Ritmo de crescimento anima setor a buscar mais uma medalha de ouro para o Brasil nas Olimpíadas do fornecimento mundial de alimentos
No mês de março, a Peixe BR (Associação Brasileira de Piscicultura), publicou a edição de 2021 do seu anuário, documento que reúne as principais informações de produção, comerciais e conjunturas que influenciam a atividade.
O documento traz que em 2020 foram produzidas 802 mil toneladas de peixe de cultivo, crescimento de 5,93% em relação ao período anterior, quando se produziu 758 mil toneladas.
Ao fazer o recorte de um período mais longo, pegando informações desde 2014 (primeira vez que o levantamento foi realizado), a evolução foi de 38,75% ou uma média de 6,45% ao ano.
Quanto às espécies, a tilápia é a grande líder, representando seis em cada dez peixes criados no país e com um percentual duas vezes maior em relação ao setor como um todo, registrando 12,5% (486 mil contra 432 mil toneladas).
Os peixes nativos, segundo segmento mais importante, reduziram em 3,2% (278 mil toneladas) fator ocorrido, segundo a associação, pela falta de investimentos nos principais estados produtores, regras ambientais claras em alguns, dificuldade logística e de comercialização (metade da produção fica na região Norte, distante dos grandes centros urbanos).
Essa retração é um efeito que acontece desde o comparativo 17-18, quando a baixa foi de 4,7%, ficando estável no ano seguinte.
Contudo, há uma possibilidade de reversão no cenário em 2021, tendo em vista o último trimestre de 2020, quando houve uma consistente recuperação dos preços pagos ao produtor, o que pode, se a segunda onda da pandemia não atrapalhar, atrair investimentos, inclusive diminuindo a concentração regional, isso porque todos os estados brasileiros têm condições de crescimento em suas operações de peixes nativos.
A tilápia é o carro-chefe da piscicultura nacional
Ainda de maneira tímida, as outras espécies (principalmente truta, carpa e pangasius) também evoluíram na casa dos dois dígitos (10,9%) com destaque para e evolução do “panga” no nordeste, em especial no Maranhão, que com ele conseguiu figurar no Top 5 dos maiores produtores nacionais.
Falando em lideranças estaduais, o Paraná segue líder ampliando em quase 20 mil toneladas sua produção, impulsionado com a alta de 11,5% na tilápia. O material aponta que o círculo virtuoso atingido pelo estado se deve à entrada de grandes cooperativas agropecuárias no setor.
Com um crescimento menor (6,9%), o estado de São Paulo se manteve como segundo principal polo em grande parte pela modernização na regulamentação ambiental nos últimos dois anos, tornando mais seguro investir naquele que é o melhor lugar, sob o ponto de vista logístico, por abrigar o maior número de consumidores do país.
Maior produtor do mundo em duas décadas
O cenário macro pode mascarar um ano que foi demasiadamente complexo. Num breve exercício de memória é fácil recordar que a pandemia se tornou uma realidade para os brasileiros há menos de um mês da semana santa (o natal para quem trabalha com peixes) o que gerou uma queda desenfreada das vendas, ligando o sinal vermelho em todos os elos da cadeia.
A tensão terminou somente no segundo semestre quando a marcha do consumo ganhou um ritmo consistente de modo que as perdas fossem cicatrizadas a ponto de fechar o exercício no azul.
Pensando na conjuntura fora a pandemia, a pressão dos custos de ração foi um fator que impediu o ganho das margens e que, vendo a tendência de preços, principalmente da soja e milho, esse deverá permanecer um ponto tensionado em 2021.
Como tudo está ligado, a explosão da demanda interna e o problema das rações, fez com que pela primeira vez o setor registrasse um crescimento abaixo dos dois dígitos, o que levou a indústria optar por reduzir o volume das exportações na segunda metade do ano.
Assim, as vendas internacionais cresceram 8% em volume (6,6 mil toneladas) e 4,4% em dinheiro (US$ 11,7 milhões), é válido registrar que o resultado positivo monetário foi devido à desvalorização cambial, pois no valor por quilo, em 2019 o preço foi de US$ 1,80, enquanto que nos doze meses posteriores o valor pago médio foi de US$ 1,74.
Ao olhar esses valores se tem um susto, pois o preço do quilo que se paga nos supermercados e peixarias é bem maior, mas analisando a divisão de produtos se vê que mais de 60% do que é enviado ao exterior são óleos, gorduras e subprodutos impróprios para a alimentação, que valem centavos.
O que explica o percentual abaixo de 1% do total produzido e evidencia que as exportações precisam evoluir, tanto na tilápia, que hoje praticamente domina o segmento, mas também com espécies nativas, que com um trabalho de abertura de mercado bem feito, podem agregar valor como representantes gastronômicos da exuberância natural nacional, como é por exemplo o caranguejo real ou até mesmo o famoso bacalhau legítimo do porto.
Quanto aos países compradores, o EUA é disparado o principal mercado consumidor, em 2020 compraram algo em torno de US$ 6 milhões, com elevação de 20% no faturamento. Mas a região do globo que mais aumentou as compras foi a América Andina, em 2019 nossos vizinhos investiram US$ 1,1 milhão, enquanto que em 2020 as compras saltaram para US$ 2,8 milhões, evolução de 138%.
O tambaqui é uma espécie que pode agregar muito valor no mercado internacional por ser nativo da Amazônia
O destaque negativo ficou por conta da China e Japão, que registrou queda de quase 50% no montante comercializado.
A tímida influência internacional mostra que o setor tem um mercado enorme a ser explorado, principalmente se olhar para a virada do século, quando simplesmente não havia exportação e internamente não figurava no quadro nacional das principais proteínas animal.
Ao ler os números dessas duas décadas, principalmente no comparativo com as outras criações mostra uma forte aceleração da piscicultura, para se ter ideia, a pecuária de corte evoluiu 53%, a avicultura 174%, a suinocultura 72%, enquanto que a criação de peixes subiu 400%.
E os dados de consumo mostram o imenso campo interno que há para evoluir. Por ano, um brasileiro come 42 quilos de frango, 30 quilos de boi, 15 quilos de porco e somente quatro quilos de peixe, considerando as questões de melhoria na qualidade de alimentação, somado a uma queda de preço conforme o escalonamento da produção e o aumento na concorrência internacional pela compra dos produtos advindos da pecuária de corte (inflacionando o valor no mercado interno), não é absurdo esperar que a piscicultura atinja no mínimo 25% do prato do brasileiro, ou 15 refeições (almoço ou jantar) por mês.
Para atingir essa realidade, é preciso melhorar diversas condições no ambiente de negócio. Em dezembro, o Governo Federal e o Ministério da Agricultura deram um gigante passo no sentido de tornar a regulamentação mais moderna com a liberação de 73 áreas de águas da união para a atividade.
Estudos apontam que a medida pode multiplicar por cinco a produção nacional de tilápia em uma década, fazendo com que ela atingisse o patamar de 2,5 milhões de toneladas, o que significa 500 mil toneladas a mais em relação ao que a China (líder do ranking) produziu em 2020.
Um breve resumo do potencial nacional está em Tocantins, estado que tem potencial de 500 mil hectares de lâmina de água disponível para a piscicultura e que atualmente somente 1% é utilizado, ou seja, considerando que em 2020 se produziu em torno das 14 mil toneladas, ao aproveitar metade da área, somente lá será dobrada a produção nacional de 2020 da espécie.
Outro exemplo é o de Minas Gerais, que espera avanços na legislação ambiental estadual para poder tornar produtivas as águas de seu mar, principalmente os lagos de Furnas e Peixoto.
Com mercado e área, fica somente a cargo do produtor brasileiro colocar o Brasil na primeira colocação da piscicultura mundial, alguém duvida da sua capacidade?