“Crescimento e credibilidade são dois lados da mesma moeda: não há ajuste fiscal sem crescimento”, afirmou o ex-ministro da Fazenda, Delfim Neto, ao apresentar a palestra de abertura do NovaCana Ethanol Conference 2016. O evento, que teve como pauta principal o futuro do mercado de etanol e açúcar no Brasil, foi realizado recentemente, em São Paulo-SP. Ao compartilhar suas perspectivas sobre a economia nacional e políticas econômicas e fiscais, o economista disse que a atual situação econômica foi criada para atender e manter ao poder e que o momento é de transformação. "Para aumentar o investimento no Brasil, o poder executivo tem de assumir o seu protagonismo e sugerir ao congresso as mudanças estruturais necessárias, como enfrentar o problema da previdência e das vinculações dos gastos", afirmou, concluindo que a aposta em energia renovável seria um caminho certo para o crescimento do país.
O primeiro painel da conferência abordou os novos investimentos, políticas públicas e deficit no abastecimento e contou com apresentação de Aurélio César Nogueira Amaral, diretor da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) e André Rocha, presidente do Fórum Nacional Sucroenergético e teve como moderador Dário Costa Gaeta, CEO da Usina Ruette.
Amaral, da ANP, afirmou que o etanol pode ser um grande indutor do crescimento como já foi, pois vem mostrando a sua resiliência e tem muito a contribuir com o país. O executivo afirmou que, nas projeções da agência, com o país voltando a ter um crescimento modesto, haverá um déficit de combustíveis para motores do Ciclo Otto de cerca de três milhões de m³ de gasolina equivalente em 2022, 11 milhões de m³ em 2026 e 23,6 milhões de m³, em 2030. Transformando isso em barris de petróleo, seria o mesmo que 1,2 milhão de barris por dia de importação do produto.
“Isso é assustador e não tem hoje no Brasil, infraestrutura, nem para produção nem para recebimento, então esse é o nosso desafio: debater agora para planejar o passo a dar e definir se o etanol vai suprir boa parte dessa demanda e qual a infraestrutura necessária que vamos precisar, pois dez anos passam rápido para suprir toda essa demanda, todo este desafio”, ponderou.
Rocha, do Fórum, ressaltou que apesar de sua relevância, o setor viveu sua pior crise, fruto da descontinuidade de políticas públicas que garantam competitividade ao etanol, com medidas de Governo que privilegiaram a utilização de energias fósseis. “A criação de políticas de incentivo fiscal que considerem as externalidades da produção sucroenergética é essencial. É preciso ter confiabilidade jurídica para que o setor invista na expansão de seus parques industriais e da área plantada”, alegou.
Ricardo Dornelles, até então, diretor de Combustíveis Renováveis, do Ministério de Minas e Energia (foi exonerado), também participou do painel e afirmou que em 2025 terá um déficit de 7,63 bilhões de litros de gasolina equivalente a 11% da demanda. “É um número preocupante, mas administrável”, assegurou completando “Hoje nós não temos nenhum investimento em etanol, ou seja, a capacidade de cana está dada, se nós não aumentarmos a produção e esmagamento de cana, nós não vamos ter crescimento do setor, nós teremos migração do produto dentro do setor”, assegurou.
Cana-de-açúcar no Brasil: o médio e o longo prazo
Tarcílo Rodrigues, presidente da Bioagência, Fábio Meneghin, sócio analista da Agroconsult e Júlio Maria Borges, presidente da Job Economia, contribuíram com o segundo painel do evento, dando as suas visões sobre a safra atual, tendo como moderadora, a vice-presidente da Orplana, Maria Christina Pacheco.
Para a safra atual, a Agroconsult prevê um volume levemente acima da média: 626 milhões de toneladas ante moagem média de 623 milhões. “Vale notar também que, desde a safra 2014/15, não existe uma elasticidade tão grande para o índice. Naquele período, a diferença entre as previsões mínima e máxima era de 72,9 milhões de toneladas. Agora, a diferença é menor, 64 milhões de toneladas, mas superior à da safra anterior”, analisou Meneghin.
Borges frisou que o setor vive a melhor situação dos últimos 10 anos. “É uma oportunidade muito boa e a indústria deve saber aproveitar para esta safra, é uma questão de gestão e bom senso. O desafio está no médio e longo prazo”, disse, avisando que é a hora das usinas colocarem a casa em ordem.
Já Rodrigues, foi mais conservador. “O discurso do Governo é de que a solução está no 2G, mas acho que é um cenário distante ainda. Temos muito a desenvolver no etanol de primeira geração”, afirmou. De acordo com ele, existe um déficit estrutural de açúcar e está difícil cobrir esse GAP (diferença entre o valor real e o valor previsto) devido às condições das usinas nos países produtores. “Este GAP é diferente do passado, pois o setor está estagnado e sem perspectivas de investimentos, vamos precisar de greenfields e elas não existem”, constatou.
Interesse estrangeiro
“Margem é uma coisa delicada, você pode não quebrar por prejuízo, mas sim por falta de liquidez” afirmou Luiz Silvestre Coelho, chefe de negociação da Sucden do Brasil, ao explanar sobre os fatos relevantes que influenciaram a safra 2016/17 em painel que contou com a participação de Andy Duff, gerente do Departamento de Pesquisa Setorial do Rabobank. Segun
do ele, há um ano, o cenário de hoje era praticamente inimaginável. “Nós tínhamos um cenário no qual o açúcar caia 30% ao ano, era um mercado muito enfraquecido”, afirmou. Duff, que completou “Com tudo o que aconteceu, com o fator câmbio, o setor volta a ser interessante para capitais de fora. Os investidores voltaram, mas ainda há muitos fatores que vão contra o segmento”, concluiu.
Comercialização, mercado e preço do etanol
Com moderação de Luiz Gustavo Junqueira, diretor comercial da usina Alta Mogiana, o quarto painel do evento contou com três especialistas no biocombustível: Willian Orzari Hernandes, sócio da FG/AGRO; Martinho Ono, presidente da SCA e Delfim Oliveira, diretor de Regulamentação e Meio Ambiente da Brasilcom.
Hernandes apresentou dados de pesquisa da consultoria mostrando que, em uma série de preços de açúcar de 15 anos corrigidos por inflação e tendências, apenas 7% das vezes foram maiores que o preço de hoje. Ele ressaltou ainda que para atender à demanda atual dos produtos da cana, é preciso aumentar a produção. "Sem crescimento de moagem, dado prioridades de investimentos setoriais, a restrição de oferta de etanol hidratado será significativa", prevê.
Ono falou sobre a importância das políticas públicas para assegurar os preços. "Fica claro que os Estados que cobram ICMS menor no etanol hidratado em relação à gasolina têm vendas expressivas do combustível renovável", disse. Segundo o executivo, para atender aos compromissos firmados na COP 21, o volume de etanol precisaria atingir 50 bilhões de litros em 2030, lembrando, porém, que a produção máxima atual é de 30 bilhões. Portanto, algumas medidas são necessárias para chegar a este volume, tais como implementar política de remuneração previsível e sustentável e, principalmente, na harmonia entre a federação e os Estados.
Oliveira, da Brasilcom, ao falar sobre a comercialização de etanol, abordou os aspectos que envolvem a logística de compra e distribuição do etanol de seus associados, ressaltando as dificuldades provocadas pelas variações bruscas de preços que podem comprometer a sua comercialização, além de citar o regime de tributação que provoca o aparecimento de agentes distribuidores com práticas não conformes e que acabam até inviabilizando a venda desse combustível. “As distribuidoras emergentes representam 39% do mercado de hidratado”, afirmou.
Lado financeiro
“Apesar de acharmos que a pior fase já passou, a fotografia de deteorização brasileira ainda é muito ruim”, afirmou Manoel Pereira Queiroz, gerente sênior de Relacionamento do Rabobank, em painel coordenado por Claudio Miori, analista do Fitch Ratings. Ele ressaltou que mesmo com boas perspectivas de preço, existe baixa liquidez no mercado de crédito.
“O setor será obrigado, mais ainda que no passado recente, a financiar suas atividades com taxas “de mercado”, compondo, caso a caso, um mix entre dívida em reais e dívida em moeda estrangeira”, explicou o representante do Rabobank. Sobre novas aquisições, Queiroz frisou que já começaram a ver o movimento de players externos interessados em adquirir ativos no Brasil. “Acreditamos que comecem algumas fusões e aquisições nos próximos anos”, disse.
Para Cyrille Brunotte, superintendente executivo de Agronegócios do Bradesco BBI, o setor está finalmente apresentando sinais de recuperação, mas apesar das perspectivas de melhora do segmento, o ciclo de crédito ainda está “muito machucado” e os efeitos de melhoria do ciclo de crédito devem começar a aparecer apenas na safra 2017- 2018. “A discrepância de políticas e tributações entre os Estados não ajuda, o Brasil precisa trocar as emissões de CO2 por etanol para cumprir os compromissos assumidos em Paris”, ressaltou, lembrando que há interesses nas usinas, mas existem ainda mais discordâncias sobre a venda. “Nas negociações de aquisição, a diferença entre o preço pedido e o preço oferecido é muito grande. A busca dos compradores é por ativos bons e não por cachorros doentes”, afirmou.
Carlos Eduardo Cavalcanti, chefe do Departamento de Biocombustíveis do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), reforçou que as empresas tiveram que fazer escolhas dramáticas entre pagar dívidas ou renovar a lavoura e isso provocou o envelhecimento do canavial. “A prioridade continua sendo a redução dos níveis de alavancagem, com poucos e seletivos investimentos em expansão e foco na eficiência de processos”, disse.
De acordo com Alexandre Figliolino, sócio da MB Agro, após um período longo de crise motivado por preços pouco remuneradores e custos em alta, a situação atual é complexa, com um número grande de empresas em situação financeira ruim, com alta alavancagem e desestruturadas
do ponto de vista operacional. O consultor alertou também que a insegurança em relação ao futuro do etanol hidratado e à cogeração de biomassa, aliado às atuais condições político-econômica brasileira e, a um quadro de crédito extremamente escasso pode atenuar este potencial ciclo de crescimento. “O movimento de entrada de novos players estratégicos pode acontecer em escala reduzida”, finalizou
Etanol 2G
O desenvolvimento do etanol celulósico em larga escala foi tema de debate entre representantes das três unidades instaladas no Brasil: Antonio Alberto Stucchi, diretor executivo da Raízen, Alan Hiltner, VP de negócios da Granbio e Viler Janeiro, diretor de negócios do CTC, e contou com moderação do diretor do CTBE (Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol), Paulo Mazzafera. Os palestrantes relataram as dificuldades das diversas etapas para a produção do 2G, mas deixaram claro que apostam na produção do biocombustível gerado a partir da palha e bagaço da cana-de-açúcar.
“Olhamos o futuro do etanol 2G com confiança, faz parte do pioneirismo arcar com certo ônus”, disse Hiltner, assegurando que cerca de 10 bilhões de litros de etanol estão jogados no chão sob a forma de palha de cana. A Bioflex 1, unidade industrial da GranBio, foi a primeira fábrica de etanol celulósico em escala comercial do Hemisfério Sul. Instalada em São Miguel dos Campos-AL, a unidade, com capacidade para produzir 82 milhões de litros do biocombustível por ano, entrou em operação em setembro de 2014, mas a produção está temporariamente paralisada. “Acredito que o E2G não compete com a cogeração, considerando o volume de matéria-prima desperdiçada, há potencial para que as usinas façam as duas coisas”, conclui.
Stucchi discorda. “O E2G é competidor de cogeração, a decisão do que produzir fica sob o crivo da estratégica das companhias. O mais adequado para aproveitar a palha de cana seria investir em energia, mas não temos preço e condições”, afirma ele, apresentando informações sobre a planta da Raízen, inaugurada em julho de 2015, ao lado da Usina Costa Pinto, em Piracicaba-SP.
Com capacidade de produzir 42 milhões de litros por ano, a unidade custou R$ 230 milhões. “Estávamos muito confiantes e fomos um pouco arrogantes em relação à terra no bagaço, que causa um efeito devastador nos equipamentos.
Esse desgaste foi o principal responsável pelos resultados abaixo do esperado no ano passado”, afirmou.
Os desafios para o etanol celulósico deslanchar também foram pontuados por janeiro, do CTC, já que o condicionamento e o tratamento da biomassa ainda são um desafio, pois a tecnologia precisa ser desenvolvida em múltiplas etapas, o que equivale a um maior risco. “Já é consenso que existe uma previsão de gap de combustíveis do Ciclo Otto. O etanol celulósico é uma possibilidade com timing mais viável que greeenfiels ou novos investimentos para atender a esta demanda”, afirmou. O CTC possui uma planta com capacidade de 3 milhões de litros por ano, anexa à Usina São Manoel, com capacidade de três milhões litros/ano, funcionando em escala demonstrativa.
Cana-energia
“Evolução e perspectivas para a cana-energia: uma visão técnica e mercadológica” foi o tema da última palestra da conferência e contou com apresentação conjunta dos sócios da Vignis, Luís Claudio Rubio, presidente, e Sizuo Matsuoka, diretor. Criada em 2003, a Vignis é fruto da CanaVialis, uma empresa especializada no desenvolvimento de cana-energia.
“A cana-energia é um bebê que precisa ser cuidado e desenvolvido, por isso adotamos um modelo de negócio em que assumimos os riscos de plantar as nossas variedades de cana, do plantio, à colheita, e entregamos na esteira”, conta Rubio, explicando que a máquina convencional não está preparada para colher quase 200 toneladas por hectares, por isso, é preciso adaptações no maquinário.
Segundo Matsuoka, a cana-energia produz muito mais açúcar e celulose por hectare, apresentando aumento de produtividade com o passar do tempo. A renovação dos canaviais como conhecemos hoje não seria necessária com ela. “O setor estabeleceu que a cana não podia ter mais de 12% de fibra. Essa é uma trava que segurou a produtividade do setor por muito tempo”, diz, afirmando que é preciso haver uma mudança de paradigma.
De acordo com números da Vignis, se toda lavoura utilizada destinada ao etanol fosse substituída por cana-energia, haveria um incremento de 232% na produção do biocombustível e de 1.200% na geração de energia elétrica.
Segundo os palestrantes, o Grupo Raízen, dono de 24 usinas no Brasil, é um dos clientes da empresa, e vem trabalhando em um projeto piloto para testar a nova variedade, na unidade Bom Retiro (Capivari-SP). Parada desde 2015, a usina deverá voltar à ativa em 2017, sendo abastecida pela cana-energia.
Para Almir Torcato, gestor corporativo da Canaoeste, a participação na conferência foi muito importante, pois oferece uma visão geral sobre a posição de consultorias, bancos nacionais e estrangeiros, além de empresas, em relação ao setor sucroenergético. "Os desafios que o segmento terá pela frente, como também as perspectivas, foram apontados aqui e, embora tenha variação, o consenso é que tenha déficit mundial de açúcar tornando o cenário positivo neste e no próximo ano, talvez até no seguinte, pontuando grande demanda para o segmento", disse o executivo, ressaltando que os dados deverão ser disseminados nas próximas reuniões técnicas da associação.
“Crescimento e credibilidade são dois lados da mesma moeda: não há ajuste fiscal sem crescimento”, afirmou o ex-ministro da Fazenda, Delfim Neto, ao apresentar a palestra de abertura do NovaCana Ethanol Conference 2016. O evento, que teve como pauta principal o futuro do mercado de etanol e açúcar no Brasil, foi realizado recentemente, em São Paulo-SP. Ao compartilhar suas perspectivas sobre a economia nacional e políticas econômicas e fiscais, o economista disse que a atual situação econômica foi criada para atender e manter ao poder e que o momento é de transformação. "Para aumentar o investimento no Brasil, o poder executivo tem de assumir o seu protagonismo e sugerir ao congresso as mudanças estruturais necessárias, como enfrentar o problema da previdência e das vinculações dos gastos", afirmou, concluindo que a aposta em energia renovável seria um caminho certo para o crescimento do país.
O primeiro painel da conferência abordou os novos investimentos, políticas públicas e deficit no abastecimento e contou com apresentação de Aurélio César Nogueira Amaral, diretor da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) e André Rocha, presidente do Fórum Nacional Sucroenergético e teve como moderador Dário Costa Gaeta, CEO da Usina Ruette.
Amaral, da ANP, afirmou que o etanol pode ser um grande indutor do crescimento como já foi, pois vem mostrando a sua resiliência e tem muito a contribuir com o país. O executivo afirmou que, nas projeções da agência, com o país voltando a ter um crescimento modesto, haverá um déficit de combustíveis para motores do Ciclo Otto de cerca de três milhões de m³ de gasolina equivalente em 2022, 11 milhões de m³ em 2026 e 23,6 milhões de m³, em 2030. Transformando isso em barris de petróleo, seria o mesmo que 1,2 milhão de barris por dia de importação do produto.
“Isso é assustador e não tem hoje no Brasil, infraestrutura, nem para produção nem para recebimento, então esse é o nosso desafio: debater agora para planejar o passo a dar e definir se o etanol vai suprir boa parte dessa demanda e qual a infraestrutura necessária que vamos precisar, pois dez anos passam rápido para suprir toda essa demanda, todo este desafio”, ponderou.
Rocha, do Fórum, ressaltou que apesar de sua relevância, o setor viveu sua pior crise, fruto da descontinuidade de políticas públicas que garantam competitividade ao etanol, com medidas de Governo que privilegiaram a utilização de energias fósseis. “A criação de políticas de incentivo fiscal que considerem as externalidades da produção sucroenergética é essencial. É preciso ter confiabilidade jurídica para que o setor invista na expansão de seus parques industriais e da área plantada”, alegou.
Ricardo Dornelles, até então, diretor de Combustíveis Renováveis, do Ministério de Minas e Energia (foi exonerado), também participou do painel e afirmou que em 2025 terá um déficit de 7,63 bilhões de litros de gasolina equivalente a 11% da demanda. “É um número preocupante, mas administrável”, assegurou completando “Hoje nós não temos nenhum investimento em etanol, ou seja, a capacidade de cana está dada, se nós não aumentarmos a produção e esmagamento de cana, nós não vamos ter crescimento do setor, nós teremos migração do produto dentro do setor”, assegurou.
Cana-de-açúcar no Brasil: o médio e o longo prazo
Tarcílo Rodrigues, presidente da Bioagência, Fábio Meneghin, sócio analista da Agroconsult e Júlio Maria Borges, presidente da Job Economia, contribuíram com o segundo painel do evento, dando as suas visões sobre a safra atual, tendo como moderadora, a vice-presidente da Orplana, Maria Christina Pacheco.
Para a safra atual, a Agroconsult prevê um volume levemente acima da média: 626 milhões de toneladas ante moagem média de 623 milhões. “Vale notar também que, desde a safra 2014/15, não existe uma elasticidade tão grande para o índice. Naquele período, a diferença entre as previsões mínima e máxima era de 72,9 milhões de toneladas. Agora, a diferença é menor, 64 milhões de toneladas, mas superior à da safra anterior”, analisou Meneghin.
Borges frisou que o setor vive a melhor situação dos últimos 10 anos. “É uma oportunidade muito boa e a indústria deve saber aproveitar para esta safra, é uma questão de gestão e bom senso. O desafio está no médio e longo prazo”, disse, avisando que é a hora das usinas colocarem a casa em ordem.
Já Rodrigues, foi mais conservador. “O discurso do Governo é de que a solução está no 2G, mas acho que é um cenário distante ainda. Temos muito a desenvolver no etanol de primeira geração”, afirmou. De acordo com ele, existe um déficit estrutural de açúcar e está difícil cobrir esse GAP (diferença entre o valor real e o valor previsto) devido às condições das usinas nos países produtores. “Este GAP é diferente do passado, pois o setor está estagnado e sem perspectivas de investimentos, vamos precisar de greenfields e elas não existem”, constatou.
Interesse estrangeiro
“Margem é uma coisa delicada, você pode não quebrar por prejuízo, mas sim por falta de liquidez” afirmou Luiz Silvestre Coelho, chefe de negociação da Sucden do Brasil, ao explanar sobre os fatos relevantes que influenciaram a safra 2016/17 em painel que contou com a participação de Andy Duff, gerente do Departamento de Pesquisa Setorial do Rabobank. Segundo ele, há um ano, o cenário de hoje era praticamente inimaginável. “Nós tínhamos um cenário no qual o açúcar caia 30% ao ano, era um mercado muito enfraquecido”, afirmou. Duff, que completou “Com tudo o que aconteceu, com o fator câmbio, o setor volta a ser interessante para capitais de fora. Os investidores voltaram, mas ainda há muitos fatores que vão contra o segmento”, concluiu.
Comercialização, mercado e preço do etanol
Com moderação de Luiz Gustavo Junqueira, diretor comercial da usina Alta Mogiana, o quarto painel do evento contou com três especialistas no biocombustível: Willian Orzari Hernandes, sócio da FG/AGRO; Martinho Ono, presidente da SCA e Delfim Oliveira, diretor de Regulamentação e Meio Ambiente da Brasilcom.
Hernandes apresentou dados de pesquisa da consultoria mostrando que, em uma série de preços de açúcar de 15 anos corrigidos por inflação e tendências, apenas 7% das vezes foram maiores que o preço de hoje. Ele ressaltou ainda que para atender à demanda atual dos produtos da cana, é preciso aumentar a produção. "Sem crescimento de moagem, dado prioridades de investimentos setoriais, a restrição de oferta de etanol hidratado será significativa", prevê.
Ono falou sobre a importância das políticas públicas para assegurar os preços. "Fica claro que os Estados que cobram ICMS menor no etanol hidratado em relação à gasolina têm vendas expressivas do combustível renovável", disse. Segundo o executivo, para atender aos compromissos firmados na COP 21, o volume de etanol precisaria atingir 50 bilhões de litros em 2030, lembrando, porém, que a produção máxima atual é de 30 bilhões. Portanto, algumas medidas são necessárias para chegar a este volume, tais como implementar política de remuneração previsível e sustentável e, principalmente, na harmonia entre a federação e os Estados.
Oliveira, da Brasilcom, ao falar sobre a comercialização de etanol, abordou os aspectos que envolvem a logística de compra e distribuição do etanol de seus associados, ressaltando as dificuldades provocadas pelas variações bruscas de preços que podem comprometer a sua comercialização, além de citar o regime de tributação que provoca o aparecimento de agentes distribuidores com práticas não conformes e que acabam até inviabilizando a venda desse combustível. “As distribuidoras emergentes representam 39% do mercado de hidratado”, afirmou.
Lado financeiro
“Apesar de acharmos que a pior fase já passou, a fotografia de deteorização brasileira ainda é muito ruim”, afirmou Manoel Pereira Queiroz, gerente sênior de Relacionamento do Rabobank, em painel coordenado por Claudio Miori, analista do Fitch Ratings. Ele ressaltou que mesmo com boas perspectivas de preço, existe baixa liquidez no mercado de crédito.
“O setor será obrigado, mais ainda que no passado recente, a financiar suas atividades com taxas “de mercado”, compondo, caso a caso, um mix entre dívida em reais e dívida em moeda estrangeira”, explicou o representante do Rabobank. Sobre novas aquisições, Queiroz frisou que já começaram a ver o movimento de players externos interessados em adquirir ativos no Brasil. “Acreditamos que comecem algumas fusões e aquisições nos próximos anos”, disse.
Para Cyrille Brunotte, superintendente executivo de Agronegócios do Bradesco BBI, o setor está finalmente apresentando sinais de recuperação, mas apesar das perspectivas de melhora do segmento, o ciclo de crédito ainda está “muito machucado” e os efeitos de melhoria do ciclo de crédito devem começar a aparecer apenas na safra 2017- 2018. “A discrepância de políticas e tributações entre os Estados não ajuda, o Brasil precisa trocar as emissões de CO2 por etanol para cumprir os compromissos assumidos em Paris”, ressaltou, lembrando que há interesses nas usinas, mas existem ainda mais discordâncias sobre a venda. “Nas negociações de aquisição, a diferença entre o preço pedido e o preço oferecido é muito grande. A busca dos compradores é por ativos bons e não por cachorros doentes”, afirmou.
Carlos Eduardo Cavalcanti, chefe do Departamento de Biocombustíveis do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), reforçou que as empresas tiveram que fazer escolhas dramáticas entre pagar dívidas ou renovar a lavoura e isso provocou o envelhecimento do canavial. “A prioridade continua sendo a redução dos níveis de alavancagem, com poucos e seletivos investimentos em expansão e foco na eficiência de processos”, disse.
De acordo com Alexandre Figliolino, sócio da MB Agro, após um período longo de crise motivado por preços pouco remuneradores e custos em alta, a situação atual é complexa, com um número grande de empresas em situação financeira ruim, com alta alavancagem e desestruturadas
do ponto de vista operacional. O consultor alertou também que a insegurança em relação ao futuro do etanol hidratado e à cogeração de biomassa, aliado às atuais condições político-econômica brasileira e, a um quadro de crédito extremamente escasso pode atenuar este potencial ciclo de crescimento. “O movimento de entrada de novos players estratégicos pode acontecer em escala reduzida”, finalizou
Etanol 2G
O desenvolvimento do etanol celulósico em larga escala foi tema de debate entre representantes das três unidades instaladas no Brasil: Antonio Alberto Stucchi, diretor executivo da Raízen, Alan Hiltner, VP de negócios da Granbio e Viler Janeiro, diretor de negócios do CTC, e contou com moderação do diretor do CTBE (Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol), Paulo Mazzafera. Os palestrantes relataram as dificuldades das diversas etapas para a produção do 2G, mas deixaram claro que apostam na produção do biocombustível gerado a partir da palha e bagaço da cana-de-açúcar.
“Olhamos o futuro do etanol 2G com confiança, faz parte do pioneirismo arcar com certo ônus”, disse Hiltner, assegurando que cerca de 10 bilhões de litros de etanol estão jogados no chão sob a forma de palha de cana. A Bioflex 1, unidade industrial da GranBio, foi a primeira fábrica de etanol celulósico em escala comercial do Hemisfério Sul. Instalada em São Miguel dos Campos-AL, a unidade, com capacidade para produzir 82 milhões de litros do biocombustível por ano, entrou em operação em setembro de 2014, mas a produção está temporariamente paralisada. “Acredito que o E2G não compete com a cogeração, considerando o volume de matéria-prima desperdiçada, há potencial para que as usinas façam as duas coisas”, conclui.
Stucchi discorda. “O E2G é competidor de cogeração, a decisão do que produzir fica sob o crivo da estratégica das companhias. O mais adequado para aproveitar a palha de cana seria investir em energia, mas não temos preço e condições”, afirma ele, apresentando informações sobre a planta da Raízen, inaugurada em julho de 2015, ao lado da Usina Costa Pinto, em Piracicaba-SP.
Com capacidade de produzir 42 milhões de litros por ano, a unidade custou R$ 230 milhões. “Estávamos muito confiantes e fomos um pouco arrogantes em relação à terra no bagaço, que causa um efeito devastador nos equipamentos. Esse desgaste foi o principal responsável pelos resultados abaixo do esperado no ano passado”, afirmou.
Os desafios para o etanol celulósico deslanchar também foram pontuados por janeiro, do CTC, já que o condicionamento e o tratamento da biomassa ainda são um desafio, pois a tecnologia precisa ser desenvolvida em múltiplas etapas, o que equivale a um maior risco. “Já é consenso que existe uma previsão de gap de combustíveis do Ciclo Otto. O etanol celulósico é uma possibilidade com timing mais viável que greeenfiels ou novos investimentos para atender a esta demanda”, afirmou. O CTC possui uma planta com capacidade de 3 milhões de litros por ano, anexa à Usina São Manoel, com capacidade de três milhões litros/ano, funcionando em escala demonstrativa.
Cana-energia
“Evolução e perspectivas para a cana-energia: uma visão técnica e mercadológica” foi o tema da última palestra da conferência e contou com apresentação conjunta dos sócios da Vignis, Luís Claudio Rubio, presidente, e Sizuo Matsuoka, diretor. Criada em 2003, a Vignis é fruto da CanaVialis, uma empresa especializada no desenvolvimento de cana-energia.
“A cana-energia é um bebê que precisa ser cuidado e desenvolvido, por isso adotamos um modelo de negócio em que assumimos os riscos de plantar as nossas variedades de cana, do plantio, à colheita, e entregamos na esteira”, conta Rubio, explicando que a máquina convencional não está preparada para colher quase 200 toneladas por hectares, por isso, é preciso adaptações no maquinário.
Segundo Matsuoka, a cana-energia produz muito mais açúcar e celulose por hectare, apresentando aumento de produtividade com o passar do tempo. A renovação dos canaviais como conhecemos hoje não seria necessária com ela. “O setor estabeleceu que a cana não podia ter mais de 12% de fibra. Essa é uma trava que segurou a produtividade do setor por muito tempo”, diz, afirmando que é preciso haver uma mudança de paradigma.
De acordo com números da Vignis, se toda lavoura utilizada destinada ao etanol fosse substituída por cana-energia, haveria um incremento de 232% na produção do biocombustível e de 1.200% na geração de energia elétrica.
Segundo os palestrantes, o Grupo Raízen, dono de 24 usinas no Brasil, é um dos clientes da empresa, e vem trabalhando em um projeto piloto para testar a nova variedade, na unidade Bom Retiro (Capivari-SP). Parada desde 2015, a usina deverá voltar à ativa em 2017, sendo abastecida pela cana-energia.
Para Almir Torcato, gestor corporativo da Canaoeste, a participação na conferência foi muito importante, pois oferece uma visão geral sobre a posição de consultorias, bancos nacionais e estrangeiros, além de empresas, em relação ao setor sucroenergético. "Os desafios que o segmento terá pela frente, como também as perspectivas, foram apontados aqui e, embora tenha variação, o consenso é que tenha déficit mundial de açúcar tornando o cenário positivo neste e no próximo ano, talvez até no seguinte, pontuando grande demanda para o segmento", disse o executivo, ressaltando que os dados deverão ser disseminados nas próximas reuniões técnicas da associação.