Descobrir de que forma os microrganismos presentes no solo processam os fertilizantes e os resíduos orgânicos usados no cultivo da cana pode ajudar a mitigar a emissão de gases de efeito estufa e tornar a produção de etanol mais sustentável.
Um conjunto de estudos com esse objetivo foi apresentado pela pesquisadora Eiko Kuramae, do Instituto de Ecologia da Holanda (NIOO-KNAW), durante a terceira edição da Brazilian Bioenergy Science and Technology Conference (BBEST). Organizado no âmbito do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN), o evento foi realizado em Campos do Jordão entre os dias 17 e 19 de outubro.
“Quando a mistura de vinhaça e fertilizantes nitrogenados normalmente usada na cultura da cana é aplicada, as atividades da microbiota do solo são estimuladas e ocorrem transformações, resultando na produção de gases como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e, principalmente, óxido nitroso (N2O), cujo poder de reter calor na atmosfera é 289 vezes maior que o do CO2. Nossa pesquisa busca entender as funções dos microrganismos e determinar os processos envolvidos na emissão de N2O, principalmente, com o objetivo de encontrar meios de intervir”, disse Kuramae.
Como explicou a pesquisadora, a vinhaça é o principal resíduo da produção de etanol. Estima-se que para cada litro de biocombustível sejam produzidos entre 12 e 15 litros desse efluente, que, caso seja descartado incorretamente, pode poluir rios e causar diversos danos ambientais.
Nos últimos anos, a legislação brasileira passou a exigir que a vinhaça produzida nas usinas seja reaproveitada como fertilizante na própria lavoura de cana. Mas, apesar de ser rica em nutrientes, a substância não é capaz de suprir todas as necessidades da planta e precisa ser misturada com fertilizantes inorgânicos à base de nitrogênio.
Em um trabalho realizado durante o doutorado de Késia Lourenço, o grupo mostrou que o simples fato de aplicar separadamente a vinhaça e os fertilizantes nitrogenados em solo de cana coberto com a palha da planta proporciona uma significativa redução na emissão de N2O.
No experimento conduzido em Piracicaba, durante a estação seca, a aplicação de vinhaça concentrada foi feita 30 dias antes do fertilizante nitrogenado no solo de cana com palha. Nesse caso, a emissão de N2O foi 39% menor do que quando se aplicaram as duas substâncias juntas. Experimento semelhante, feito com vinhaça normal (não concentrada), possibilitou uma redução de 27%.
Já em outro teste feito no período de chuva, o grupo aplicou vinhaça normal 30 dias antes do fertilizante nitrogenado e observou uma redução de 49,6% na emissão de N2O.
“Em ambos os experimentos, os processos biológicos envolvidos na emissão de N2O mostraram-se muito complexos. Ocorre nitrificação, realizada principalmente por bactérias, mas também por arqueas [um dos domínios de seres vivos, semelhantes às bactérias morfologicamente mas distintas genética e bioquimicamente]. E também ocorre desnitrificação, promovida por bactérias e também por fungos. Mostramos pela primeira vez que, em cultura de cana em regiões tropicais, quando há a presença de palha no solo combinada com vinhaça e fertilizante nitrogenado, os fungos também contribuem para a emissão de N2O”, comentou a pesquisadora.
Apoio bilateral
A pesquisa contou com apoio da FAPESP e da Organização Holandesa para Pesquisa Científica (NWO) e foi realizada no âmbito de um acordo de cooperação entre as duas instituições.
Uma parte do trabalho foi feita na Holanda, sob supervisão de Kuramae, e outra no Instituto Agronômico (IAC), com orientaçãode Heitor Cantarella.
Ainda sobre o mesmo tema, Kuramae mantém parceria com Janaina do Carmo, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no âmbito de um acordo entre a FAPESP e o Consórcio BE-Basic.
“De modo geral, os estudantes brasileiros têm feito toda a parte experimental de campo no Brasil, nas regiões de Piracicaba e Ribeirão Preto, e a parte de microbioma de solo e bioinformática é realizada no meu laboratório, na Holanda”, contou Kuramae.
Durante o doutorado de Johnny Soares, também sob a orientação de Cantarella e Kuramae, o grupo testou em cultivo de cana o uso de inibidores de nitrificação em solos adubados com nitrogênio, mas sem a presença de palha e vinhaça. O objetivo era diminuir as emissões de N2O.
“Determinamos que, quando não há palha ou vinhaça no solo, o principal processo que ocorre é o de nitrificação causada por bactérias. Decidimos então testar dois compostos capazes de inibir a enzima amônia mono-oxigenase de bactérias que fazem a conversão do nitrogênio do fertilizante em N2O. Além de reduzir em 95% a emissão desse gás, esses compostos não afetaram a diversidade bacteriana do solo”, contou Kuramae.
Os experimentos duraram, ao todo, três anos. Os resultados foram publicados em 2016 na Scientific Reports.
Descobrir de que forma os microrganismos presentes no solo processam os fertilizantes e os resíduos orgânicos usados no cultivo da cana pode ajudar a mitigar a emissão de gases de efeito estufa e tornar a produção de etanol mais sustentável.
Um conjunto de estudos com esse objetivo foi apresentado pela pesquisadora Eiko Kuramae, do Instituto de Ecologia da Holanda (NIOO-KNAW), durante a terceira edição da Brazilian Bioenergy Science and Technology Conference (BBEST). Organizado no âmbito do Programa FAPESP de Pesquisa em Bioenergia (BIOEN), o evento foi realizado em Campos do Jordão entre os dias 17 e 19 de outubro.
“Quando a mistura de vinhaça e fertilizantes nitrogenados normalmente usada na cultura da cana é aplicada, as atividades da microbiota do solo são estimuladas e ocorrem transformações, resultando na produção de gases como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e, principalmente, óxido nitroso (N2O), cujo poder de reter calor na atmosfera é 289 vezes maior que o do CO2. Nossa pesquisa busca entender as funções dos microrganismos e determinar os processos envolvidos na emissão de N2O, principalmente, com o objetivo de encontrar meios de intervir”, disse Kuramae.
Como explicou a pesquisadora, a vinhaça é o principal resíduo da produção de etanol. Estima-se que para cada litro de biocombustível sejam produzidos entre 12 e 15 litros desse efluente, que, caso seja descartado incorretamente, pode poluir rios e causar diversos danos ambientais.
Nos últimos anos, a legislação brasileira passou a exigir que a vinhaça produzida nas usinas seja reaproveitada como fertilizante na própria lavoura de cana. Mas, apesar de ser rica em nutrientes, a substância não é capaz de suprir todas as necessidades da planta e precisa ser misturada com fertilizantes inorgânicos à base de nitrogênio.
Em um trabalho realizado durante o doutorado de Késia Lourenço, o grupo mostrou que o simples fato de aplicar separadamente a vinhaça e os fertilizantes nitrogenados em solo de cana coberto com a palha da planta proporciona uma significativa redução na emissão de N2O.
No experimento conduzido em Piracicaba, durante a estação seca, a aplicação de vinhaça concentrada foi feita 30 dias antes do fertilizante nitrogenado no solo de cana com palha. Nesse caso, a emissão de N2O foi 39% menor do que quando se aplicaram as duas substâncias juntas. Experimento semelhante, feito com vinhaça normal (não concentrada), possibilitou uma redução de 27%.
Já em outro teste feito no período de chuva, o grupo aplicou vinhaça normal 30 dias antes do fertilizante nitrogenado e observou uma redução de 49,6% na emissão de N2O.
“Em ambos os experimentos, os processos biológicos envolvidos na emissão de N2O mostraram-se muito complexos. Ocorre nitrificação, realizada principalmente por bactérias, mas também por arqueas [um dos domínios de seres vivos, semelhantes às bactérias morfologicamente mas distintas genética e bioquimicamente]. E também ocorre desnitrificação, promovida por bactérias e também por fungos. Mostramos pela primeira vez que, em cultura de cana em regiões tropicais, quando há a presença de palha no solo combinada com vinhaça e fertilizante nitrogenado, os fungos também contribuem para a emissão de N2O”, comentou a pesquisadora.
Apoio bilateral
A pesquisa contou com apoio da FAPESP e da Organização Holandesa para Pesquisa Científica (NWO) e foi realizada no âmbito de um acordo de cooperação entre as duas instituições.
Uma parte do trabalho foi feita na Holanda, sob supervisão de Kuramae, e outra no Instituto Agronômico (IAC), com orientaçãode Heitor Cantarella.
Ainda sobre o mesmo tema, Kuramae mantém parceria com Janaina do Carmo, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no âmbito de um acordo entre a FAPESP e o Consórcio BE-Basic.
“De modo geral, os estudantes brasileiros têm feito toda a parte experimental de campo no Brasil, nas regiões de Piracicaba e Ribeirão Preto, e a parte de microbioma de solo e bioinformática é realizada no meu laboratório, na Holanda”, contou Kuramae.
Durante o doutorado de Johnny Soares, também sob a orientação de Cantarella e Kuramae, o grupo testou em cultivo de cana o uso de inibidores de nitrificação em solos adubados com nitrogênio, mas sem a presença de palha e vinhaça. O objetivo era diminuir as emissões de N2O.
“Determinamos que, quando não há palha ou vinhaça no solo, o principal processo que ocorre é o de nitrificação causada por bactérias. Decidimos então testar dois compostos capazes de inibir a enzima amônia mono-oxigenase de bactérias que fazem a conversão do nitrogênio do fertilizante em N2O. Além de reduzir em 95% a emissão desse gás, esses compostos não afetaram a diversidade bacteriana do solo”, contou Kuramae.
Os experimentos duraram, ao todo, três anos. Os resultados foram publicados em 2016 na Scientific Reports.