RenovaBio: a bola já está rolando

23/05/2019 Agronegócio POR: Revista Canavieiros
Por: Marino Guerra
 
A maior notícia no encontro que a Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) promoveu no mês de abril, em Piracicaba, sobre o RenovaBio, foi a de que o programa já está em andamento antes mesmo da finalização de seu processo de implementação, previsto para o final desse ano.

As unidades industriais que deram a largada estão passando pelo processo de certificação do programa. Finalizando essa fase, elas já poderão mandar suas notas ficais de venda de etanol à ANP (com prazo de até 60 dias de sua emissão). Quando tudo estiver certo, leia-se definição das metas individuais das distribuidoras e regulamentação do mercado de CBio, e o programa ativo, os valores desses documentos valerão para a emissão dos certificados.

Perante a fase de definições finais, a curiosidade em saber quanto cada um ganhará aumenta e o desenho de um provável cenário foi o principal tema da apresentação de abertura do evento, quetevecomo palestrante o gerente de Economia e Análise Setorial da Unica, Luciano Rodrigues.

Antes de iniciar, ele alertou que qualquer previsão a respeito do preço de CBio ainda é muito prematura porque inúmeras variáveis influenciarão a precificação do ativo e também pelo fato da regulamentação financeira ainda não estar pronta.

Para acompanhar o raciocínio de Rodrigues, também é necessário ter claro o que já está definido a respeito do CBio. Em primeiro lugar, sua definição no texto da lei diz o seguinte: "instrumento financeiro que representa uma tonelada de carbono e será utilizado para fins de comprovação da meta individual de redução de emissões do distribuidor’’.

Também já estão definidos os principais agentes, sendo os emissores primários os produtores ou importadores de biocombustíveis certificados para solicitar a emissão do CBio, enquanto que a parte obrigada à sua compra se trata de todos os distribuidores de combustíveis que comercializaram fósseis no ano anterior.

Sobre as negociações, o que já se sabe é que as mesmas acontecerão em mercados organizados (bolsa de valores, por exemplo) e a sua compra não será restrita aos distribuidores, ou seja, qualquer agente econômico poderá efetuar a sua aquisição.
No início de sua simulação, o economista mostrou dois exemplos distintos de indução da eficiência energético-ambiental. Para o caso foram definidas duas unidades, uma que emitiu 21g CO2eq/MJ e outra que precisou de 36 g CO2eq/MJ em seu processo de produção de etanol.

Com esses números e para encontrar a nota de eficiência, foi necessário fazer a subtração perante o valor de emissão referente ao combustível fóssil, que é de 87,4 g CO2eq/MJ, gerando um valor de 66,4 g CO2eq/MJ para a mais eficiente e 51,4 g CO2eq/MJ para a que poluiu mais.

Diante desses valores e considerando que cada CBio é igual a uma tonelada de CO2eq retirada da atmosfera, adotou-se como premissa que as duas usinas utilizaram 100% das 2,5 milhões de toneladas de cana para produzir etanol hidratado, o que permitiu a comercialização de 200 milhões de litros ao longo da safra.

Considerando o valor do conteúdo energético do hidratado, 21,34 MJ/L, descobre-se que a planta mais eficiente conseguirá emitir 1CBio a cada 695 litros, atingindo 288 mil CBios no ciclo. A segunda unidade, menos eficiente, precisará de 910 litros para ter um certificado, o que lhe renderá 219 mil CBiosao longo da safra.

Esse cálculo já mostra uma das principais características do programa, a de que não terá nada de mão beijada e ganhará mais quem for mais eficiente. No exemplo citado, a diferença de receita entre as duas empresas foi de 31%.

Baseado em preços internacionais de carbono, Rodrigues simulou para o exercício o preço de US$ 10 por toneladas de CO2 eq, o que gerou uma receita adicional para a planta mais eficiente de R$ 10,6 milhões, enquanto que a outra ganhou R$ 8,6 milhões.
 
A segunda apresentação foi feita pelos integrantes da ANP, Luiz Coelho (coordenador do RenovaBio) e Maria Auxiliadora de Arruda Nobre (coordenadora adjunta do programa). Nela, três assuntos chamaram a atenção e os dois primeiros foram o esclarecimento de dúvidas a respeito do preenchimento da RenovaCalc e o apoio do governo Bolsonaro ao programa (através de declaração do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, apontando a prioridade no segmento de combustíveis renováveis).

O terceiro destaque é sobre os assuntos ainda pendentes para finalizar o processo de implementação, que são a definição da resolução de metas individuais dos distribuidores de combustíveis (questão que deverá ser finalizada até junho); regulamentação sobre a emissão, o vencimento, a distribuição, a intermediação, a custódia, a negociação e demais aspectos relacionados aos CBios, temas que estão em avaliação no ministério de Minas e Energia; novos credenciamentos de firmas inspetoras, sendo que hoje há duas aptas ao serviço e mais duas em processo final, submissão à consulta pública dos dados presentes na RenovaCalc e finalização do processo das primeiras destilarias certificadas.

Para encerrar o evento, o presidente da Abraveri (Associação Brasileira das Empresas de Verificação e Certificação de Inventários de Emissões de Gases de Efeito Estufa e Relatórios Socioambientais), Felipe Bottini, focou na questão dos canaviais elegíveis para entrar no programa. Diante disso, ele fez uma importante constatação em decorrência da impossibilidade de se antecipar informações das canas spot no processo de certificação (que deverá acontecer a cada dois anos), dizendo que as matérias-primas advindas dessa forma de negociação estarão fora do programa.

Outro ponto mostrado por Bottini e endossado pelo diretor técnico da Unica, Antonio de Pádua Rodrigues, é a importância do fornecedor de cana em ter os principais números do programa (consumo de diesel, adubos nitrogenados, entre outros) consolidados em seu processo de produção,afim de gerar maior eficiência para a unidade industrial que recebe a cana.
Em outras palavras, dentro ou fora do Consecana, o produtor organizado conseguirá negociar suas informações também na hora de fechar o contrato com a usina.