Representatividade feminina no setor da aviação agrícola

01/09/2023 Noticias POR: Fernanda Clariano

A empresária tocantinense, Hoana Almeida Santos, foi eleita recentemente a nova presidente do Sindag – Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola, e irá presidir a gestão 2023/2025. Hoana integrava o conselho da entidade e é a primeira mulher a ocupar o cargo. Ela assume a presidência exercida por Thiago Magalhães Silva, durante dois mandatos.

Durante o Congresso de Aviação Agrícola realizado no mês de julho em Sertãozinho, no interior de São Paulo, Hoana falou com a reportagem da Revista Canavieiros sobre representatividade, expectativas, demandas e os desafios em liderar um setor de peso no Brasil como o da aviação agrícola. Confira!

Revista Canavieiros: Quem é Hoana Almeida Santos?

Hoana Almeida Santos: Uma mulher que teve que aprender do zero a como tocar uma empresa aeroagrícola em uma época não se tinha o acesso que se tem hoje ao conhecimento e à própria formação de lideranças para o setor – atualmente proporcionados pelo Sindag. A Precisa Aeroagrícola nasceu em 2006 e era tocada pelo meu primeiro marido, que faleceu em 2008. Foi quando eu me vi de uma hora para outra tendo que tocar um negócio que eu não conhecia – já que não participava do dia a dia da empresa que também passava por dificuldades.

No meio dessa avalanche, eu tinha meus dois filhos, Mariana e Lukas, do falecido marido (que são meus filhos de coração) para ajudar a criar e uma empresa onde precisava aprender rápido para resolver problemas de documentação e até de manutenção de aeronaves. Como não havia a facilidade que se tem hoje (com assessorias), fui aprendendo no erro e acerto – sobre as licenças e conhecendo quem eram os bons prestadores de serviços e fornecedores, por exemplo.

Isso em um universo predominantemente masculino e em um ramo onde as exigências burocráticas chegam a ser difíceis de entender para não dizer contraditórias. Ao mesmo tempo em que precisava ir tocando as operações como dava para ter dinheiro para deixar tudo em dia. Tendo passado o turbilhão, em 2016 veio o meu casamento com o agrônomo Flávio Cunha Lemos Filho, ele se tornou sócio da empresa e temos dois filhos, o Joaquim de 6 anos e a Analice de 10 meses.

Em 2017, associamos a empresa ao Sindag e, a partir daí, começamos a fazer todos os cursos que a entidade proporcionava (desde Academia de Líderes até mentorias, MBA em Gestão e sustentabilidade Aeroagrícola e outros treinamentos).

Revista Canavieiros: Como você recebe essa nomeação?

Hoana: A nossa entrada no Sindag já havia sido uma virada de chave para a empresa. Fomos muito bem acolhidos pela entidade, onde em 2019 passei a atuar no Conselho de Administração e, em maio deste ano, acabei sendo eleita presidente. Uma entidade que tem como característica o trabalho em conjunto. Não só com o suporte da diretoria executiva, mas de todos os conselheiros. Então, é uma entidade onde a gente se sente acolhida, onde nossas experiências valem muito e, ao mesmo tempo, nos ajuda a crescer muito.

Revista Canavieiros: O segmento da aviação agrícola ainda é bem masculino. Você pretende trabalhar ações que incluam maior participação das mulheres neste setor?

Hoana: Ele está um pouco menos masculino do que quando eu tive que entrar nele de cabeça, meio no susto. Ali eu senti certa resistência também pela minha inexperiência no setor. Ainda temos poucas mulheres à frente de empresas, como temos poucas pilotos agrícolas e outras profissionais. Mas eu acho que a visibilidade de nossa presença em postos-chave vai aos poucos incentivando outras mulheres a apostarem nesse segmento. Ironicamente, o próprio setor aeroagrícola não é tão conhecido pela sociedade, apesar de presente em praticamente todo o país.

Revista Canavieiros: Você é a primeira mulher a assumir uma entidade conceituada, tanto nas esferas governamental quanto entre as entidades nacionais e internacionais. O significa para você estar à frente de uma entidade que representa cerca de 90% das 245 empresas aeroagrícolas no país?

Hoana: É uma responsabilidade tanto do ponto de vista administrativo quanto estratégico. A aviação agrícola está presente em 23 dos 27 Estados, mais o Distrito Federal. Essa presença tem muito a ver com a necessidade de uma ferramenta que garanta a produtividade e sustentabilidade das culturas mais importantes para economia nacional. Tem a ver com a eficiência de conseguir fazer a semeadura e o trato das lavouras no momento certo e otimizando o uso dos insumos (ou seja, evitando perdas e mesmo eliminando a necessidade de retrabalho). Além do combate a incêndios florestais, que é uma atividade em crescimento para o setor, com temporadas de estiagem que cada vez ameaçam mais lavouras e reservas naturais.
Ao mesmo tempo, o Sindag tem historicamente feito um trabalho de aproximação com entes governamentais, políticos e sociedade. E todo esse trabalho se baseia em uma reputação de seriedade, competência e melhoria contínua. 
Junto com um trabalho em conjunto dentro da entidade, que só consegue atender todo o País porque as associadas conseguem nos ajudar com isso. Então, é uma responsabilidade muito grande, mas, por outro lado, há um bom suporte para avaliação estratégica de cenários e tomadas de decisões, sem falar no trabalho de nossas assessorias e parceiros.

Revista Canavieiros: Quais são as prioridades da aviação agrícola neste momento?

Hoana: As prioridades da aviação agrícola têm sido a qualificação e melhoria contínua, além da comunicação com a sociedade.
Nos primeiros itens, isso tem a ver com eficiência em campo, sustentabilidade ambiental e desenvolvimento tecnológico e de processos, refletindo até na qualidade de vida dos profissionais. Já a comunicação tem sido fundamental para desmistificar o setor, que ironicamente é pouco conhecido, mas atua com a ferramenta (aviação) que é altamente transparente. Isso gera muito espaço para estereótipos, principalmente pelo fato de atuar com defensivos.

Revista Canavieiros: Dentre as demandas do setor de aviação agrícola qual seria prioritária?

Hoana: A comunicação com a sociedade. E por sociedade, entenda-se desde a dona de casa até lideranças setoriais e de poderes constituídos. Isso ganhou urgência em uma época de extremismos e onde informações deturpadas que ganham abrangência muito rapidamente, o que é muito perigoso quando a visão que se tem da gente é quase toda baseada em estereótipos. Isso passa também por educação, inclusive dos próprios futuros técnicos que atuam no campo. É um trabalho que inclui desde audiências comunitárias até relacionamento com a imprensa, conversas com lideranças e visita às universidades – onde é comum cursos de Agronomia, por exemplo, não terem a aviação em suas disciplinas de tecnologias e mecanização.

Revista Canavieiros: Como você vê o diálogo entre esse setor e a sociedade?

Hoana: Melhorou muito justamente porque o Sindag tem sido proativo nisso, buscando participar de todos os espaços de debate possíveis, inclusive em ambientes hostis ao setor, focado sempre no respeito e no diálogo, e em saber ouvir.

Revista Canavieiros: O Congresso da Aviação Agrícola do Brasil que aconteceu no mês de julho foi o primeiro após a suprema corte brasileira liberar os estados para legislar sobre o setor. Isso após o estado do Ceará ter proibido a atuação das aeronaves agrícolas. Essa questão tem preocupado?

Hoana: Preocupa porque ela reflete diretamente no ambiente político. Onde a razão muitas vezes é deixada de lado em nome de um discurso focado em inflamar o estereótipo. A única condição nesse caso, é que esse estereótipo renda votos pela “estratégia do inimigo comum”. E, assistindo a isso, quem não conhece a aviação ou não tem uma noção maior da realidade no campo, não consegue discernir a falta de lógica do que é falado. Em política, o barulho muitas vezes conquista mais do que a verdade. Por isso também trabalhamos muito na aproximação com executivos e legislativos. Nos municípios, Estados e em Brasília, buscando conversar com todas as correntes partidárias.