Procuram-se trabalhadores qualificados, adaptáveis e comprometidos

23/03/2018 Geral POR: Revista Canavieiros
Por: Diana Nascimento
 
Segundo informações do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), o setor agropecuário, atrás dos segmentos de comércio e serviços, foi um dos que apresentaram resultado positivo na geração de empregos em 2017.No acumulado do ano, o setor contabilizou um aumento de 37.004 vagas (foram 993.820 contratações e 856.516 demissões). Isso reforça a afirmação de que o agronegócio é responsável pela geração de empregos e participação no cenário econômico do país.
 
De acordo com uma pesquisa da Luft Logistics sobre o agronegócio e a geração de empregos no Brasil e dados do Ministério do Trabalho e do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), há 19 milhões de pessoas ocupadas no segmento, o que corresponde a quase 10% da população brasileira e 37% dos empregos no Brasil. Além disso, todas as regiões brasileiras participam desse contingente, com profissionais que atuam nas diferentes áreas da cadeia produtiva: são 9 milhões de pessoas empregadas no setor primário, 4 milhões na agroindústria e mais de 5 milhões no setor de serviços.
 
Nos estados da região Norte e Nordeste, o segmento primário do agronegócio tem um maior peso na distribuição de postos de trabalho do setor. Por outro lado, para os estados do Centro-Sul, parte relevante dos trabalhadores do agronegócio está nos elos industriais e de serviços vinculados ao setor.
 
Para a consultora organizacional, palestrante e conselheira de carreira, Beatriz Resende, o agronegócio tem perspectivas positivas para 2018. Sob o ponto de vista da economia, tem sido o responsável pelo superávit da balança comercial e é um fator de avanço de uma nova sociedade que se espraia pelo interior do país.
"O saldo líquido de empregos gerados no campo teve em 2017 a maior expansão dos últimos cinco anos. De janeiro a outubro, as contratações superaram as demissões em 93,6 mil vagas, 84% a mais do que o mesmo período de 2016", salienta Beatriz.
 
O setor do agronegócio que mais emprega é o da agricultura familiar, com 11,5 milhões de trabalhadores, o que representa 77% dos empregos no setor agrícola.
 
Atratividade
 
O agronegócio vem crescendo muito nos últimos anos, já que passou a ser a força motora da economia de nosso país. Com isso, o setor tem posição de destaque em várias esferas como processos mecanizados, avanços em tecnologia, evolução da gestão, mudanças culturais e maior investimento em capacitação de pessoas e lideranças. "A relação de trabalho entre as empresas do agro e o mercado ficou mais profissional. Ficou mais fácil de trabalhar, não somente por causa de recursos novos e tecnologias avançadas, mas também pela melhoria do perfil da liderança desse segmento; políticas mais adequadas e atrativas de gestão de pessoas; ambientes de trabalho mais colaborativos e construtivos; recursos humanos mais evoluídos em suas práticas, e as pessoas também mais capacitadas e com conhecimento de causa para olharem para si e para o que é esperado delas", detalha Beatriz.
 
Por outro lado, há alguns anos, e em algumas instâncias isso ainda se mantém, os profissionais do agronegócio recebiam salários maiores do que os de outros segmentos. "Isto foi uma realidade pelo menos até antes do ápice da crise, especialmente nos cargos especialistas e de gestão", observa a consultora ao dizer que estivemos no patamar de empresas que pagavam bem, especialmente as usinas de açúcar e etanol e outras maiores do agronegócio. No entanto, os salários, para quem sobreviveu à crise nessas empresas, não estão ruins.
 
De acordo com Marcelo Botelho, gerente da Michael Page para o setor Agro, o segmento tem se tornado cada vez mais atrativo provocando a migração de profissionais de outros setores para atuar no campo. "Cada vez mais eles encontram no setor um terreno fértil para seu crescimento profissional e os salários também estão cada vez mais competitivos, principalmente nas posições de gestão", ressalta.
 
Ele comenta que algumas funções gerenciais, como gerentes de fazenda, podem oferecer salários entre R$ 10 mil a R$ 25 mil, para coordenadores técnicos (irrigação, tratos culturais, qualidade, corte/transbordo e transporte) a remuneração varia entre R$ 6 mil a R$ 12 mil, para controllers entre R$ 12 mil a R$ 16 mil e para coordenadores e gerentes comerciais a remuneração é entre R$ 7 mil e R$ 12 mil mais variável.
 
O agronegócio não movimenta apenas riqueza e renda, mas oportunidades, aplicação de conceitos e ferramentas atuais na sua gestão. E pelo peso dado aos que trabalham neste segmento, a perspectiva de um profissional de mercado crescer e ter espaços em uma área promissora como esta passa a ser grande.
 
A consultora observa que nas empresas menores do agro como as fazendas, por exemplo, existe uma característica que vem mudando. Era muito comum ver as gerações que cresciam dentro das fazendas, morando nelas pelo trabalho dos pais,continuarem a trabalhar ali mesmo, construindo família e assim por diante. Hoje, a nova geração de filhos de pais que vivem no campo, a trabalho para outros, não queremseguir a mesma profissão do pai e buscam outros atrativos na cidade. Diante deste cenário, esses lugares terão que ficar mais atrativos para buscar e reter profissionais mais novos, já que boa parte dessas fazendas ainda conta com um contingente antigo de profissionais que lá está há anos para funções mais operacionais, ou seja, aquelas da “lida” diária.
 
"Mas para funções de maior peso dentro das fazendas como os administradores ou gestores, por exemplo,são procurados profissionais com formação em agronomia - atividades estas que ainda serão atrativas para serem ocupadas por pessoas de dentro ou fora do negócio", salienta Beatriz.
 
"O agronegócio vem se tornando cada vez mais representativo ano a ano na economia brasileira. É um ambiente, em linhas gerais, ainda muito imaturo e que sofre um movimento acelerado de profissionalização, o que permite que os profissionais qualificados e bem ambientados aos aspectos peculiares do setor consigam maior visibilidade e aceleração em suas carreiras", resume Botelho.
 
Profissionalização e qualificação
 
Segundo informações da empresa Michael Page, as empresas do agronegócio investiram na contratação de profissionais mais experientes e qualificados.Houve oaumento de 25% na contratação de trabalhadores com perfil técnico e de gestão no ano passado frente a 2016.
 
Os cargos mais demandados no ano passado foram direcionados às áreas de operações, finanças e vendas. As contratações para a área de operações representaram 50%, seguida por finanças (30%) e vendas (20%).
 
De acordo com Botelho, essa demanda foi impulsionada por companhias que buscam expandir seus processos. “Há um movimento de profissionalização de grandes grupos desse segmento e uma crescente necessidade de contratar gestores para posições estratégicas. Serão essas pessoas as responsáveis pela nova fase que essas empresas estão optando, seja para estruturação de processos, ampliação de mercado ou internacionalização da operação. É um movimento crescente e recente e que não deve parar mais. Estamos otimistas com esse setor em 2018”, conta.
O perfil mais frequente de profissionais que as empresas têm buscado no mercado é de executivos com capacidade de dialogar, de construir um legado, além de uma formação técnica apurada, preferencialmente ancorada em universidades de referência. MBA e segundo idioma também são diferenciais buscados nessas pessoas.
 
Em relação à qualificação, Botelho ressalta que o nível desta característica nos empregos tem aumentado em todas as esferas. "As atividades no campo têm sido cada vez mais impactadas pela tecnologia, o que demanda a adequação dos profissionais para essas mudanças e para os cargos gerenciais. Além das inovações tecnológicas as quais estão submetidos, são cada vez mais cobrados a buscarem qualificação, seja na forma de formação técnica para que conquiste o respeito e a confiança dos seus liderados, como também por trazer novas práticas de gestão visando ao desenvolvimento e a capacitação das equipes de trabalho", afirma.
 
Na visão de Beatriz, a qualificação aumentou muito em todos os níveis, com maior acentuação para o nível técnico, até porque algumas ações no segmento alavancaram a oportunidade para muito profissionais que não tinham formação completa em participar de programas realizados em parceria com entidades do setor e o Governo para a obtenção de maior qualificação. "Considero que o estímulo para mudar a cultura de que profissionais do agro tem pouca formação foi de impacto geral. Em todos os níveis da cadeia hierárquica de uma empresa, vimos pessoas buscando melhorar sua formação, com um estímulo grande por parte das empresas, diga-se de passagem, o que foi de extrema importância para o agronegócio."
 
Beatriz destaca ainda o crescimento de qualificação na área agrícola e automotivado agronegócio, o que é algo muito aparente e destoante, pois essas áreas empregavam profissionais com qualificação mais baixa. "A mecanização trouxe, naturalmente, uma necessidade de maior qualificação dos profissionais antes chamados de rurais, que passaram a exercer funções que requerem mais conhecimento, tanto na prática agrária como na operação dos equipamentos", pontua.
 
Importante mencionar que a tecnologia e a tecnificação exigidas no campo podem afetar alguns trabalhadores, pois é um ambiente que, assim como todos os outros, vem sendo fortemente impactado pela tecnologia. Diante disso, Botelho afirma que os profissionais precisam saber responder rápido a essas mudanças, senão correm o risco de ficarem obsoletos e perderem espaço nesse mercado que tende a ficar ainda mais competitivo nos próximos anos.
 
Na verdade, esse impacto já está acontecendo. Pode-se dizer que começou com o advento da mecanização seguido por outros movimentos como a agricultura de precisão, a automação industrial, a gestão dos custos, os certificados de qualidade e segurança, a utilização de tecnologias avançadas, a mensuração de resultados e outros que trouxeram uma demanda necessária de atualização em diversos níveis.
"Temos ouvido falar que os processos de trabalho em todos os setores, da forma que hoje estão, serão substituídos por robôs/máquinas e esta é uma mudança natural. Em compensação, novos trabalhos e especializações surgirão. No entanto, podemos dizer que não haverá muitos espaços, daqui em diante, para profissionais com baixíssima qualificação. Cada vez mais a pirâmide estará encorpada em uma base de profissionais com conhecimentos técnicos e de gestão para apoiar o negócio a ter os resultados esperados e com os recursos atuais acessíveis", pondera Beatriz.
 
Habilidades e competências
 
O agronegócio, até mesmo por sua evolução, precisa de profissionais com competências antes atribuídas somente para setores mais avançados. Entre as habilidades e competências esperadas de um profissional interessado em trabalhar não somente no agronegócio, mas em qualquer área, Beatriz elenca:
- Maturidade pessoal e profissional;
- Posturas éticas;
- Educação e diplomacia no trato;
- Tratamento mais humano com as pessoas;
- Ser um agente de relacionamentos construtivos;
- Senso de parceria;
- Interesse e disposição;
- Não acomodação;
- Arrojo;
- Otimismo e entusiasmo;
- Comprometimento e envolvimento;
- Postura de dono;
- Resiliência;
- Liderança pelo exemplo;
- Comunicação fluida e transparente;
- Autogestão de si e do seu papel como colaborador;
- Senso de questionamento para mudança;
- Adaptativo e versátil.
 
"Os maiores gaps profissionais estão nos quesitos comportamentais. Vemos que a incorporação de novos métodos de trabalho e tecnologias é logo aceita e incorporada, tendo o tempo da capacitação e implantação, mas ainda vemos posturas do tempo dos engenhos nesses ambientes", confessa a consultora.
 
"Forte perfil de liderança e capacidade de motivar as pessoas são características fundamentais para um gestor no agronegócio, dado que muitas vezes eles lidam com grandes equipes 'da porteira para dentro'. Outras habilidades interessantes são a capacidade de negociação, perfil analítico, profundidade técnica e flexibilidade para atuar em um ambiente dinâmico", completa Botelho.
 
Amadurecimento e propósitos comuns
 
Beatriz avalia que tem visto um novo agronegócio se despontar. "Pequenas e médias empresas desse setor estão buscando a sua expansão na gestão. Estão querendo fazer melhor, gerir melhor, olhar mais para as pessoas que têm em seu quadro; se destacarem não só por volumes, mas por qualidade. Isso é muito bom", comemora.
 
Para ela, as perspectivas para 2018 são boas no que tange à melhoria dos perfis das lideranças desse setor, do padrão das relações de trabalho, da interação entre os colaboradores e da maior preocupação dos donos/empresários com o bem-estar do seu capital humano.
 
"Criando essas perspectivas boas, essas empresas passam a ficar mais atrativas para que as pessoas tenham vontade de estar nelas, pelo propósito comum, e não somente por um bom emprego e por uma estabilidade. O agronegócio tem muito a amadurecer no seu aspecto empresarial, mas o mais necessário é mudar a qualidade das relações, das interações e das parcerias, especialmente internas", sugere.
 
Reflexos também no setor sucroenergético
 
O setor sucroenergético emprega no país algo próximo a 1 milhão de pessoas diretamente e 3,5 milhões de pessoas indiretamente. Deste1 milhão, 65% estão concentradas na área agrícola, 25% na indústria e 10% na administração segundo José Darciso Rui, diretor executivo do Gerhai (Grupo de Estudos em Recursos Humanos na Agroindústria).
 
A qualidade dos empregos no setor canavieiro já foi melhor, analisa. "A crise financeira que se instalou no Brasil aliada a crise do setor (em razão de política de preços praticados no passado) influenciou bastante e o setor já não é tão agressivo como na década passada. Hoje, com o fechamento de unidades e muitas ainda em dificuldades financeiras, quedas na produção e até recuperação judicial, o setor está bem mais calmo no que se refere a contratação de profissionais", pontua Rui.
 
Se a contratação esfriou, por outro lado o setor evoluiu muito na qualificação de seus profissionais. "Antigamente o setor não se preocupava muito com essa qualificação e com a qualidade de seus trabalhadores. Com a inserção das ISOs 9001, 14000, 18000 e com as necessidades de melhorias nos processos de gestão, de produção e de manutenção, a evolução qualitativa dos trabalhadores é prioritária nas empresas. Porém, nem sempre os programas de treinamento são cumpridos em sua essência, visto a necessidade financeira e o fato de alguns empresários tratarem esse processo de qualificação como custo e não como investimento", salienta.
 
A tecnologia e atecnificação agrícola também são uma constante nos canaviais. Especialmente nas áreas produtivas da agrícola e na colheita de cana, a tecnologia avança a passos largos a ponto de ano a ano ter novidades nas colhedoras, plantadoras e equipamentos modernos e controlados por sistemas que independem totalmente da atitude humana. "O que precisamos é entender essas questões e colocar ao dispor de nossos trabalhadores a formação profissional adequada para acompanhar essa evolução", defende Rui.
 
Essa qualificação e evolução exigidos têm um preço: os salários pagos pelo setor canavieiro são atrativos e concorrem com as melhores remunerações da economia, tanto nas funções operacionais quanto nas funções de liderança. "No agronegócio, os melhores salários estão dentro do setor sucroenergético", conclui Rui.