Por: Fernanda Clariano
Metade dos aplicativos do Brasil dos últimos dois anos veio do setor agro para contribuir com o manejo do solo, análise do clima, permitir a utilização melhor dos equipamentos e os conceitos de agricultura 4.0 e agricultura de precisão. Uma indicação de modernidade, inovação, dinamismo, que tem o setor agro em relação aos outros setores.
O grande desafio é fazer com que as tecnologias cheguem a todos e não seja simplesmente uma novidade concentrada no segmento que tem mais acesso à informação ou que tem mais recursos, mas que chegue ao pequeno agricultor, a agricultura familiar, no sentido de inovar com inclusão e promover o aumento da produtividade.
Com o objetivo de integrar as cadeias da agricultura e tecnologia, os órgãos públicos federal, estadual, municipal, sociedade civil e órgãos de fomento, e mostrar o que está sendo feito para modernizar a agricultura, promover a inclusão e incentivar a inovação no setor que dá sustentação econômica ao Brasil, a SAA (Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo), a Apta (Agência Paulista de Tecnologia dos Agronogócios), a Fundepag (Fundação de Desenvolvimento de Pesquisa do Agronegócio e a ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), realizaram nos dias 3 e 4 de março, na Capital paulista, a primeira edição do Agrifutura - Inovação no Agronegócio, uma vitrine de possibilidades tecnológicas em benefício dos agricultores.
O evento totalmente focado em inovação para o agronegócio reuniu 2,5 mil pessoas, dentre elas produtores rurais, pesquisadores, investidores, indústrias, comerciantes e startups, que puderam alavancar seus conhecimentos por meio de exposições, palestras e apresentações de trabalhos.
“Além de consolidar iniciativas governamentais de fomento, este evento tem o sentido de buscar disseminar e fazer com que as tecnologias possam estar mais acessíveis. Queremos que a inovação chegue ao pequeno produtor, e mais do que isso, que a inovação venha, mas que ela tenha o compromisso muito acentuado de ser inclusiva e de ser democratizada”, disse o secretário de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Arnaldo Jardim.
Guto Ferreira, presidente da ABDI (Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial), destacou que a inovação no agronegócio, tema principal do Agrifutura 2018, encontra direta convergência com as diretrizes defendidas pela agência, a partir de junho de 2016. Reconhecida como a agência de inteligência do Governo federal para o setor produtivo, a ABDI se posiciona como um dos agentes estratégicos da indústria 4.0 no Brasil e apoia ações e projetos de estímulo à inovação nos diversos setores, entre eles o agronegócio. “Tendo como ponto de partida o encontro das mais avançadas tecnologias digitais, o Agrifutura propõe mostras das inovações que já estão disponíveis e que trazem competitividade ao empreendedor rural, além de promover uma estreita integração com as soluções propostas pelas startups. O evento é, sem dúvida, um fórum imprescindível não só para discutir, mas também para apontar novos caminhos rumo ao ganho de eficiência produtiva e à ampliação da competitividade do agronegócio brasileiro. Essa é a rota para um Brasil 4.0”, destacou Ferreira.
BNDES lança projeto durante o Agrifutura
O BNDES sempre colaborou e apoia o desenvolvimento do agronegócio do Brasil e há algum tempo tem se dedicado a explorar a IoT (Internet das Coisas) com mapeamento que possa alavancar a economia brasileira.
Durante o Agrifutura, o representante da área de Indústria e Serviços do BNDES, Rafael Vizeu Mancuso, lançou o projeto chamado Piloto BNDES IoT (Internet das Coisas), uma linha de crédito de recursos não-reembolsáveis que tem como objetivo dar suporte financeiro ao desenvolvimento de projetos de IoT direcionados especialmente ao uso eficiente do maquinário no campo, segurança sanitária e utilização eficaz de recursos materiais e insumos.
De acordo com Mancuso, a iniciativa deve atender em especial ao setor agro e o ambiente rural. “Ao longo do ano passado foi feito um estudo para identificar quais as principais atividades tinham o maior potencial para se desenvolver com a IoT e o ambiente rural foi um dos apontados. Esperamos que este projeto ajude bastante o ambiente rural a explorar o seu potencial”, disse o executivo que ainda reforçou que as propostas devem ser encaminhadas até abril e a seleção dos projetos que serão apoiados pelo BNDES acontece em junho.
Ações inovadoras e pesquisas diferenciadas
As coordenadorias e institutos da Secretaria de Agricultura e Abastecimento apresentaram ações inovadoras e pesquisas diferenciadas, mostrando esforços para aprimorar a agricultura, como desenvolvimento de novas sementes, aprimoramento genético, produção de alimento industrial, entre outros.
Apta
Em um dos estandes da Apta, o visitante do Agrifutura pôde conhecer a tecnologia de produção de cachaça, melado e açúcar mascavo.
“A cachaça é um produto que vem sendo bastante trabalhado na instituição porque agrega valor à pequena produção de cana-de-açúcar e tem uma boa aceitação no mercado. Temos trabalhado com cursos para a melhoria no processo de produção, fermentação e a ideia é trazer uma nova fonte de renda para a pequena produção agropecuária. São muitos os produtores que procuram a instituição para obter informações do processo produtivo, da comercialização, mas o grande gargalo para o pequeno produtor de cachaça atualmente é a questão da tributação”, afirmou a coordenadora substituta da Apta, Adriana Renata Verdi.
De acordo com o coordenador da Apta, Orlando Melo de Castro, o AgriFutura permitiu que pessoas de todos os níveis tivessem contato com as novidades desenvolvidas pelos institutos de pesquisa. “É muito bom poder inserir a população nesse meio, para que ela tenha a consciência da importância do trabalho da pesquisa no setor agropecuário”, disse Castro. Ainda segundo ele, “para que haja crescimento do agro é preciso incorporar tecnologia e inovação nos diversos segmentos da produção e isso pode ser feito incorporando as tecnologias disponíveis pelos institutos”, destacou o coordenador que também enfatizou a importância das parcerias - que são grandes desafios. “Dos recursos que hoje financiam o funcionamento dos nossos institutos, 23,4% foram frutos de parcerias com a iniciativa privada e isso é um número extraordinário. Há três anos este número significava algo em torno de 17%”, informou.
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Cati
A Cati (Coordenadoria de Assistência Técnica Integral), órgão de extensão rural da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, atraiu a atenção dos visitantes que passaram pelo estande da instituição e conferiram as tecnologias de produção voltadas ao aprimoramento e melhoramento da agricultura paulista.
Uma das ações realizadas e apresentadas pelo DSMM (Departamento de Sementes, Mudas e Matrizes) da Cati foi a produção das matrizes de mudas, em laboratório, feita via micropropagação, um conjunto de técnicas que permite que as plantas sejam desenvolvidas in vitro, com padrão de qualidade, ausência de vírus, fungos e bactérias.
Em janeiro deste ano, foi inaugurado, em Tietê, o novo Laboratório de Micropropagação de Mudas, pertencente ao DSMM. O nível de excelência das instalações e dos maquinários instalados, em um espaço de 275m², assegura todos os cuidados sanitários e fisiológicos que garantem um sistema de micropropagação eficiente e de elevada qualidade com economicidade.
“O Agrifutura é uma oportunidade de demonstrarmos o que estamos fazendo no Cati, porque fazer tecnologias que não chegam até o produtor ou que o produtor não fica sabendo que existem e que estão disponíveis para ele não adianta. Temos que fazer com que essas tecnologias que vêm sendo disponibilizadas pelo Governo cheguem principalmente até ao pequeno produtor”, disse a engenheira agrônoma do Núcleo de Produção de Mudas de Tietê, Laura Becker.
Palco de grandes discussões
Já faz um tempo que os avanços tecnológicos impactam o agronegócio no mundo. No Brasil, a situação não é diferente. A agricultura de precisão e a IoT (Internet das Coisas) tem ajudado produtores na otimização de processos e na mensuração de variáveis que auxiliam na tomada de decisões e foram temas de painéis no Agrifutura. Especialistas renomados também discutiram as tecnologias que se aplicam a horticultura, fruticultura, bovinocultura de corte e de leite, aquicultura, produção de grãos, cana e laranja.
O pesquisador e líder do Programa Cana do IAC, Marcos Landell, foi moderador do painel sobre grãos, cana e laranja que teve como painelistas Éder Giglioti da Smartbio; Gilberto Girardi, da Enalta e André Marcelo Souza da SpecLab.
Na ocasião, o pesquisador aproveitou para comentar os resultados do PIB do agronegócio divulgado pelo IBGE. “O agronegócio sempre tem nos dado boas notícias, foi o único setor que efetivamente deu sua contribuição, mostrando a importância que tem para o Brasil”, disse Landell.
A tecnologia SpecSolo foi apresentada pelo cientista da Embrapa Solos, da SpecLab, que explicou como é realizada a análise de fertilidade do solo de forma não destrutiva, econômica, rápida e precisa. O pacote tecnológico atende pequenos, médios e grandes produtores. “Com essa tecnologia o agricultor familiar terá fácil acesso à análise de fertilidade do solo na sua propriedade e recomendação agronômica, o que pode contribuir diretamente no aumento da sua renda familiar”, ressaltou Souza.
No painel sobre IoT, moderado pela pesquisadora chefe geral da Embrapa Informática em Campinas, Silvia Massruhá os painelistasRois Nogueira, das John Deere, Fabrício Figueiredo do CPqD(Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações) e Walter Macceroni Jr., da São Martinho, debateram agricultura de precisão, conectividade e conectividade-produtor.
Para discutir como a agricultura de precisão e os lançamentos tecnológicos podem gerar novas oportunidades e maneiras de garantir a produção sustentável de alimentos, a John Deere participou por meio do gerente de Agricultura de Precisão. A companhia mostrou as soluções completas que possui em otimização de maquinário e de operações, além de suporte às decisões agronômicas. "O uso de IoT faz com que o operador consiga otimizar os ativos que possui no campo, em termos de máquinas, área cultivável, infraestrutura ou logística. Além disso, permite alcançar um nível superior de gestão e controle dos elementos, o que garante maior produtividade e rentabilidade agrícola", afirmou Nogueira.
O assessor de Tecnologias da São Martinho apresentou a experiência do grupo no projeto desenvolvido junto ao CPqD, onde foi adotada tecnologia de internet 4G não vinculada às operadoras de telefonia. Foram instalados equipamentos com internet 4G em máquinas agrícolas, o que permitiram a transmissão em tempo real de dados das atividades agrícolas para a sede. “O CPqD desenvolvia a tecnologia e nós tínhamos uma carência de conectividade e assim nasceu nossa parceria. Nossa estratégia não é fazer inovação interna, é fazer inovação aberta acessando quem entende do assunto para desenvolver aplicativos, tecnologias que agreguem valor ao negócio. Investimos R$ 48 milhões no projeto, dos quais 70% já foram aplicados em equipamentos e o restante será destinado ao desenvolvimento de softwares que transformem os dados em recomendações para prevenir problemas no campo e nas usinas”, explicou Junior.
O assessor ainda ressaltou a importância dos pioneiros em tecnologia, principalmente na área digital e também das startups e deixou aberto o convite para que visitem o grupo e ofertem tecnologias para a agricultura.
Startups
Mais de 20 novos empreendedores apresentaram suas criações como: softwares e aplicativos para gestão de negócios; equipamentos de controle de produção e pós-colheita: sensores, drones, leitores, medidores etc. e programas de big data, machinelearning e marketplace. A maior parte desses startups é liderada por empreendedores de 25 a 35 anos que possuem alguma ligação com o agro, sejam filhos de produtores ou estudantes da área. A Revista Canavieiros conversou com representantes de duas startups, para conhecer um pouco sobre essas iniciativas que vêm modernizando as propriedades rurais.
Syntecsys -A startup trabalha com tecnologia agrícola e oferece um sistema de monitoramento automático de focos de incêndio em plantações voltada para o agronegócio e trabalha com grandes empresas como usinas, indústria de papel e celulose que têm áreas muito extensas, com plantação de eucalipto, madeira ou cana-de-açúcar e causam grandes incêndios - esses incêndios têm consequências financeiras, multas, prejuízos de matéria-prima e outros. “O nosso sistema é voltado para detectar o incêndio desde o início e tentar combatê-lo rápido para que ele não tome uma dimensão onde você perca o controle. Nós somos ainda uma startup, estamos em fase já com o produto desenvolvido apesar de parecer uma empresa não startup, mas ainda somos e aqui é uma área que você tem contato com outras tecnologias e com pessoas que buscam tecnologias e é por isso que estamos aqui”, afirmou André Fernandes, comercial da Syntecsys.
Scicrop -A startup iniciou em 2015 com o objetivo de criar modelos automatizados de análise e coleta de dados para o campo. Atualmente atende tanto o produtor rural quanto a cadeia produtiva com coleta de dados, com equipamentos de IoT e também com Big Data. A startup apresentou no Agrifutura, o AgroAssist, sistema de gestão online por meio do monitoramento de informações climáticas que pode auxiliar o pequeno e o médio produtor rural a reduzir em até 30% as suas perdas e aumentar a lucratividade da propriedade. A geração das informações é realizada por meio de uma estação agrometeorológica adquirida pelo produtor em comodato, que é recebida via correio e instalada em cerca de 30 minutos. O equipamento envia dados climáticos do local à internet a cada 15 segundos. Diariamente, o produtor recebe o resumo de como foi o dia em termos de clima e, a cada domingo, recebe uma previsão do clima para os próximos 15 dias. Caso não haja conectividade, o produtor ainda tem a opção de utilizar um microtransmissor via satélite de órbita baixa para acessar os dados. “O sistema foi criado para ajudar o produtor nas questões do plantio, aplicação de defensivos agrícolas e colheita, que são os pontos mais sensíveis e onde ele pode perder dinheiro, mas com uma análise de prescrição de clima, o produtor terá vários benefícios”, afirmou o diretor administrativo e comercial da Scicrop,Renato Ferraz.
Hackathon
Um hackathon reuniu programadores, makers, marqueteiros, técnicos, empreendedores, engenheiros entre outros que participaram de uma maratona durante os dois dias do Agrifutura tentando resolver os desafios tecnológicos lançados por agricultores diante de suas necessidades.
Doze equipes de cinco pessoas, com mentoria de extensionistas, tecnólogos e pesquisadores, estudaram propostas e apresentaram soluções para temas como clima, doenças e pragas, comercialização e extensão rural.
Os trabalhos foram julgados conforme coerência com o tema escolhido; originalidade; impacto e execução. As equipes vencedoras foram: 1º Campo Tracker (cada integrante foi premiado com uma SmartTV 40 Polegadas); 2º lugar Eco Market (cada integrante foi premiado com um SmartPhone e o 3º lugar Feria Livre (cada integrante foi premiado com um fone de ouvido bluetooth).
A equipe vencedora, CampoTracker, apresentou solução para a área de comercialização de produtos. O objetivo do projeto foi minimizar fraudes por meio de monitoramento individual de produto, utilizando sistemas de RFID em embalagens.
Já a equipe Eco Market, segunda colocada, desenvolveu uma ferramenta de comercialização com foco nos pequenos e médios produtores, associações e grandes varejistas.
A equipe Feira Livre, que ficou com a terceira colocação, desenvolveu uma ferramenta também focada na comercialização de produtos agropecuários, que possibilita produtores e consumidores realizarem negócios por meio do aplicativo WhatsApp.
A equipe vencedora terá o produto patenteado e poderá buscar investidores ou criar uma startup para desenvolvê-lo.