Mosca-dos-estábulos, um inseto que vem causando polêmica

29/08/2016 Agricultura POR: Fernanda Clariano, Revista Canavieiros, edição 122
Conhecida popularmente por mosca-dos-estábulos, a Stomoxys calcitrans, atualmente vem causando polêmica. O inseto é responsável por causar prejuízos de grande impacto econômico nos setores pecuário e sucroenergético em alguns estados do Brasil e tem mobilizado usinas e produtores de cana.
Para contribuir com a difusão de conhecimento sobre essa praga, a Revista Canavieiros entrevistou a especialista em moscas-dos-estábulos, Taciany Ferreira Dominghetti, que desenvolve seu doutorado pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul em parceria com a Embrapa Gado de Corte e nesta edição explica a origem desse inseto, como ele se reproduz, as formas de prevenção e os prejuízos que ele pode causar. Confira!
Revista Canavieiros: O que é a mosca-dos-estábulos?
Taciany: A mosca-dos-estábulos é um inseto de hábito hematófago, ou seja, precisa se alimentar de sangue para sobreviver e reproduzir. Sem especificidade por hospedeiros, os quais incluem animais silvestres, domésticos e humanos. Essa mosca se adapta facilmente ao ambiente, estando presente não somente no Brasil, mas em várias partes do mundo.
Revista Canavieiros: Quando a mosca-dos-estábulos passou a ter evidência no Brasil?
Taciany: O primeiro registro sobre a ocorrência de explosões populacionais de S. calcitrans associadas à atividade de usinas de cana-de-açúcar no Brasil remonta à década de 1970. As infestações pela mosca-dos-estábulos ganharam notoriedade a partir de 2008, com registros de surtos em fazendas pecuárias próximas a usinas em São Paulo. Dentre os fatores envolvidos, destacam-se o aumento das unidades produtoras de açúcar e álcool, redução gradativa da queima pré-colheita e utilização da vinhaça como fertilizante nas lavouras canavieiras. Atualmente, grande parte das usinas realizam a colheita mecanizada, que resulta no acúmulo de palha umedecida sobre o solo, criando extensas áreas de matéria orgânica vegetal em fermentação, substrato de desenvolvimento de Stomoxys calcitrans. Essa não é uma praga nova, ela sempre esteve presente nas fazendas pecuárias, no entanto, devido às mudanças no agroecossistema, a mosca-dos-estábulos passou a se desenvolver em larga escala nas proximidades das usinas. Desta forma a população basal de Stomoxys calcitrans, mantida nas fazendas pecuárias no período da entressafra, torna-se a fonte inicial para a primeira geração de moscas que, atraídas às áreas canavieiras, darão origem à sua criação em larga escala. Em seguida, as moscas-dos-estábulos adultas, retornam às fazendas em busca de alimentação em seus hospedeiros, principalmente os bovinos.
Revista Canavieiros: Qual a importância econômica para o setor pecuário e para o setor sucroenergético? 
Taciany: No Brasil, prejuízos anuais causados por esta mosca podem atingir valores superiores a US$ 300 milhões para bovinocultura, representado por danos que chegam a 15% na perda de ganho de peso e até 60% na perda de produção de leite. 
Além dos prejuízos causados ao setor pecuário, também se tem verificado prejuízos diretos e indiretos ao setor sucroenergético. Algumas usinas têm compreendido a participação nesse processo e direcionado onerosos investimentos com ações de manejo dos subprodutos, aquisição de equipamentos e inseticidas. Portanto, em termos de prejuízo econômico, o problema de surtos por mosca-dos-estábulos tem afetado ambos setores produtivos na tentativa de resolver o problema.
Revista Canavieiros: Quais são os locais de reprodução dessa praga e as medidas de prevenção e controle que podem ser tomadas?
Taciany: A mosca-dos-estábulos nas fazendas pecuárias se desenvolve em qualquer local que tem restos alimentares e dejetos animais (fezes e urina). De modo geral, qualquer local na fazenda que tenha matéria orgânica vegetal em fermentação, é um ambiente favorável para o desenvolvimento da mosca-dos-estábulos. Nos estabelecimentos pecuários ao mesmo tempo em que se reproduz, também tem o alimento próximo que são principalmente os bovinos, os equinos e os cães. Nas usinas os substratos oriundos da produção de açúcar e/ou etanol, particularmente a torta de filtro e a palha da cana-de-açúcar misturada à vinhaça, também se mostram ambientes adequados ao desenvolvimento desta mosca. As ações de prevenção e controle, começando pelo estabelecimento pecuário, resumem-se basicamente na higienização das instalações de manejo do gado, principalmente na entressafra. É importante também que se faça a destinação correta deste resíduo, por meio da compostagem. Dessa forma, elimina-se focos de reprodução da mosca-dos-estábulos na fazenda e, consequentemente, redução da população de moscas para serem atraídas para as áreas da usina após o início da safra.
Para as usinas, dentre as ações de prevenção e controle destacam-se:
- Áreas canavieiras fertirrigadas: redução do volume de vinhaça aplicado por hectare, pois a umidade é o fator limitante de desenvolvimento da mosca-dos-estábulos. Aplicando um volume baixo de vinhaça, ela infiltra rapidamente, seca e elimina um possível foco de reprodução de mosca;
- Torta de filtro: A torta de filtro é um local onde a mosca-dos-estábulos também se reproduz em grande quantidade, por isso é interessante que se faça o revolvimento completo da leira para eliminar umidade que fica próximo ao solo que é o local em que consegue se desenvolver;
- Canais abertos: é indicada a impermeabilização, evitando a formação de um gradiente de umidade, que é o local onde haverá a reprodução da mosca-dos-estábulos. Assim, ao término da utilização dos canais, estes deverão ser fechados ou limpos imediatamente, visando evitar possíveis locais de reprodução;
- Poças e vazamentos: é muito comum no funcionamento de uma usina, ocorrer vazamentos nas adutoras e canais, com a formação de poças de vinhaça. Recomenda-se realizar a secagem mecânica, evitando que fiquem expostas por mais de três dias nas áreas canavieiras. A aplicação de calcário para elevar o pH e reduzir a taxa de reprodução da mosca-dos-estábulos tem sido empregada por algumas usinas, no entanto, estudos estão em andamento para comprovar a eficácia desta ação.
Revista Canavieiros: Em termos de pesquisas, quais são os avanços no controle das moscas-dos-estábulos?
Taciany: Hoje, após quatro anos de pesquisa e monitoramento em uma usina, compreendemos de fato o que é o problema e conseguimos entender a dinâmica populacional da mosca envolvendo as fazendas pecuárias próximas às áreas das usinas. Temos informações também sobre o efeito da aspersão de vinhaça na mudança comportamental da mosca.
Estas informações são base para a elaboração do manejo integrado da mosca-dos-estábulos, buscando resultados eficientes. Em relação ao controle biológico e químico, pesquisas também estão sendo desenvolvidas, demandando maior tempo para que sejam implementadas corretamente e, assim, com melhor custo/benefício. Os estudos sobre ações de prevenção e controle estão em andamento, de modo a buscar maior eficiência e menores prejuízos para os dois setores envolvidos. 
Conhecida popularmente por mosca-dos-estábulos, a Stomoxys calcitrans, atualmente vem causando polêmica. O inseto é responsável por causar prejuízos de grande impacto econômico nos setores pecuário e sucroenergético em alguns estados do Brasil e tem mobilizado usinas e produtores de cana.
Para contribuir com a difusão de conhecimento sobre essa praga, a Revista Canavieiros entrevistou a especialista em moscas-dos-estábulos, Taciany Ferreira Dominghetti, que desenvolve seu doutorado pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul em parceria com a Embrapa Gado de Corte e nesta edição explica a origem desse inseto, como ele se reproduz, as formas de prevenção e os prejuízos que ele pode causar. Confira!
Revista Canavieiros: O que é a mosca-dos-estábulos?
Taciany: A mosca-dos-estábulos é um inseto de hábito hematófago, ou seja, precisa se alimentar de sangue para sobreviver e reproduzir. Sem especificidade por hospedeiros, os quais incluem animais silvestres, domésticos e humanos. Essa mosca se adapta facilmente ao ambiente, estando presente não somente no Brasil, mas em várias partes do mundo.

 
Revista Canavieiros: Quando a mosca-dos-estábulos passou a ter evidência no Brasil?
Taciany: O primeiro registro sobre a ocorrência de explosões populacionais de S. calcitrans associadas à atividade de usinas de cana-de-açúcar no Brasil remonta à década de 1970. As infestações pela mosca-dos-estábulos ganharam notoriedade a partir de 2008, com registros de surtos em fazendas pecuárias próximas a usinas em São Paulo. Dentre os fatores envolvidos, destacam-se o aumento das unidades produtoras de açúcar e álcool, redução gradativa da queima pré-colheita e utilização da vinhaça como fertilizante nas lavouras canavieiras.


Atualmente, grande parte das usinas realizam a colheita mecanizada, que resulta no acúmulo de palha umedecida sobre o solo, criando extensas áreas de matéria orgânica vegetal em fermentação, substrato de desenvolvimento de Stomoxys calcitrans. Essa não é uma praga nova, ela sempre esteve presente nas fazendas pecuárias, no entanto, devido às mudanças no agroecossistema, a mosca-dos-estábulos passou a se desenvolver em larga escala nas proximidades das usinas. Desta forma a população basal de Stomoxys calcitrans, mantida nas fazendas pecuárias no período da entressafra, torna-se a fonte inicial para a primeira geração de moscas que, atraídas às áreas canavieiras, darão origem à sua criação em larga escala. Em seguida, as moscas-dos-estábulos adultas, retornam às fazendas em busca de alimentação em seus hospedeiros, principalmente os bovinos.

 
Revista Canavieiros: Qual a importância econômica para o setor pecuário e para o setor sucroenergético? 

Taciany: No Brasil, prejuízos anuais causados por esta mosca podem atingir valores superiores a US$ 300 milhões para bovinocultura, representado por danos que chegam a 15% na perda de ganho de peso e até 60% na perda de produção de leite. 
Além dos prejuízos causados ao setor pecuário, também se tem verificado prejuízos diretos e indiretos ao setor sucroenergético. Algumas usinas têm compreendido a participação nesse processo e direcionado onerosos investimentos com ações de manejo dos subprodutos, aquisição de equipamentos e inseticidas. Portanto, em termos de prejuízo econômico, o problema de surtos por mosca-dos-estábulos tem afetado ambos setores produtivos na tentativa de resolver o problema.

 
Revista Canavieiros: Quais são os locais de reprodução dessa praga e as medidas de prevenção e controle que podem ser tomadas?
Taciany: A mosca-dos-estábulos nas fazendas pecuárias se desenvolve em qualquer local que tem restos alimentares e dejetos animais (fezes e urina). De modo geral, qualquer local na fazenda que tenha matéria orgânica vegetal em fermentação, é um ambiente favorável para o desenvolvimento da mosca-dos-estábulos. Nos estabelecimentos pecuários ao mesmo tempo em que se reproduz, também tem o alimento próximo que são principalmente os bovinos, os equinos e os cães. Nas usinas os substratos oriundos da produção de açúcar e/ou etanol, particularmente a torta de filtro e a palha da cana-de-açúcar misturada à vinhaça, também se mostram ambientes adequados ao desenvolvimento desta mosca.


As ações de prevenção e controle, começando pelo estabelecimento pecuário, resumem-se basicamente na higienização das instalações de manejo do gado, principalmente na entressafra. É importante também que se faça a destinação correta deste resíduo, por meio da compostagem. Dessa forma, elimina-se focos de reprodução da mosca-dos-estábulos na fazenda e, consequentemente, redução da população de moscas para serem atraídas para as áreas da usina após o início da safra.
Para as usinas, dentre as ações de prevenção e controle destacam-se:
- Áreas canavieiras fertirrigadas: redução do volume de vinhaça aplicado por hectare, pois a umidade é o fator limitante de desenvolvimento da mosca-dos-estábulos. Aplicando um volume baixo de vinhaça, ela infiltra rapidamente, seca e elimina um possível foco de reprodução de mosca;
- Torta de filtro: A torta de filtro é um local onde a mosca-dos-estábulos também se reproduz em grande quantidade, por isso é interessante que se faça o revolvimento completo da leira para eliminar umidade que fica próximo ao solo que é o local em que consegue se desenvolver;
- Canais abertos: é indicada a impermeabilização, evitando a formação de um gradiente de umidade, que é o local onde haverá a reprodução da mosca-dos-estábulos. Assim, ao término da utilização dos canais, estes deverão ser fechados ou limpos imediatamente, visando evitar possíveis locais de reprodução;
- Poças e vazamentos: é muito comum no funcionamento de uma usina, ocorrer vazamentos nas adutoras e canais, com a formação de poças de vinhaça. Recomenda-se realizar a secagem mecânica, evitando que fiquem expostas por mais de três dias nas áreas canavieiras. A aplicação de calcário para elevar o pH e reduzir a taxa de reprodução da mosca-dos-estábulos tem sido empregada por algumas usinas, no entanto, estudos estão em andamento para comprovar a eficácia desta ação.

 
Revista Canavieiros: Em termos de pesquisas, quais são os avanços no controle das moscas-dos-estábulos?

Taciany: Hoje, após quatro anos de pesquisa e monitoramento em uma usina, compreendemos de fato o que é o problema e conseguimos entender a dinâmica populacional da mosca envolvendo as fazendas pecuárias próximas às áreas das usinas. Temos informações também sobre o efeito da aspersão de vinhaça na mudança comportamental da mosca.
Estas informações são base para a elaboração do manejo integrado da mosca-dos-estábulos, buscando resultados eficientes. Em relação ao controle biológico e químico, pesquisas também estão sendo desenvolvidas, demandando maior tempo para que sejam implementadas corretamente e, assim, com melhor custo/benefício. Os estudos sobre ações de prevenção e controle estão em andamento, de modo a buscar maior eficiência e menores prejuízos para os dois setores envolvidos.