Preços firmes e remuneradores

Agronegócio POR: Edição 173 Novembro 2020

Balanço realizado pela Datagro sinaliza safras positivas

De 26 a 29 de outubro, participantes de 22 países acompanharam, de forma on-line, a 20ª Conferência Internacional Datagro sobre Açúcar e Etanol.

O ex-presidente Michel Temer abriu oficialmente o evento ao destacar que o Brasil quer a expansão dos biocombustíveis em sua matriz energética, que o CBio já está na bolsa e que o país trabalha pela proteção ambiental.

Plínio Nastari, presidente da Datagro, reiterou dizendo que o mundo almeja sustentabilidade e proteção ao meio ambiente. “Vários países procuram copiar o nosso modelo de regulação (RenovaBio) que precifica carbono em condições de mercado e internaliza o preço da energia em externalidade ambiental. Isso é desenvolvimento econômico, geração de energia e de empregos. Essas ações foram realizadas no governo Temer como um marco divisor de águas nessa área. Muitas pessoas ainda não compreenderam o que foi aprovado em seu governo”, devolveu Nastari ao ex-presidente Michel Temer.

O ex-presidente Michel Temer abriu a 20ª Conferência Internacional Datagro sobre Açúcar e Etanol

O painel “Segurança energética e desenvolvimento sustentável” contou com a participação do vice-presidente da República, Antônio Hamilton Mourão, e o presidente da Maubisa, Maurílio Biagi Filho.

O executivo destacou que o desenvolvimento sustentável do agro brasileiro incomoda muita gente. “Não podemos ser vítimas de nossa eficiência. Mais de 60% de nossas matas nativas continuam preservadas e apenas 8% de nosso território são ocupados pela agricultura. Todo o nosso crescimento é na base da produtividade que vem do aprimoramento tecnológico, é isso que incomoda. Olhando para o lado social, os preços dos alimentos tiveram queda real de 5% a.a ao longo de 40 anos. O país tem lições a dar em energia, já que as fontes renováveis representam 83% de nossa matriz energética. O nosso código florestal é a mais complexa lei ambiental no mundo. Pena que esses dados se perdem na retórica”, argumentou.

Biagi Filho destacou que o desenvolvimento sustentável do agro brasileiro incomoda muita gente

Mourão, que também é presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal, salientou que o modelo de expansão econômica e o modo de vida moderno são altamente dependentes de insumos energéticos, desenvolvimento e crescentes expectativas de consumo. “Apesar de toda a euforia com a crescente onda de desenvolvimento energético, é importante criar condições que promovam investimento, sustentabilidade e produtividade. Desafiador é produzir comida para uma população crescente, com mudanças climáticas e sustentabilidade. O agro brasileiro ocupa posição de destaque internacional e o Estado brasileiro reconhece maior empenho para as demandas de desenvolvimento com sustentabilidade, qualidade de vida e oportunidades crescentes de consumo”, pontuou.

O vice-presidente, Antônio Hamilton Mourão, participou do painel “Segurança energética e desenvolvimento sustentável”

Oferta e demanda de açúcar e etanol no Brasil nas safras 20/21 e 21/22

Um dos painéis mais esperados da conferência - Perspectivas de produção e balanço de oferta e demanda de açúcar e etanol no Brasil nas safras 20/21 e 21/22 -, foi moderado por Mário Campos Filho, presidente do Siamig, com apresentações de Nastari.

Campos mencionou que a safra 20/21 foi desafiadora para todos. “Tivemos e ainda estamos convivendo com a pandemia, o que é um desafio para todas as empresas do setor. Somos grandes empregadores e precisamos sempre cuidar de nossos colaboradores. Conseguimos isso com grande sucesso, mas tivemos que trabalhar de maneira muito forte nos últimos meses. No início tivemos um susto e, felizmente, vimos uma recuperação interessante do setor e isso se deve à nossa resiliência e ao nosso trabalho em um setor que movimenta boa parte da economia nacional, especialmente em alguns Estados produtores”.

Segundo Campos Filho, a safra 20/21 foi desafiadora para todos

Ao comentar que toda safra é diferente, Nastari disse que o resumo da safra 20/21, pelo menos na perspectiva do produtor brasileiro, é de uma situação em que se encontrava no céu nos meses de janeiro e fevereiro. Rapidamente ele caminhou para o inferno em março e abril com a notícia da pandemia, perspectiva de queda abrupta no consumo de etanol no mercado interno, queda do preço do petróleo, da gasolina e do etanol.

“Dessa situação de inferno, o produtor caminhou para o paraíso a partir de junho, e encontra-se hoje nessa situação, com preços muito interessantes tanto para o açúcar quanto para o etanol, permitindo inclusive a realização de precificação futura para até duas safras à frente em condições muito favoráveis”, afirmou.

Um dos fatores mais importantes para esse processo foi o movimento de câmbio, com a desvalorização do real e as incertezas em relação ao desempenho da economia brasileira, o aumento de endividamento, a percepção de risco e a saída de capital estrangeiro do país.

Outro movimento importante que ocorre neste contexto é a posição especulativa de fundos que aumentaram significativamente a posição de entrada líquida. “Na posição divulgada em 20 de outubro, por exemplo, os fundos especuladores acumulavam uma posição líquida de mais de 252 mil lotes comprados. Os fundos concentraram as suas apostas exatamente no mercado de açúcar, dando sustentação aos preços no mercado internacional”, explica Nastari.

Olhando para o contexto do preço do açúcar, o valor em Nova York, em cents por libra peso que chegou a ficar abaixo de 12 centavos, gradualmente foi subindo. No primeiro futuro, que é março de 2021, está cotado na faixa de 14,8 cents por libra peso com o câmbio desvalorizado, resultando num preço de açúcar, em reais e em termos nominais, recorde.

Em relação ao etanol, Nastari lembrou que na segunda-feira negra (20 de abril), o petróleo foi cotado em menos de US$ 41,27 o barril, o que levou o preço da gasolina, nos EUA, abaixo de US$ 0,40/galão. “Esse preço foi transmitido para o mercado interno brasileiro pela Petrobras através da redução dos preços da gasolina na refinaria. A partir deste fundo do poço, no final de abril e começo de maio, o preço ao produtor, de etanol hidratado e anidro, sobe, tendo uma trajetória ascendente. O valor do hidratado, livre de impostos, em São Paulo, já supera R$ 2,05/l e o preço do anidro já supera R$ 2,39/l, ou seja, valores muito maiores do que os negociados há um ano para o produtor”, contabiliza.

No entanto, os preços mais remuneradores inicialmente fizeram com que o produtor desviasse o mix de produção fortemente para a direção do açúcar. Enquanto nas duas últimas safras, somadas, o Brasil retirou do mercado mundial 19 milhões de toneladas de açúcar, em 2020 o país devolveu ao mercado mundial 12 milhões de toneladas, que foram muito bem-vindas e necessárias para o abastecimento por conta das quebras de safra na Tailândia, Índia, União Europeia e Rússia. Com isso, os embarques de exportação foram muito vigorosos, crescendo de janeiro a setembro quase 69% em relação ao mesmo período do ano passado.

“Outro dado que precisamos levar em conta nessa remuneração relativa entre açúcar e etanol é o valor do CBio. A partir de outubro, no cálculo de preço de equivalência, a Datagro levou em conta não só o preço ao produtor, mas o valor do CBio e a contribuição desse crédito para a remuneração ao produtor de etanol anidro e hidratado. O CBio está chegando a R$ 60/t de carbono equivalente, o que resulta numa contribuição que varia de R$ 55 a R$ 58/m3 para hidratado e anidro, respectivamente”, analisa Nastari.

Durante a sua apresentação, Nastari comentou que a Datagro prevê três safras consecutivas com preços remuneradores para o produtor brasileiro

Mesmo com a recuperação do preço do etanol e do CBio no cálculo de remuneração do etanol, a melhoria do prêmio do açúcar é expressiva, permanecendo mais interessante durante a safra 20/21.

Em função da avaliação agronômica, econômica e climática, a Datagro mantém como estimativa para a safra 20/21, na região Centro-Sul, uma moagem de 596 milhões de toneladas de cana, uma produção de açúcar de 38 milhões de toneladas, oferta de ATR recorde, rendimento em quilos de ATR/t de cana de 144 acumulados até o final da safra, produção de etanol em queda para etanol total e só de cana, com redução, em termos acumulados, de 4 bilhões de litros em relação ao observado no ano passado.

“No Brasil, incluindo a região Norte/Nordeste, prevemos uma produção de açúcar que ultrapassa 41 milhões de toneladas, e a produção de etanol ficará abaixo dos níveis observados em 19/20. Teremos um mix mais açucareiro, refletindo a situação de mercado”, adianta Nastari.

Para a safra 21/22, a consultoria tem como primeira estimativa uma moagem de cana de 575 milhões de toneladas de cana e uma produção, na região Centro-Sul, de 36 milhões de toneladas de açúcar. A produção de etanol total, em relação à safra 20/21, pode cair 710 milhões de litros. “No entanto, prevemos uma expansão da produção de etanol de milho como cenário base, passando de 2,5 para 3,3 bilhões de litros. Mas com os preços de milho observados, é possível que muitos produtores de etanol de milho não produzam tudo o que pretendem. Então, pode ser que essa redução na produção de etanol total não seja de 710 milhões, mas entre 1 a 1,1 bilhão de litros. O mix de produção será parecido com o que vimos nesta safra 20/21”, avalia Nastari.

A Datagro espera uma entressafra 20/21 mais longa, com preços de etanol que provavelmente devem se manter firmes pelo menos até o final deste período e começo da próxima safra; um mix de produção para 21/22 equivalente ao observado em 20/21, mais orientado para o açúcar; expectativa de rendimento agrícola para o ano que vem menor que o observado este ano por conta do atraso no desenvolvimento fisiológico da cana, do impacto dos incêndios, do menor plantio e da colheita de cana com idade menor.

O valor dos CBios para o final desta safra e também para 2021 tende a ficar em níveis firmes. “Prevê-se ainda a perspectiva de três safras consecutivas (20/21, 21/22 e 22/23) com preços remuneradores para o produtor brasileiro por conta da situação combinada de preço externo e câmbio, mas com custos de produção que devem ser impactados exatamente por este fator, influenciando os valores de adubos, produtos químicos e combustíveis”, finaliza Nastari.