esse modelo de manejo:

• Recomenda-se, de início, muita atenção com o plantio da Cana de Ano visando à chamada Cana de Ano Bis ou Cana de Dois Verões, pois ao bisar essa cana, se estiver bem formada e desenvolvida, será inevitável acontecer o seu tombamento excessivo. Por outro lado, se a cana de ano foi plantada no final de mês de novembro e em dezembro, pode se apresentar com baixo desenvolvimento vegetativo não sendo recomendada sua colheita na safra, assim se torna ótima opção para bisar. Nesse caso, podem proporcionar ganhos de produtividade maiores que 60%, com baixo tombamento,
• Nos solos de baixa fertilidade, onde o crescimento normalmente é limitado, a estratégia de bisar canaviais visando à Cana de Ano Bis, pode proporcionar produtividades muito elevadas chegando a superar as médias observadas em solos mais férteis. Para canaviais colhidos tarde e nas áreas que serão destinadas à reforma, quanto mais fértil é o solo, melhores serão as respostas a esse modelo de manejo.
• Nas regiões mais úmidas e de altitude superior a 750 metros na região Centro-Sul, a entrada de Cana Bis logo no início da safra vai melhorar a média de idade de corte dos canaviais que normalmente seriam colhidos com 12 meses.
• Nas regiões mais secas, os efeitos benéficos sobre o ATR somente serão sentidos nos dois ou três meses iniciais de safra, depois disso, o stress hídrico tende a reduzir essas vantagens.
• O sucesso com o manejo desse modelo cultural de produção será mais facilmente alcançado se essas áreas forem escolhidas e planejadas com antecedência.
• A escolha das variedades é fundamental. As variedades indicadas para bisar são aquelas que crescem mais lentamente, não florescem ou não apresentam indução ou diferenciação da gema apical para florescer, pois esse fenômeno paralisa o crescimento vegetativo. Caso isso aconteça, não haverá ganho de produtividade, induzirá brotações laterais e haverá enorme perda de ATR. Importante examinar os ponteiros das canas dos canaviais antes de bisá-lo.
• Variedades de maturação média à tardia que normalmente não florescem na região Centro-Oeste do Brasil, tais como: a CTC4, RB86 7515, RB00 5014 e a IACSP95-5094, entre outras, são mais indicadas para bisar.
• Variedades precoces como: CTC 9003, RB96 6928, RB86 5156 e RB97 5952 não são adequadas para bisar, pois encerram o seu ciclo de desenvolvimento mais cedo, paralisando o seu crescimento. Se bisadas, perderão peso e ATR.
• Variedades com hábitos decumbentes como: RB85 5156, CTC9003, RB97 5952, CTC9005 e CT96-1007, também não são ideais para serem bisadas, principalmente nos primeiros cortes quando se apresentarão mais produtivas.

• A área escolhida para bisar não poderá ter problemas sérios com matocompetição e nem alta incidência de pragas de solo, tais como: broca dos colmos, broca gigante, as cigarrinhas das raízes, Sphenophorus e Migdolus. Além disso, áreas muito atacadas por doenças como Estrias Vermelhas e Colletotrichum devem ser evitadas.
• Onde a infestação de broca dos colmos é reconhecidamente elevada, necessitará da realização de práticas de controle. Os levantamentos antecipados nessas áreas serão fundamentais.
• Para adotar esse sistema em escala comercial, as empresas necessitam, no mínimo, de 15 a 20% a mais em área para produção de cana.

Esperamos que esse texto tenha abordado importantes aspectos e tenha informações úteis para quem precisa bisar cana ou resolver adotar esse sistema de prolongamento de ciclo para melhorar a sua produtividade agrícola.

Vale ressaltar que ao adotarem esse tipo de manejo, armazenarão o açúcar e o etanol no campo.

3. Análise econômica

Experimentos realizados pela Copersucar, de autoria de Nunes at al. (1985) testaram 10 variedades de cana em dois tipos de Manejo Cultural, comparando-se o Sistema de Manejo Tradicional (plantio de cana de ano, com três colheitas) e o Sistema de Manejo com Ciclo Prolongado (Plantio de cana de ano, com apenas duas colheitas), onde foram observados os seguintes resultados:

Plantio: outubro de 1982
Colheitas – Manejo 1: outubro /84 e setembro/85
Colheitas – Manejo 2: junho/84 (dois verões) e setembro/85

Tabela 1 – Comparativo entre Manejo no Ciclo Normal X Ciclo Prolongado


a. Custos atualizados para 2022 (PECEGE)
b. Diferença no Custo de Produção: R$ 5.260,00 (Uma Colheita e um Trato Cultural a Menos)
c. O manejo com cana bisada apresentou uma produção de 14 toneladas de cana por hectare em três anos e uma média de 3,5 kg de ATR por tonelada de cana a mais no mesmo período.

Tabela 2: Projeção para seis anos

Qual seria o resultado para 1.000 hectares?

85% da área (Manejo Tradicional) = 72,5 t/ha X 850 ha = 61.625 toneladas
15% da área (Ciclo Prolongado) = 85,0 t/ha x 150 ha = 12.750 toneladas
Margem Agrícola Bruta= R$ 6.869,00 por hectare
Custo Adicional de Arrendamento = R$ 1.643,00 por hectare
Resultado: R$ 5.226,00/hectare em três anos
Resultado: R$ 5.226,00/hectare em três anos
Portanto, a margem bruta em apenas 150 hectares x R$ 5.226,00 = R$ 783.850,00 em três anos.

4. Conclusões:

Um experimento de prolongamento de ciclo (BIS) e seus resultados em canaviais novos:

1. Na escolha das áreas para bisar é muito importante focar em obter a melhor qualidade de matéria-prima e menores perdas possíveis. Por isso, os canaviais precisam ser escolhidos com base em critérios técnicos que apresentamos.

2. Quando a cana bis é aquela que simplesmente “sobrou sem cortar”, nem sempre dará bons resultados.

3. A escolha das variedades é de suma importância para se obter sucesso no sistema de produção de cana bis como manejo cultural.

4. O manejo cultural de cana bis como estratégia para se reduzir custos e aumentar a produtividade, pode dar bons resultados, desde que esse sistema seja bem planejado e a empresa tenha a possibilidade de ter no mínimo 15% a mais de áreas com canaviais.

5. Análises financeiras de experimentos antigos com valores atualizados, onde se fez um comparativo da cana de ano em Ciclo Normal x Ciclo Prolongado (Cana Bis), apontou ganhos 'significativos’ para a cana bisada, demonstrando ser uma alternativa viável de manejo cultural para se ganhar produtividade, ATR e melhorar as margens de lucro na produção de cana-de-açúcar.