A Petrobras pode chegar a 2020 com uma dívida ainda pesada para carregar, acima de US$ 100 bilhões, se mantiver o atual Plano de Negócios e Gestão (PNG). Para colocá¬lo em prática, a área técnica da companhia estimou ter de captar US$ 65 bilhões neste e nos próximos quatro anos, sendo R$ 28 bilhões já em 2017.
Os cálculos para o PNG são resultado de estudo realizado pelo corpo técnico da estatal, para dar suporte à diretoria na redução do plano, anunciada em janeiro.
As informações estão na denúncia anônima de funcionários levada ao conselho de administração em 28 de março. O foco da iniciativa foi apontar o que seriam problemas históricos na gestão que não chegavam ao conhecimento dos conselheiros.
O volume de captação projetado levaria a dívida total a US$ 112 bilhões em 2020, no melhor cenário. A estimativa toma como base os vencimentos divulgados para esse período, de US$ 78,7 bilhões. O valor é resultado da diferença entre o que a companhia tem de pagar e o que estima contratar, que equivale a uma redução de US$ 14 bilhões sobre os compromissos atuais.
Esse será o quadro se tudo sair exatamente conforme o planejado para os projetos: orçamentos sem estouros e produções estimadas alcançadas. No final, a Petrobras estará produzindo 2,7 milhões de barris de petróleo ao dia.
Entretanto, o histórico de execução da empresa é diferente e essa é a preocupação apontada ao conselho na denúncia, dado o tamanho do PNG. Os projetos otimistas relatados aos conselheiros teriam potencial de fazer o cenário ser mais oneroso à estatal.
Nos últimos cinco anos, na média, os projetos de exploração e produção atrasaram cinco meses e consumiram investimentos 19% maiores do que o planejado. Quando em operação, a produção atingida ficou 12% aquém do previsto e os custos operacionais superaram em 10% o cálculo inicial.
O PNG é a linha mestra do planejamento de longo prazo da Petrobras e é feito com programação de cinco anos. Para o intervalo de 2015 a 2019, a estatal anunciou em janeiro um corte de 30% do investimento, para US$ 98 bilhões.
Essa revisão, se mantida, equivalerá a investimento de US$ 93 bilhões para o período de 2016 a 2020, conforme os dados encaminhados aos conselheiros. O montante indica que a diretoria escolheu o planejamento mais agressivo entre os estudados para dar base ao ajuste.
Procurada, a Petrobras não respondeu aos questionamentos feitos pela reportagem.
O PNG é acompanhado e reavaliado anualmente. O Valor apurou que a diretoria da Petrobras está debatendo as premissas para os próximos cinco anos. Definido o caminho a seguir, a decisão dos executivos precisa ser submetida ao conselho de administração. A expectativa é que o dado oficial seja anunciado entre o fim de maio e o começo de junho. Modificações significativas de premissas podem afetar diretamente os números.
A revisão de janeiro tomou como base um estudo minucioso dos projetos existentes na companhia. O levantamento foi feito pelo corpo técnico da petroleira, a pedido da diretoria, com objetivo de adequação ao cenário de maior pressão financeira e queda no preço internacional do petróleo.
A dívida bruta da estatal fechou 2015 em US$ 126 bilhões ¬ o equivalente a meio trilhão de reais. O caixa ficou em US$ 26 bilhões. A média da cotação do barril de óleo bruto neste ano está em US$ 36, depois de passar anos próximo dos US$ 100.
Além de pagar as dívidas e os investimentos, a estatal também terá de desembolsar mais US$ 26,3 bilhões nos próximos cinco anos, com os juros da dívida que está contratada ¬ montante que não inclui o custo das novas linhas de crédito que poderão ser tomadas ao longo do período.
A área técnica da Petrobras que realizou o estudo sugeriu um PNG mais modesto do que o adotado pela diretoria e que demandaria US$ 63 bilhões em investimentos até 2020, com necessidade de captação de US$ 43 bilhões.
Com o PNG escolhido, a estatal não terá de cancelar nenhum fornecimento ou compra de materiais já contratados.
Todos os cálculos do estudo consideram que a Petrobras terá sucesso em obter US$ 15 bilhões com a venda de ativos e participações até o fim deste ano. O volume não inclui previsões de novos depósitos judiciais em função de contingências, e nem ganhos de eficiência na geração de caixa.
Em produção, a diferença entre o PNG recomendado pelo corpo técnico e o eleito pela direção só seria percebida em 2020. Na versão mais conservadora, a capacidade ficaria estável a partir de 2019, em 2,4 milhões de barris diários.
Nos próximos anos, a saúde financeira da Petrobras dependerá quase que exclusivamente do quanto conseguir melhorar a geração de caixa. Como a dívida bruta poderá ficar em patamar semelhante ao atual, a estatal terá de ampliar a rentabilidade. Iniciativas para ganhos de eficiência estão em curso, mas ainda não é possível estimar o sucesso na execução.
A carteira de projetos sugerida pelos técnicos continha apenas projetos que acumulassem fluxo de caixa positivo, até 2020. Porém, no PNG escolhido pela direção, há flexibilidade para projetos com fluxos negativos nesse intervalo.
O atual cenário de contração de crédito tem como efeito a concentração dos investimentos da Petrobras em produção e exploração de óleo. Essa área de negócios fica com mais de 80% do orçamento no PNG, tanto na carteira indicada pelo corpo técnico quanto na selecionada pela direção.
Esse percentual está bem acima do praticado na última década pela empresa. A exploração e produção de petróleo chegaram a representar apenas 43% dos investimentos da estatal. O máximo alcançado foi 65%, entre 2006 e 2014.
A Petrobras atingiu a posição de maior investidora do mundo entre as companhias de petróleo. Mas foi a que proporcionalmente menos dedicou a exploração e produção ¬ a despeito de ter sido a única a fazer descobertas relevantes, como o Pré¬Sal, frente a suas reservas estimadas.
A Petrobras encerrou o ano de 2006 com dívida líquida de US$ 8,5 bilhões (US$ 21,7 bilhões de dívida total). Ao fim de 2015, o endividamento líquido da companhia estava em US$ 100,4 bilhões (US$ 126 bilhões no total). A dívida, portanto, foi multiplicada por 5,8 vezes.
A média anual da produção, no mesmo período, saiu de 2,297 milhões de barris ao dia no para 2,597 milhões. Cresceu 13%
Com o elevado volume de investimentos, sem a mesma contrapartida na expansão da produção, a Petrobras passou a depender de captações no mercado de dívidas e de financiamentos em proporções bastante acima da média do setor.
No setor de óleo e gás, é preferível investir com geração própria de caixa ou capital de acionistas. O motivo é justamente o elevado risco de fracasso e a volatilidade no valor do produto. Daí a baixa atividade de captação na média das companhias concorrentes.
Por Graziella Valenti e André Guilherme Vieira
A Petrobras pode chegar a 2020 com uma dívida ainda pesada para carregar, acima de US$ 100 bilhões, se mantiver o atual Plano de Negócios e Gestão (PNG). Para colocá¬lo em prática, a área técnica da companhia estimou ter de captar US$ 65 bilhões neste e nos próximos quatro anos, sendo R$ 28 bilhões já em 2017.
Os cálculos para o PNG são resultado de estudo realizado pelo corpo técnico da estatal, para dar suporte à diretoria na redução do plano, anunciada em janeiro.
As informações estão na denúncia anônima de funcionários levada ao conselho de administração em 28 de março. O foco da iniciativa foi apontar o que seriam problemas históricos na gestão que não chegavam ao conhecimento dos conselheiros.
O volume de captação projetado levaria a dívida total a US$ 112 bilhões em 2020, no melhor cenário. A estimativa toma como base os vencimentos divulgados para esse período, de US$ 78,7 bilhões. O valor é resultado da diferença entre o que a companhia tem de pagar e o que estima contratar, que equivale a uma redução de US$ 14 bilhões sobre os compromissos atuais.
Esse será o quadro se tudo sair exatamente conforme o planejado para os projetos: orçamentos sem estouros e produções estimadas alcançadas. No final, a Petrobras estará produzindo 2,7 milhões de barris de petróleo ao dia.
Entretanto, o histórico de execução da empresa é diferente e essa é a preocupação apontada ao conselho na denúncia, dado o tamanho do PNG. Os projetos otimistas relatados aos conselheiros teriam potencial de fazer o cenário ser mais oneroso à estatal.
Nos últimos cinco anos, na média, os projetos de exploração e produção atrasaram cinco meses e consumiram investimentos 19% maiores do que o planejado. Quando em operação, a produção atingida ficou 12% aquém do previsto e os custos operacionais superaram em 10% o cálculo inicial.
O PNG é a linha mestra do planejamento de longo prazo da Petrobras e é feito com programação de cinco anos. Para o intervalo de 2015 a 2019, a estatal anunciou em janeiro um corte de 30% do investimento, para US$ 98 bilhões.
Essa revisão, se mantida, equivalerá a investimento de US$ 93 bilhões para o período de 2016 a 2020, conforme os dados encaminhados aos conselheiros. O montante indica que a diretoria escolheu o planejamento mais agressivo entre os estudados para dar base ao ajuste.
Procurada, a Petrobras não respondeu aos questionamentos feitos pela reportagem.
O PNG é acompanhado e reavaliado anualmente. O Valor apurou que a diretoria da Petrobras está debatendo as premissas para os próximos cinco anos. Definido o caminho a seguir, a decisão dos executivos precisa ser submetida ao conselho de administração. A expectativa é que o dado oficial seja anunciado entre o fim de maio e o começo de junho. Modificações significativas de premissas podem afetar diretamente os números.
A revisão de janeiro tomou como base um estudo minucioso dos projetos existentes na companhia. O levantamento foi feito pelo corpo técnico da petroleira, a pedido da diretoria, com objetivo de adequação ao cenário de maior pressão financeira e queda no preço internacional do petróleo.
A dívida bruta da estatal fechou 2015 em US$ 126 bilhões ¬ o equivalente a meio trilhão de reais. O caixa ficou em US$ 26 bilhões. A média da cotação do barril de óleo bruto neste ano está em US$ 36, depois de passar anos próximo dos US$ 100.
Além de pagar as dívidas e os investimentos, a estatal também terá de desembolsar mais US$ 26,3 bilhões nos próximos cinco anos, com os juros da dívida que está contratada ¬ montante que não inclui o custo das novas linhas de crédito que poderão ser tomadas ao longo do período.
A área técnica da Petrobras que realizou o estudo sugeriu um PNG mais modesto do que o adotado pela diretoria e que demandaria US$ 63 bilhões em investimentos até 2020, com necessidade de captação de US$ 43 bilhões.
Com o PNG escolhido, a estatal não terá de cancelar nenhum fornecimento ou compra de materiais já contratados.
Todos os cálculos do estudo consideram que a Petrobras terá sucesso em obter US$ 15 bilhões com a venda de ativos e participações até o fim deste ano. O volume não inclui previsões de novos depósitos judiciais em função de contingências, e nem ganhos de eficiência na geração de caixa.
Em produção, a diferença entre o PNG recomendado pelo corpo técnico e o eleito pela direção só seria percebida em 2020. Na versão mais conservadora, a capacidade ficaria estável a partir de 2019, em 2,4 milhões de barris diários.
Nos próximos anos, a saúde financeira da Petrobras dependerá quase que exclusivamente do quanto conseguir melhorar a geração de caixa. Como a dívida bruta poderá ficar em patamar semelhante ao atual, a estatal terá de ampliar a rentabilidade. Iniciativas para ganhos de eficiência estão em curso, mas ainda não é possível estimar o sucesso na execução.
A carteira de projetos sugerida pelos técnicos continha apenas projetos que acumulassem fluxo de caixa positivo, até 2020. Porém, no PNG escolhido pela direção, há flexibilidade para projetos com fluxos negativos nesse intervalo.
O atual cenário de contração de crédito tem como efeito a concentração dos investimentos da Petrobras em produção e exploração de óleo. Essa área de negócios fica com mais de 80% do orçamento no PNG, tanto na carteira indicada pelo corpo técnico quanto na selecionada pela direção.
Esse percentual está bem acima do praticado na última década pela empresa. A exploração e produção de petróleo chegaram a representar apenas 43% dos investimentos da estatal. O máximo alcançado foi 65%, entre 2006 e 2014.
A Petrobras atingiu a posição de maior investidora do mundo entre as companhias de petróleo. Mas foi a que proporcionalmente menos dedicou a exploração e produção ¬ a despeito de ter sido a única a fazer descobertas relevantes, como o Pré¬Sal, frente a suas reservas estimadas.
A Petrobras encerrou o ano de 2006 com dívida líquida de US$ 8,5 bilhões (US$ 21,7 bilhões de dívida total). Ao fim de 2015, o endividamento líquido da companhia estava em US$ 100,4 bilhões (US$ 126 bilhões no total). A dívida, portanto, foi multiplicada por 5,8 vezes.
A média anual da produção, no mesmo período, saiu de 2,297 milhões de barris ao dia no para 2,597 milhões. Cresceu 13%
Com o elevado volume de investimentos, sem a mesma contrapartida na expansão da produção, a Petrobras passou a depender de captações no mercado de dívidas e de financiamentos em proporções bastante acima da média do setor.
No setor de óleo e gás, é preferível investir com geração própria de caixa ou capital de acionistas. O motivo é justamente o elevado risco de fracasso e a volatilidade no valor do produto. Daí a baixa atividade de captação na média das companhias concorrentes.
Por Graziella Valenti e André Guilherme Vieira