Precisão não é sinônimo de complicação

02/04/2020 Cana-de-Açúcar POR: Marino Guerra
Precisão não é sinônimo de complicação

Produtores devem mudar visão de que prática é difícil e cara

A cana-de-açúcar foi a cultura pioneira no uso do piloto automático, uma das principais ferramentas da tão falada e pouco compreendida Agricultura de Precisão.

Infelizmente, o verbo da frase que abre esse texto permanece inalterado até hoje, isso porque com a instalação da principal crise que atravessa o setor desde meados de 2008, a prática acabou perdendo a importância que merece. Muito disso se explica pelo simples fato de que o pessoal precisou dedicar grande parte de sua energia para sobreviver.

Perante essa realidade, a prática de se gerenciar um sistema de produção considerando sua variabilidade espacial e temporal, tirando proveito (econômico e ambiental) dessas desuniformidades (sempre que forem relevantes), ganhou o status de uma roupa cara e chique destinada para poucos produtores abastados, o que é, insistentemente, um grande erro.

Ao participar da 33ª Jornada de Agricultura de Precisão, promovida pelo Laboratório de Agricultura de Precisão da Esalq/USP e liderada pelo professor José Paulo Molin, a reportagem da Revista Canavieiros pode apurar que já é passada a hora de se derrubar esse senso comum  de exclusividade que tanto prejudica a rentabilidade das lavouras de cana-de-açúcar.

E isso aconteceu pois, ao longo do verdadeiro mergulho na matéria (foram oito horas de curso em cinco dias), o curso, já tradicional no meio agrícola brasileiro e que recebeu pela primeira vez um jornalista profissional cuja participação foi integral, transmitiu o conhecimento de técnicas relativamente simples e facilmente adotadas se o produtor tiver um pouco de disposição.

A primeira lição a ser assimilada é de que nem todo lugar necessita do uso de processos variáveis na lavoura, o que significa que a famosa taxa fixa ainda precisa e sempre precisará ser uma alternativa de manejo.

Partindo desse princípio, Molin e o professor convidado, Leandro Gimenez, enfatizaram que antes da tomada de decisão, o produtor deve responder as perguntas da “Árvore de Decisão para Manejo da Variabilidade Espacial” desenvolvidas pelo ACPA (sigla em inglês para Centro de Agricultura de Precisão da Austrália).

Nela, a primeira pergunta já coloca uma pulga gigantesca atrás da orelha de quem produz cana. Existe variabilidade na produtividade?

Nesta resposta, para se ter o máximo de convicção, somente tendo em mãos um mapa de colheita. Aí se chega naquele assunto que é, talvez, uma das maiores lacunas tecnológicas ao se tratar da coleta de dados em cana, a leitura da produtividade, tema que foi aprofundado na entrevista com o professor Molin, presente no início desta edição.

Contudo, há técnicas que podem dar estimativas confiáveis para o produtor escolher entre o caminho do sim ou não. Em caso de resposta negativa, ele cairá na taxa fixa, o que significa que não precisará mexer em sua forma de trabalho.

Agora, em se tratando de uma resposta positiva, ele irá para um segundo questionamento: a variabilidade espacial oscila temporalmente, ou seja, as manchas nos talhões são as mesmas conforme o passar dos anos?

Se sim, cairá num caminho onde precisará avaliar a necessidade de se manejar em tempo real (ou quase), por exemplo, reboleiras de folha larga com a cana grande. Se a avaliação for negativa, será recomendado um trabalho em taxa fixa. Agora, em caso de afirmação, se configurará o fim da linha ou o uso de ferramentas que trabalhem com taxa variável.

Voltando à questão das manchas permanentes, se elas existirem, é necessário caracterizar o problema e pensar em como fazer o manejo antes de adotar qualquer atitude que busque precisão. Caso haja o desconhecimento de alguma das duas últimas questões, o melhor a fazer é a boa e velha barra total.

Não é preciso ser um observador criterioso para saber que a informação de qualidade é de fundamental importância para tomar a decisão correta quanto à melhor forma de se executar o manejo de uma determinada área. Sendo assim, muito antes de conhecer qual drone fará a aplicação localizada ou qual autopropelido possui o sistema de pulverização bico a bico para entrar de maneira correta nessa situação, o produtor terá que trabalhar na composição de um banco de dados confiável. E isso não é nenhum bicho de sete cabeças.