Um exemplo a ser seguido
18/04/2018
Agronegócio
POR: Revista Canavieiros
Por: Marino Guerra
O verbo seguir talvez, depois do advento das mídias sociais, tenha ganhado uma denotação um tanto quanto simplista. Seguir uma pessoa hoje significa, principalmente para as novas gerações, o ato de querer ver o que outra pessoa publica na internet.
Ao conhecer a fornecedora e líder associativista, presidente da Assocapi (Associação dos Fornecedores de Cana de Capivari), Maria Christina Pacheco, e sua visão sobre a canavicultura, de como enxerga a atividade na qual está inserida, fica evidente que sua conduta profissional é um exemplo raro a ser seguido.
Em tempos de tantas mudanças como mecanização da colheita e plantio, crise de quase uma década, RenovaBio e Consecana Produtor Integrado, é evidente que fornecer cana será uma atividade que demandará muito mais atenção de quem nela estiver inserida, principalmente em se tratando de sua gestão.
Essa é a principal inspiração que Christina pode trazer aos demais colegas. Quando na edição passada falamos sobre quais as principais mudanças que o novo Consecana trará aos fornecedores, uma das mais destacadas era que ele (fornecedor) teria que participar de todas as operações de sua atividade, e aqui vale lembrar que participar não significa executar, mas, no mínimo, gerenciar o trabalho de terceiros.
É exatamente isso que a fornecedora faz em suas operações de plantio e colheita.Para plantar,ela contrata uma empresa terceirizada que corta a cana e faz a distribuição dos toletes em carreta, pois na região em que está ainda é muito forte essa prática, sendo todo o restante das atividades (uso de tratores e carretas, sulcação, adubação e aplicação de agroquímicos) de responsabilidade da equipe da fazenda. Dessa forma, ela consegue contar com toda a gestão dessa atividade.
No CTT (Corte, Transbordo e Transporte) que envolve equipamentos mais robustos e caros, todo o serviço é prestado por uma empresa terceirizada. No entanto, o planejamento da colheita é feito à quatro mãos: entre a dona da cana e um representante da usina, na qual a entrega da matéria-prima é definida em blocos divididos pelos meses da safra. Somente com esse planejamento, no caso do novo Consecana, ela já teria um acréscimo no valor a receber, pela regularidade da entrega.
Entregar cana ao longo de toda a safra sem planejamento varietal é impossível. No mínimo três variedades diferentes, com características precoces, médias e tardias, precisam estar distribuídas por toda a área. E foi justamente o seu amplo plantel genético que me levou até a fazenda Milhã e, consequentemente,a conhecer o trabalho da produtora. Isso porque o CTC (Centro de Tecnologia Canavieira) realizou, no final do mês de fevereiro, um dia de campo na propriedade com o objetivo de mostrar como estava o desempenho das variedades da família 9000 em uma operação já comercial.
Para desenvolver seu plantel, Maria Christina adota uma metodologia bem simples. Em pequenas áreas (de 3 a 5 hectares) ela faz o plantio de uma variedade e analisa as características dela ao longo de todo o seu ciclo. No caso das canas CTC, elas vão para o terceiro corte este ano e com os dados em mãos fica simples comparar os resultados de cada uma e ter a certeza de qual deve receber maior investimento.
“Se você quiser continuar no setor é preciso procurar novas variedades, não dá para plantar RB867515 a vida inteira, já passou da hora de buscar um material mais novo que funcione melhor que ela”, analisa Maria Christina.
Todo esse cuidado com a escolha pela adoção de uma variedade nova já seria justificado pelas características da canavicultura, onde uma escolha errada ficará martelando não só na cabeça, mas no bolso do fornecedor por pelo menos cinco anos, mas ainda tem um agravante no caso das variedades CTC, que são os custos de royalties.
Ao longo do evento, em seus depoimentos, ficou claro que a fornecedora por ora está satisfeita com o desempenho de suas canas CTC, ou seja, a proposta de negócio da empresa que é trazer tecnologia para o campo para reduzir custos e ter ganhos de açúcar, justificando assim essa cobrança, pelo menos na fazenda Milhã, que entrega uma média de 25 mil toneladas por safra, está dando muito certo. No entanto, a líder associativista ainda vê o valor dos royalties como um empecilho para a propagação de boas variedades. “Eu já cansei de dizer para o CTC que se fosse metade do preço, eles já estariam com uma área pelo menos três vezes maior”, diz.
Como um exemplo de produtora de cana-de-açúcar a ser seguida, até porque quem não entender pelo menos a filosofia de trabalho utilizada por Maria Christina terá muitas dificuldades para sobreviver no setor, ela se sente à vontade para apontar algumas barreiras que a canavicultura precisa transpor.
A primeira é em relação à dificuldade de negociação com as usinas que passaram a ter um modelo de gestão profissional, na qual os executivos, que têm seus empregos e bônus vinculados a uma busca constante na redução de custos, dão a impressão de estar criando muros invisíveis onde, segundo a produtora, faz com que o produtor não consiga sentir a importância de seu trabalho frente aos seus parceiros.
O segundo ponto é ainda um pouco mais complexo, se tratando da morosidade que uma parcela expressiva dos fornecedores de cana tem em aceitar o novo. Para isso, ela cita como exemplo a região de atuação da associação que preside, a qual uma boa parte de sua base ainda queimará cana na próxima safra, autorizada em decorrência ou do seu tamanho ou pela declividade do terreno.
A presidente da Assocapiilustra com um exemplo do seu dia-a-dia essa resistência ao novo: “As pessoas sempre me perguntam, mas você não cultiva? Não cultivo terra há mais de dez anos, eu desinleiro, adubo, passo herbicida. Não mexo com o chão, o chão fica intacto, depois que foi plantado ele fica lá. A palha eu só tiro da rua e o restante fica protegido, é uma mudança que as pessoas acham estranha, elas me questionam se eu não faço um risquinho. Não faço nada, a não ser no corte da soqueira, que aí tem que fazer, isso é bem diferente do rasgo que fazem com um cultivador”, explica.
Épocas de dificuldades levam as pessoas a tomar as mais loucas atitudes. O nazismo só começou a fazer sentido para os alemães, e aqui cabe a ressalva que não foi apenas para a população normal, fácil de ser manipulada, mas também pelas grandes mentes da época, porque eles viam de uma sociedade extremamente capaz, porém viam todas as tentativas de voltarem a serem eficientes mundialmente sendo frustradas devido a uma certa arrogância daqueles que venceram a Primeira Guerra mundial, que acharam que eles aceitariam ser subjugados.
O grande propósito do estudo da História é conhecer o passado para não repetirmos os mesmos erros. Os alemães entenderam isso e se reestruturaram depois da queda do Terceiro Reich, focados na eficiência, para se tornar a maior potência europeia.
Assim como as potências vencedoras do segundo conflito mundial foram duras com os alemães, a tendência é que as usinas também utilizem da mesma aspereza com os fornecedores. Cabe a esses simplesmente fazer igual aos europeus e somente mostrar a todos quem são os que sabem fazer as coisas da maneira mais eficiente e o exemplo da Maria Christina Pacheco é um ótimo começo para isso.