Vendas de hidratado ficam menores

01/08/2022 Marcos Fava Neves POR: Marcos Fava Neves* Vítor Nardini Marques** Vinícius Cambaúva***

Reflexões dos fatos e números do agro em maio/junho e o que acompanhar em julho

Na economia mundial e brasileira

• A mudança da matriz energética global em direção à maior utilização de fontes renováveis tem sido pauta de discussões em fóruns do mundo todo. Um estudo do FMI (Fundo Monetário Internacional) revelou que a
substituição do carvão por fontes renováveis pode gerar um rendimento líquido global de US$ 78 trilhões até o final do século, reforçando que o custo não deve ser um entrave para a transição. A publicação do FMI vem num momento em que estamos vivenciando retrocessos na matriz energética global em consequência da guerra entre Rússia e Ucrânia.

• O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) foi de 0,67% em junho, ou 0,20p.p. acima do que a taxa que havia sido registrada em maio (0,47%). Com isso, o indicador acumula alta de 5,49% em 2022e
de 11,89% nos últimos 12 meses. Todos produtos e serviços analisados (9 categorias, no total) tiveram variação positiva (cresceram) em junho. A maior variação foi do grupo “vestuário”, com alta de 1,67%. Já a categoria de “alimentação e bebidas” apresentou o maior impacto, registrando índice de 0,8%, resultado da alta no preço dos alimentos para consumo fora do domicílio (1,26%). Entre os alimentos para consumo em domicílio, o leite longa vida e o feijão registraram alta, ficando em 10,72% e 9,74%, respectivamente. Já a cebola, a batata-inglesa e o tomate registraram queda.

• Em relação as perspectivas para a economia brasileira, o Banco Central divulgou no dia 08 de julho o novo Boletim Focus (Bacen) onde estima: IPCA deve ter variação de 7,96% em 2022 e 5,01% em 2023; já o PIB deve apresentar crescimento de 1,51% este ano e 0,50% ao final do próximo; o câmbio foi estimado em R$ 5,09 e R$ 5,10, para 2022 e 2023, respectivamente; e a taxa Selic deve fechar 2022 em 13,75%, e 2023 em 10,50%. Leves variações nos indicadores, mas mantendo o cenário visto nos meses anteriores.

No agro mundial e brasileiro

• Em junho, o Índice de Preços de Alimentos da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) ficou em 154,2 pontos, 2,3% menor do que a taxa que havia sido registrada em maio (157,9). Esta é a terceira queda consecutiva, embora ainda continue nos níveis mais elevados já registrados. Apesar da redução, o indicador ficou 23,1% acima do registro de junho de 2021, comportamento impulsionado principalmente pelo contexto geopolítico global com a guerra entre Rússia e Ucrânia. Com a revisão na oferta global de cereais (de 2,784 para 2,792 bilhões de t), o índice de cereais caiu 4,1% em relação a maio, embora continue 27,6% maior que junho de 2021.

• No campo, segundo estimativa de julho da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), a produção brasileira de grãos do ciclo 2021/22 deve totalizar recorde de 272,5 milhões de t, volume 6,7% superior ao obtido na safra passada e 0,4% maior que a previsão do mês anterior (+1,2 milhão de t); já é o segundo mês de alta consecutiva. A oferta de soja foi revista novamente, e está indicada agora em 124,0 milhões de t, o que representa queda de 10,2% frente a 2020/21. Já o milho apresentou acréscimo nesta estimativa (+0,4%), com oferta total prevista agora em 115,7 milhões de t, 32,8% maior frente ao ciclo anterior. Desse montante, o cereal de primeira safra deve entregar 24,8 milhões de t (+0,3%), a safrinha 88,4 milhões de t (+45,6%) e a terceira safra 2,4 milhões de t (+48,0%).

• Já o progresso de safra foi apontado pela Conab nas seguintes condições, até 02 de julho: a colheita do milho verão estava em 95,1% (94,6% na mesma data de 2021); a colheita do milho safrinha (2ª safra) avança em bom ritmo e se encontra em 28,0% (14,9% em 03/07/2021), com destaque para os avanços no Mato Grosso (51,2%), Maranhão (30,0%) e Tocantins (23,0%); no algodão, a colheita também tem avançado e já alcança 10,9% das áreas totais (era de 11,4% há um ano); e, por fim, o plantio de trigo segue em atraso, estando com 71,4% das áreas semeadas (contra 86,5% na mesma data de 2021). As boas condições das lavouras brasileiras e o ritmo acelerado nas operações têm favorecido a produção, o que explica os movimentos de alta nas estimativas da Conab, como vimos.

• Na cadeia da laranja, no final de maio, ocorreu um dos mais importantes eventos a nível global: a divulgação da 1ª PES (Pesquisa de Estimativa de Safra) do parque citrícola de São Paulo e Triângulo/ Sudoeste de Minas Gerais, maior região produtora de citrus no mundo. O relatório, que é elaborado pelo Fundecitrus (Fundo de Defesa da Citricultura) em parceria com a Markestrat Group, FCAV/UNESP e FEARP/USP, apontou que devem ser colhidas 316,95 milhões de caixas (40,8 kg) em 2022/23, 20,5% maior do que a safra passada. Entre os principais fatores que contribuíram para a previsão de alta estão: (1) as chuvas bem distribuídas no período de outubro do ano passado até maio deste ano (média de 923 mm); (2) as temperaturas mais amenas após o florescimento; e (3) uma maior carga de frutos nas plantas, que está 4,5% superior ao do último ciclo. Mesmo com a projeção de crescimento em 1/5 na colheita de laranja. Vale destacar que a estimativa ficou apenas 1% acima da média dos últimos 10 anos. Como os estoques de suco estão baixos e podemos ter adversidades climáticas ainda, o cenário de preços em reais segue bom, compensando a grande alta dos custos de produção.

• No cenário global, o relatório de junho do USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), acerca da safra de grãos 2022/23 (a que ainda será plantada no Brasil), indica uma produção de milho em 1,186 bilhão de t, 5 milhões a mais do que na primeira previsão (maio), porém ainda 2,5% menor do que a oferta de 2021/22 (1,21bilhão de t). O comparativo de produção entre a safra 2022/23 e a anterior, nos principais países produtores, nos mostra o seguinte: nos EUA, a produção deve ficar em 367,3 milhões de t (-4,3%); na China em 271,0 milhões de t (-0,5%); no Brasil serão 126 milhões de t (+8,6%); na União Europeia a produção deve ser de 68,3 milhões de t (-3,1%); e fechando o top 5, na Argentina, a oferta será de 55 milhões de t (+3,8%). Na Ucrânia, fortemente afetada pela guerra contra Rússia, o USDA estima uma oferta do cereal em 25 milhões de t, acima das 19,5 milhões de t estimadas no mês passado, mas ainda bem abaixo das 42,2 produzidas em 2021/22. Já os estoques globais de milho devem ficar em torno de 310,5 milhões de t,
praticamente o mesmo volume de 2021/22; no mês passado o órgão havia estimado 305,1 milhões de t.

• Na soja, o USDA também ampliou a previsão da oferta global de 22/23, em junho, agora estimada em 395,4 milhões de t (era 394,7 no mês passado). Com isso, a produção da leguminosa deve ser 12,4% maior do que em 2021/22. Os valores para os cinco principais países produtores foram mantidos, conforme estimativa de maio, em: Brasil com 149,0 milhões de t (+18,3%); Estados Unidos em 126,3 milhões de t (+4,6%); Argentina com 51 milhões de t (+17,5%); China produzindo 17,5 milhões de t (+6,7%); e Índia com oferta em 11,5 milhões de t (-3,4%). Os estoques globais de soja foram ampliados de 99,6 (maio) para 100,5 milhões de t (junho), volume que é 16,7% superior ao de 2021/22 (86,1 milhões de t).

• Boas as notícias para os grãos, que seguem com alta nas estimativas para a oferta global em 2022/23. Vamos torcer para que as condições ajudem e estes números sejam mantidos. É necessário ampliar a oferta de alguns produtos para garantir o abastecimento e controlar os altos preços que aí estão.

• E por falar nos Estados Unidos, até o dia 03 de julho, as condições das lavouras de grãos 2022/23 no país seguem em níveis satisfatórios, mas pouco inferiores à situação do mesmo período do ciclo passado. O milho estava 11% em condições excelentes, 53% em condições boas e 27% em médias; há um ano estava em 14%, 50% e 25%, respectivamente. Já os campos de soja estavam 9% excelentes, 54% em boas e 28% em médias; era de 10%, 49% e 30%, respectivamente, há um ano.

• No âmbito das exportações, o agronegócio brasileiro encerrou o primeiro semestre de 2022 com US$ 79,0 bilhões em receitas acumuladas, 30% a mais do que no mesmo período do ano passado. Nos últimos 12 meses foram US$ 139 bilhões, 26% a mais! A alta nas arrecadações dos embarques brasileiros tem relação direta com o aumento dos preços das commodities no mercado internacional. A soja e as carnes foram as duas principais categorias de destaque. No caso da leguminosa, o volume de vendas caiu para 53 milhões de t (-8%), mas a receita saltou para US$ 30,7 bilhões (+23%).

• Do lado das importações, o 1° semestre do ano fechou em US$ 22 bilhões, 66% a mais que no mesmo período do ano passado; outro comportamento que demonstra a elevação de preços, especialmente de fertilizantes e defensivos importados. Ainda assim, o saldo da balança comercial ficou emUS$ 57 bilhões.

• Na China, o volume importado de soja brasileira voltou a crescer em maio: foram 9,7 milhões de t, quase 20% maior do que havia sido registrado em abril, mas praticamente o mesmo volume de maio do ano passado (9,6 milhões de t). A alta, que não era esperada em vista da baixa disponibilidade do grão em período de entressafra, é explicada pelo atraso na chegada/descarregamento de alguns navios no país asiático, efeitos do lockdown nos portos chineses graças aos casos da covid-19 no país.

• Outra boa notícia é que Brasil e China concluíram um acordo para início das exportações de milho e amendoim para o país asiático. A informação foi divulgada pelos Ministérios da Agricultura e de Relações Exteriores. Além do acordo firmado, os países ainda estão discutindo a possibilidade de vendas brasileiras de farelo de soja, proteína concentrada de soja, polpa cítrica e soro fetal bovino.

• E em 2022, os embarques de trigo brasileiro já superaram todo o volume exportado do cereal no ano passado; entre janeiro e maio, foram 2,47 milhões de t (+2,9%). Diante desse cenário, o Brasil deve vir a comprar mais trigo este ano, já que importa grande parte do que consome (6,2 milhões de t em 2021), para uma indústria que demanda 12,5 milhões de t.

• E no final do mês de junho, o Mapa (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento) divulgou suas novas projeções para a produção agropecuária no Brasil nos próximos 10 anos, até 2031/32. No cultivo de grãos a área deve saltar dos atuais 73,4 para 87,7 milhões de ha (+19,5%), e a produção de 270,2 para 338,9 milhões de t (+25,4%); estamos falando em 68,7 milhões de t a mais ou quase 7 milhões de t adicionais por ano. Entre as culturas agrícolas, as que registrarão maior aumento na produção serão o algodão em pluma (+36,0%), a soja (+32,3%), o sorgo (+32,2%), o trigo (+26,3%) e o milho (+16,5%). Já nas cadeias da pecuária, os maiores aumentos serão na carne de frango (+27,8%), na carne suína (+24,2%), no leite (+19,8%), em ovos (+19,2%) e na carne bovina (+16,2%). E falando na pecuária, a produção total de carnes deve saltar dos atuais 28,6 para 35,4 milhões de t. Ótimas oportunidades abertas ao Brasil, mesmo com todos os desafios enfrentados atualmente.

• Já o VBP (Valor Bruto da Produção Agropecuária) foi estimado pelo Mapa em R$ 1,243 trilhão para 2022, conforme atualização de junho. Esse valor é 2,4% superior ao alcançado no ano anterior e ligeiramente maior que a previsão de maio (R$ 1,236 trilhão).
O faturamento das lavouras deve alcançar R$ 880,37 bilhões (+6,56%), com crescimento expressivo para algodão (+45,0%), café (+37,8%), cana-de-açúcar (+28,1%) e milho (+20,0%). Já na pecuária, espera-se queda generalizada para as carnes, de 6,4%, chegando a R$ 362,64 bilhões (-6,4%).

• No 1° trimestre de 2022 (janeiro a março) a população ocupada no agronegócio totalizou 18,74 milhões de pessoas, crescimento de 6,2% em relação ao mesmo período do ano passado; ou 1,09 milhão de pessoas a mais. Com isso, este trimestre foi o com maior número de pessoas trabalhando no agro desde 2016. Os dados foram divulgados pelo Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada).

• Estudo feito pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) aponta que o Brasil está entre os países que mais reduzem o impacto do agronegócio no meio ambiente. Segundo o relatório, o nosso país é o 1° no indicador “poupa-florestas”, e fica apenas atrás da Argentina no que tange a capacidade produtiva da agricultura por unidade de emissão de GEEs (Gases de Efeito Estufa). Entre os países analisados estavam o Brasil e outros sete grandes agroexportadores: Argentina, Canadá, China, França, Alemanha, Índia e Estados Unidos.

• Entre janeiro e maio de 2022, o agronegócio brasileiro movimentou R$ 10,7 bilhões em fretes, 27,4% maior que o mesmo período do ano passado; é o que aponta relatório da Fretebras. Com isso, o setor respondeu por 36,0% do total de fretes movimentados (R$ 29,7 bilhões), liderando a classificação por setor. Na segunda posição ficou a indústria com R$ 8,2 bilhões e a construção com R$ 4,5 bilhões. Entre os produtos mais transportados pelo agro, os fertilizantes lideram com 25% do total (e 19% a mais no comparativo anual), seguido de soja, milho e trigo.

• Segundo o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), as contratações de crédito rural na safra 2021/22 (de julho de 2021 a maio de 2022) chegaram a R$ 252,46 bilhões, alta de 18% e superando o valor disponibilizado quando do anúncio do Plano Safra atual (era de R$ 251,2 bilhões). Os financiamentos de custeio, no âmbito do Pronaf, cresceram 41% e dos créditos de comercialização, 43%.

• Também neste mês de junho, mais uma vez o clima frio voltou a preocupar os agricultores, especialmente os da região Sul e MS, e com destaque para as lavouras de milho, cana, café e citros. Até o momento não foram registradas grandes perdas (felizmente) mas é válido seguir acompanhando.

• Foi aprovado no Brasil o uso comercial do primeiro milho geneticamente modificado para resistência a insetos, desenvolvido totalmente em nosso país. A tecnologia “EH913”, fruto da parceria entre Embrapa Milho e Sorgo e Helix (empresa do grupo Agroceres) ainda não tem data de início da comercialização, embora este processo já tenha se iniciado em outros países. A tecnologia utiliza um gene específico de Bt (Bacillus thuringiensis) para controle de lepidópteras, especialmente da lagarta-do-cartucho (Spodopeta frugiperda) e da broca da cana (Diatraea saccharalis).

• No setor de insumos, a alta de preços nos fertilizantes aconteceu mesmo com o aumento da oferta interna desses produtos. Em março, foram 2,9 milhões de t entregues pela indústria aos agricultores brasileiros, 13,7% a mais do que o mesmo mês de 2021. O volume também é 16% maior que o mês anterior, fevereiro. O comportamento é explicado principalmente pelo ritmo acelerado de compra dos produtores, já pensando na safra 2022/23, em vista de preocupações com o abastecimento destes insumos e as incertezas trazidas pela guerra entre Rússia e Ucrânia. Os dados são da ANDA, a Associação Nacional da Difusão de Adubos. Mas já começaram a ceder.

• E nosso agro não deixa de nos surpreender! A Netafim, empresa especializada em sistemas de irrigação, está investindo forte em seu novo produto/solução: é o Netafim Services. Trata-se de um modelo inovador no setor, no qual o agricultor pode assinar um plano de serviço, com pagamento mensal, para ter acesso a técnicos, infraestrutura, equipamentos, instalação e gestão de sistema de irrigação, sem que sejam necessários investimentos adicionais.

• E concluindo a seção de análise do agro, listamos os preços de produtos na data de fechamento da nossa coluna, segundo dados do Cepea/Esalq: a soja com referência em Paranaguá estava em R$ 190,37/sc, 2,35% a menos que a cotação de um mês antes; o milho fechou em R$ 81,68/sc, também registrando queda, neste caso de 2,24% no comparativo mensal; no algodão, a cotação era de R$ 6,03/libra-peso, 4,8% menor; e no boi gordo, a arroba ficou cotada em R$ 324,80, crescimento de 1,4% em relação a mesma data do mês passado. Em geral, movimentos de baixa nos preços dos principais produtos do agro. Momento de ficar atento e acompanhar o mercado; esta tendência pode se manter no 2° semestre.

Os cinco fatos do agro para acompanhar em julho são:

1. O clima incidente sobre a segunda safra de milho brasileira. Seguimos otimistas com o desempenho das lavouras, mas é preciso acompanhar de perto ainda a situação do PR e MS, onde as culturas se encontram em estágios mais sensíveis à falta de umidade. De acordo com a Conab, 25,5% do milho do país ainda está sob influência do clima.

2. A avaliação do mercado e as recomendações para investimentos e comercialização da safra, após o anúncio do novo plano safra (2022/23) que irá destinar 36% a mais de recursos neste ciclo (R$ 340,8 bilhões). Mesmo com um aumento bastante relevante no volume financeiro disponibilizado, vale lembrar que o custo de produção será bastante alto neste ciclo, e que os preços de algumas commodities já começam a indicar sinal de baixa. É preciso cuidado para tomada de decisão.

3. Desenvolvimento das lavouras nos Estados Unidos. Como vimos, os produtores norte-americanos recuperaram o ritmo de plantio dos últimos cinco anos, mas as lavouras acabaram emergindo mais tarde.
Vamos ver como ficam as condições e o desenvolvimento até o próximo mês, fator que é decisivo para cálculo da oferta (produção). Mas o fato é que os riscos serão maiores no final da safra.

4. A continuidade da guerra entre Rússia e Ucrânia e as discussões envolvendo a possibilidade de abertura dos portos ucranianos no Mar Negro para exportação de grãos pelo país. Se isso acontecer, a oferta global poderá ser alterada e, com isso, a dinâmica de preços também deve mudar.

5. Por fim, seguir de olho nos aspectos políticos e econômicos do Brasil: as discussões para amenizar os altos preços dos combustíveis, as movimentações políticas em período pré-eleição, as medidas para tentar reduzir a inflação; além de variações do câmbio com a alta de juros nos EUA e perspectiva para PIB, Selic e outros.

Reflexões dos fatos e números da cana em maio/junho e o que acompanhar em julho

Na cana

• A moagem de cana-de-açúcar alcançou o valor acumulado de 107,13 milhões de t desde o início do ciclo 2022/23 até 01 de junho, variação negativa de 17,88% em comparação ao mesmo período de 2021, revelando um atraso nas operações, de acordo com o levantamento quinzenal da Unica (União da Indústria da Cana-de-açúcar) 248 unidades estão em operação até então nesta safra, enquanto que na anterior o número era de 249.

• Com relação à qualidade da matéria-prima, o ATR acumulado registrou valor de 122,11 kg/t, ref letindo queda de 4,99%. Por sua vez, o mix de produção está em 59,48% para o etanol e 40,52% para o açúcar, com o biocombustível ganhando participação de 4,50 pontos percentuais sobre o adoçante em relação a 2020/21 em consequência da melhor remuneração visto o cenário de preços dos combustíveis.

• De acordo com o CTC (Centro de Tecnologia Canavieira), considerando uma amostra de 68 usinas e o período da segunda quinzena de maio, a produtividade das lavouras de cana ficou estável na comparação com o mesmo período do ano anterior, ou seja, 74,8 t/ha.

• No monitoramento do mercado de CBios (Créditos de Descarbonização), até o dia 08 de junho, as distribuidoras já haviam adquirido 19,36 milhões de títulos, o que corresponde a 52,72% da meta de 2022.

• O setor sucroenergético deve passar um novo processo de consolidação nos próximos anos. Com a retomada de bons índices de lucratividade nas três últimas safras, devido aos preços atrativos ora do açúcar ora do etanol, investidores devem apostar em fusões e aquisições para melhoria da eficiência operacional e redução da capacidade ociosa ainda existente. Estima-se que as unidades do Centro-Sul tenham capacidade de processamento de 850 milhões de t, mas a moagem esperada para este ciclo é entre 530 a 540 milhões de t. Esse otimismo também é pautado na forte demanda por energias de fontes mais limpas, o que deve trazer novas oportunidades de negócios para o setor e auxiliar a posicionar o Brasil cada vez mais como um dos maiores exportadores de açúcar e bioenergia do mundo.

• Visando a produção de um etanol mais sustentável, a Dedini vem apostando fortemente na integração de tecnologias para mitigação das emissões de gases do efeito estufa. A USD (Usina Sustentável Dedini) é a materialização desse ideal, atuando em duas frentes: otimização, utilizando a mínima quantidade de insumos e matérias-primas; e conceito zero, evitando a geração de resíduos e efluentes. Dessa forma, a unidade é capaz de evitar a emissão de três kg de CO2 por litro de etanol equivalente, enquanto as demais usinas conseguem apenas dois. Sustentabilidade na veia!

• Outro caso bastante promissor da linha dabioeconomia: A BP Bunge vem reduzindo sua dependência de fertilizantes químicos e apostando nos subprodutos da atividade como fonte de nutrientes aos canaviais. A vinhaça, já presente em 65% da área, deve intensificar sua participação como fonte de cloreto de potássio, alcançando 95% das áreas em 2025. Os benefícios relatados vão além da substituição do adubo químico, com o aumento da produtividade (3 a 10 t/ha) e maior longevidade do canavial. Outra iniciativa é a utilização da compostagem da torta de filtro e das cinzas do bagaço ao invés dos adubos fosfatados no plantio. A empresa também aumentou a adoção de biofertilizantes, como Azospirillum brasilense, bactérias que auxiliam no desenvolvimento da planta e no ganho de produtividade.

• A Pedra Agroindustrial informou que poderá ampliar em 10 milhões de t a sua capacidade de moagem com a aquisição de duas novas usinas na região de Paranaíba, no Mato Grosso do Sul. Atualmente, o grupo, que tem 3 usinas em São Paulo, possui capacidade de moer 10,5 milhões de t por safra, e deve quase que dobrar esta capacidade com as novas unidades. Para abastecê-las, a empresa informou que terá de plantar entre 120 a 140 mil novos hectares com a cultura na região.

No açúcar

• Com a moagem de cana-de-açúcar atrasada, a fabricação de adoçante fechou os dois primeiros meses da safra 2022/23 em 5,05 milhões de t, uma queda de 29,78% frente as 7,19 milhões de t do ciclo anterior, segundo a Unica. Mais matéria-prima tem sido destinada ao etanol, o que ajuda a explicar o resultado: 855 mil t do adoçante deixaram de ser fabricadas até então devido à mudança no mix.

• Segundo a Archer Consulting, a fixação de açúcar em Nova York está sendo reduzida, em vista das incertezas sobre o mercado de combustíveis no Brasil, já que o governo tem se movimentado para alterar a tributação destes produtos e reduzir os custos para os consumidores. Até o final de maio de 2022, haviam sido fixados 4,6 milhões de t, a preço médio de 17,40 centavos de dólar por libra-peso, sem prêmio de polarização. Este volume corresponde a 19,3% dos embarques estimados para 2023/24; em abril estava em 15%.

• E por falar em exportações, em maio foi embarcado 1,58 milhão de t de açúcar, volume 36,3% menor que as 2,48 milhões de t no mesmo mês de 2021. Com isso, o volume médio diário exportado do adoçante ficou em 71,8 mil t, e o preço médio mensal em US$ 379,90 por tonelada (+16,3). A receita total para o mês de maio ficou em torno de US$ 600 milhões (-25,0%); dados foram divulgados pela Agência Safras.

• A Índia deve ter produção recorde de açúcar de 36 milhões de t na safra 2021/22, superando a expectativa do mercado em 3%, segundo apurado pela Associação Indiana de Usinas de Açúcar (ISMA).
Com isso o país terá condições de recompor seus estoques do adoçante e de aumentar o teto limite de exportações imposto pelo governo no começo da temporada, de 10 para 11 milhões de t. Esse excedente pode balançar os preços internacionais para baixo visto a maior oferta.

No etanol

• De acordo com a Unica, a produção acumulada de etanol de 1 de abril até 1 de junho alcançou 5,17 bilhões de litros, queda de 12,25% em comparação ao mesmo período de 2021. Deste total, 3,56 bilhões de litros são de hidratado (-11,91%) e o 1,61 bilhão restante corresponde ao anidro (-12,98%). O biocombustível produzido a partir do milho já totaliza 596,38 milhões de litros, representando pouco mais de 10% do volume total e com avanço de 26,14% em comparação ao mesmo período do ciclo passado.

• Por sua vez, as vendas de etanol somaram 2,34 bilhões de litros em maio, queda de 7,13% em relação ao mesmo mês de 2021. Com isso, nos dois primeiros meses da safra a comercialização alcançou 4,57 bilhões de litros (-2,53%). Do volume total vendido no mercado doméstico, 2,78 bilhões de litros se referem ao tipo hidratado (-7,22%) e 1,58 bilhão de litros do anidro, (+7,10%).

• Em torno de toda a confusão que estamos vendo com a crise de preços de combustíveis, uma PEC (Projeto de Emenda à Constituição) está sendo elaborada e deve tramitar no congresso brasileiro a fim de manter a competitividade do etanol diante das reduções de tributos sobre os outros combustíveis.

A ideia é a criação de um mecanismo que compense o preço do etanol frente as reduções que cada estado fizer da gasolina, mantendo o preço do biocombustível em patamar competitivo. A Câmara dos Deputados aprovou um projeto que determina maior transparência na composição dos preços dos combustíveis. Dessa forma, cada agente da cadeia deverá reportar sua participação no preço final ao consumidor à ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), a qual tornará essas informações públicas. A proposta segue agora para aprovação no Senado.

• Os Estados Unidos intensificaram suas exportações de etanol no mês de abril, totalizando embarques de 701 milhões de litros, 48% acima do indicador de março e o terceiro maior volume já constatado para um único mês, de acordo com a Associação de Combustíveis Renováveis (RFA). O Brasil comprou 113,55 milhões de litros dos norte-americanos, sendo o maior volume mensal nos últimos dois anos. A grande mensagem aqui é a demanda aquecida pelo biocombustível no âmbito internacional e nacional e a dificuldade interna em suprir tal demanda visto o atraso na moagem. Ainda considerando o cenário nos Estados Unidos, o governo estabeleceu novo mandato da mistura de biocombustíveis aos combustíveis fósseis para o ano de 2022. Com isso, o volume em mistura de combustível renovável deve ser de 78,09 bilhões de litros, maior obrigação já definida pelo programa dos norte-americanos. A medida visa trazer maior segurança energética ao país, reduzindo sua dependência pelo petróleo.

• Seguindo seus planos de redução no consumo de combustíveis fósseis, a Volkswagen anunciou que irá utilizar biometano em suas fábricas de Taubaté e São Bernardo do Campo. Segundo a montadora, as unidades deverão consumir 50 mil m³ do biocombustível por dia a partir de 2023 e 2024. A substituição reduzirá em mais de 90% as emissões de dióxido de carbono em comparação ao gás natural. O mais interessante disso tudo é que o biometano será adquirido da Raízen, produzido a partir da vinhaça!

Para concluir, os cinco principais fatos para acompanhar em julho na cadeia da cana:

1. Os desdobramentos de políticas públicas relacionadas aos biocombustíveis no Brasil. Temos diversas iniciativas rondando no Legislativo desde a PEC sobre competitividade dos biocombustíveis, projetos de lei de maior transparência nos preços e a MP da venda direta. A primeira pauta é a de caráter mais urgente e poderá auxiliar a reverter o cenário de queda de consumo.

2. A evolução da moagem de cana-de-açúcar na região Centro-Sul. Seguimos atrasados com a moagem em relação ao ciclo passado, o que implica em menor oferta de produtos no mercado. Além disso, seguir acompanhando o nosso desempenho produtivo (ATR, produtividade e outros), indicadores que são determinantes para bons resultados no setor.

3. As vendas do etanol hidratado para o mercado interno. Em maio, as usinas venderam 9,18% menos hidratado na comparação com o mesmo mês de 2021. Já é o segundo mês consecutivo de redução, o que acende o sinal de alerta, considerando os preços praticados e a paridade com a gasolina. Em01/07, o indicador do etanol hidratado São Paulo (Cepea/USP) estava em R$ 2,96/litro; um mês antes, em 03/06, a cotação foi de R$ 3,08/litro, ou seja, preços acumulando quedas. A tendência é de que o consumo do biocombustível se recupere, vamos acompanhar.

4. O posicionamento da Índia frente às exportaçõesde açúcar. Com uma safra recorde por vir, o país asiático poderá ampliar o teto de exportações, o qual estava limitado em 10 milhões de t. Os rumores do aumento para 11 milhões de t já devem causar interferências nos preços.

5. O clima na região Centro-Sul. As previsões indicam que novas frentes frias devem passar pela região nos próximos dias e, como sabemos, este foi um dos grandes problemas que tivemos na última safra, ocasionando as geadas. Vamos ficar na torcida para que não tenhamos prejuízos!

Valor do ATR – iniciamos a safra 2022/23 com ovalor do ATR em R$ 1,2453/kg em abril. No mês passado (maio), o preço recuou um pouco e ficou em R$ 1,2212/kg. Com isso, o acumulado deste ciclo (média dos 2 meses) está em R$ 1,2330/kg, valor ainda bem acima da média do ciclo passado (R$ 1,1792/kg), mas ainda cedo para dizer que ficará neste patamar. Nossa previsão é de que fique em torno de R$ 1,13/kg até o final desta safra, no acumulado.

HOMENAGEADA DO MÊS


Neste mês nossa singela homenagem vai para a produtora rural Sarita Rodas. Sarita vem desempenhando grande papel desde que precocemente herdou as fazendas do pai, inovando em tecnologia e tratamento de pessoas, e levando a bandeira da maior participação feminina no agronegócio.

 

*Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP, em Ribeirão Preto, e da FGV, em São Paulo, especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio.
Confira textos, vídeos e outros materiais no site doutoragro.com e veja os vídeos no canal do Youtube (Marcos Fava Neves).
**Vítor Nardini Marques é mestrando em Administração de Organizações pela FEA-RP/USP.
***Vinícius Cambaúva é associado na Markestrat Group e mestrando em Administração de Organizações pela FEA-RP/USP.